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30 anos de cooperação Brasil-Namíbia: autonomia dos países foi elevada, apontam especialistas

© Marinha do BrasilChegada da fragata Niterói ao Porto de Walvis Bay, na Namíbia, em 2 de março de 1994
Chegada da fragata Niterói ao Porto de Walvis Bay, na Namíbia, em 2 de março de 1994 - Sputnik Brasil, 1920, 11.04.2024
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A parceria entre Brasil e Namíbia, "irmãs de armas", é a mais longeva cooperação brasileira através das Forças Armadas com um país africano, completando 30 anos em 2024.
O acordo foi firmado quatro anos após a independência namibiana e possibilitou a criação oficial da Marinha da Namíbia, em 2004, que protege uma extensa área litorânea no sul africano.
Murilo Gomes da Costa, doutor em ciência política pelo Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), explica que ao longo das três décadas a cooperação naval entre os países é marcada por várias conquistas, com iniciativas que "resguardam o potencial de elevar a autonomia estratégica do país cooperante".
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O pesquisador do Laboratório de Análise Política Mundial (Labmundo), premiado em 2022 com o Atlantic Security Award por desenvolver o projeto de pesquisa "O potencial da cooperação em defesa no Atlântico Sul", afirma que um dos marcos foi o "levantamento hidrográfico da costa namibiana", feito em 1997 pelo navio hidrográfico brasileiro Sirius.
Isso resultou na primeira carta náutica do porto de Walvis Bay, que passou a ser controlado pela Namíbia em 28 de fevereiro de 1994. Até então, o local permanecia sob jurisdição da África do Sul.
A costa namibiana, composta quase em sua totalidade pelo Deserto do Namibe, passou a então desfrutar de uma porta para o oceano Atlântico, o que serviu de base para a parceria.
Segundo Costa, em 2001, o acordo naval foi revisado e expandido, permitindo que 1.179 militares namibianos, cerca de 90% do pessoal da Marinha do país africano, tivessem treinamento em instituições navais brasileiras ao longo de dez anos.

"Desde então, anualmente, novos cursos e treinamentos são oferecidos à Marinha da Namíbia em áreas que vão desde a cartografia até a estratégia militar."

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O que a Marinha faz?

O professor de relações internacionais da Universidade Veiga de Almeida (UVA), Alexandre Alvarenga, comenta que, além da Namíbia, a Marinha do Brasil tem parcerias parecidas na área de segurança com África do Sul, Angola, Cabo Verde, Nigéria, Senegal, São Tomé e Príncipe, Gana, Benin e Togo, além de pactos com Egito e Moçambique, não se restringindo à Costa Ocidental do continente africano.
Segundo ele, a cooperação pode ser avaliada positivamente sob a perspectiva geopolítica e no âmbito da cooperação Sul-Sul. "A partir de uma perspectiva geopolítica, a parceria contribui para maior inserção, presença e participação do Brasil no Atlântico Sul e na Costa Ocidental da África por meio de missões, operações e treinamentos conjuntos."

"O desenvolvimento institucional dos países do Atlântico Sul, sobretudo na área de Defesa, pode somar forças aos esforços brasileiros de garantir paz, segurança e estabilidade na região, principalmente a partir da coordenação de políticas e ações contra ameaças externas, contra a pirataria, contra o tráfico de armas e de drogas, contra a pesca ilegal e contra crimes ambientais."

O pesquisador da UERJ, Murilo Gomes da Costa, ressalta outros dados, como os de treinamento de militares, que impactaram sobretudo oficiais da Namíbia. "Entre 2002 e 2014, 1,9 mil oficiais dos países africanos do Atlântico Sul receberam instrução em instituições militares brasileiras. Desses, 1.533 foram treinados pela Marinha, sendo que 89% (1.364) eram oficiais da Namíbia."

"No caso específico da Namíbia, como parte da cooperação naval bilateral, navios-patrulha brasileiros têm visitado regularmente a Namíbia como parte de exercícios de treinamento naval ao longo da costa africana", explica.

Em setembro de 2022, segundo ele, o NS Elephant se tornou o primeiro navio namibiano a atravessar o Oceano Atlântico para participar da celebração brasileira do bicentenário da independência do Brasil e participar do exercício naval multilateral da UNITAS LXIII no Rio de Janeiro.

"A Marinha do Brasil desempenha o que chamamos de uma espécie de diplomacia naval, que além de estreitar os laços militares, muitas vezes abre espaço para iniciativas de cooperação em outras áreas temáticas."

O pesquisador observa que entre 2003 e 2006, o Brasil prestou consultoria à Namíbia na preparação da documentação necessária pela Comissão de Limites da Plataforma Continental (CLPC) das Nações Unidas para "a apresentação de uma proposta formal referente à ampliação da plataforma continental namibiana".
Além disso, ele destaca que mais de 1,4 mil fuzileiros navais namibianos foram formados por homólogos brasileiros em cursos ministrados no país, auxiliando na criação do Corpo de Fuzileiros Navais da Namíbia em 2016.
© Marinha do BrasilNS Elephant, no Rio de Janeiro, durante o Bicentenário da Independência do Brasil
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NS Elephant, no Rio de Janeiro, durante o Bicentenário da Independência do Brasil

Qual é o papel do Exército?

Para Costa, o Exército Brasileiro desempenha um "papel importante" dentro de acordos de cooperação bilateral na área de Defesa com países africanos. "A cooperação técnica em ensino militar do Exército Brasileiro na África, por exemplo, encontra-se nesse escopo. Com Senegal, foi construída a Missão Brasileira de Cooperação em Engenharia Militar (MBCEM)", exemplifica.
Desde 2016, diz, o Exército Brasileiro passou a designar um oficial para desempenhar a função de instrutor na Escola Nacional de Oficiais da Ativa (ENOA) e um monitor para a função de monitor na Escola Nacional de Suboficiais da Ativa (ENSOA).

"Essas escolas possuem 'vocação regional', tendo em vista que agrupam cadetes vindos de diversos países da África Ocidental, tais como Togo, Gabão, República Centro-Africana, Níger, Camarões, Benin, Costa do Marfim, Mali, Madagascar, Guiné, Burkina Faso, Gâmbia, Cabo Verde, Chade, Congo e Djibuti."

Outra dimensão da cooperação militar ocorreu na República Democrática do Congo, segundo ele, com o envio da Equipe Móvel de Treinamento em Operações na Selva, que difunde conhecimento técnico especializado em operações na selva, no âmbito da Missão das Nações Unidas na República Democrática do Congo (MONUSCO).

"Nesta missão, desde 2018, o Brasil ocupa cargo de 'Force Commander', o que traz visibilidade internacional em função da magnitude e complexidade desse tipo de missão de paz."

Costa explica que, desde então, segundo a base de dados do Itamaraty, o governo brasileiro também assinou nove acordos-quadro de cooperação em defesa com países do Atlântico Sul — África do Sul (2003); Guiné-Bissau (2006); Namíbia (2009); Nigéria, São Tomé e Príncipe, Senegal e Angola (2010); Cabo Verde (2016) e São-Tomé e Príncipe (2017).
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A importância da política externa africanista feita pelo Brasil

Costa entende que há a "retomada de uma política externa africanista" com o novo governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Isso se mostra evidente, por exemplo, com a visita diplomática da equipe da Agência Brasileira de Cooperação (ABC), em julho de 2023, onde foram vistoriadas atividades do Projeto de Sistemas Alimentares Comunitários Integrados, apoiadas pelo governo brasileiro, via Embaixada brasileira em Windhoek, capital da Namíbia, em parceria com o Programa Mundial de Alimentos (PMA).

"O governo namibiano expressou interesse em cooperação técnica e humanitária em setores específicos, como a promoção de igualdade de gênero, ensino técnico agrícola, extensão rural, pecuária, apoio para a implementação de políticas públicas, replicação de projetos agrícolas de sucesso em diversas regiões do país, por meio da capacitação de multiplicadores."

O professor de relações internacionais da UVA, Alexandre Alvarenga, entende que, a partir de "uma perspectiva da cooperação Sul-Sul, a parceria contribui também para o intercâmbio técnico, a capacitação profissional, a criação de instituições, o desenvolvimento das relações comerciais e a abertura de mercados, sobretudo para a indústria naval brasileira".
Ele observa que, desde a década de 1960, a política externa brasileira passou a promover "maior aproximação e integração com o continente africano", incluindo iniciativas nas áreas de segurança, política comercial e integração cultural que tinham como objetivo ampliar a inserção internacional do país.

"Esse acordo está dentro desse objetivo ao contemplar um pouco de cada área. Esse tipo de cooperação fortalece a posição brasileira na região, cria novas oportunidades de cooperação e pode resultar em maior coesão política dos países da região em fóruns multilaterais."

Quais são os países do Atlântico Sul?

Para Alvarenga, o acordo entre Brasil e Namíbia está alinhado à Política Nacional de Defesa (PND), que estabelece o Atlântico Sul e a Costa Ocidental Africana como áreas prioritárias do interesse estratégico brasileiro, e à resolução da Organização das Nações Unidas (ONU) de 1986, que estabeleceu o Atlântico Sul como uma Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul (Zopacas).
A Zopacas é integrada por 24 países, sendo eles África do Sul, Angola, Argentina, Benin, Brasil, Cabo Verde, Camarões, Congo-Brazzaville, Congo-Kinshasa, Costa do Marfim, Gabão, Gâmbia, Gana, Guiné, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Libéria, Namíbia, Nigéria, São Tomé e Príncipe, Senegal, Serra Leoa, Togo e Uruguai, conforme resolução de 1986 das Nações Unidas.
Para Costa, "o sucesso da cooperação com a Namíbia representa um legado da construção diplomática brasileira em promover o espaço Sul Atlântico como uma região de cooperação e paz".

"Tal esforço resultou na criação da Zopacas em 1986, da qual o Brasil e a Namíbia são membros. A parceria com a Namíbia foi apenas o pontapé inicial", finaliza.

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