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A 1ª fábrica de hidrogênio verde do Brasil em escala industrial está chegando: o que muda com isso?

© Folhapress / Zanone FraissatGaroto brinca em vilarejo na zona rural de Araripina (PE), onde a terra é arrendada para implantação de aerogeradores, em 28 de novembro de 2017
Garoto brinca em vilarejo na zona rural de Araripina (PE), onde a terra é arrendada para implantação de aerogeradores, em 28 de novembro de 2017 - Sputnik Brasil, 1920, 10.08.2022
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No fim de julho, a Unigel, empresa química brasileira, anunciou o lançamento da primeira fábrica de hidrogênio verde em escala industrial do Brasil, prevista para começar a operar em 2023 no complexo petroquímico de Camaçari, na Bahia. A Sputnik Brasil conversou com um pesquisador para entender como funciona a produção desse elemento sustentável.
Com investimento inicial previsto em US$ 120 milhões (R$ 615 milhões), a meta da corporação, que desponta na produção nacional de fertilizantes nitrogenados, é ambiciosa: tornar-se o maior produtor de amônia verde e de hidrogênio verde do mundo.
Para alcançar o objetivo, a companhia brasileira se aliou à alemã Thyssenkrupp, que, na primeira fase, vai fabricar três eletrolisadores (máquina que faz a produção de energia em hidrogênio) de 20 MW, com capacidade total de 60 MW.
Na prática, isso significa uma capacidade de produção de 10 mil toneladas por ano de hidrogênio verde e de 60 mil toneladas por ano de amônia verde.
Mas, para a geração dos elementos, muita energia será necessária — e ela virá de um parque eólico construído por outro parceiro comercial da Unigel, a empresa Casa dos Ventos.
© Folhapress / Raul SpinasséRebanho de caprinos passa ao lado das torres do Parque Eólico de Casa Nova, no norte da Bahia, em 5 de agosto de 2019
Rebanho de caprinos passa ao lado das torres do Parque Eólico de Casa Nova, no norte da Bahia, em 5 de agosto de 2019 - Sputnik Brasil, 1920, 09.08.2022
Rebanho de caprinos passa ao lado das torres do Parque Eólico de Casa Nova, no norte da Bahia, em 5 de agosto de 2019

Na prática, isso muda alguma coisa?

Embora já tenha pesquisa sedimentada em outros países, a seara do hidrogênio verde é relativamente nova no Brasil.
Pesquisadores da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), no Rio Grande do Sul, estão trabalhando no desenvolvimento de um motor automotivo movido a hidrogênio verde.
Como ciência e tecnologia exigem recursos, o projeto ganhou financiamento de aproximadamente R$ 1 milhão no âmbito da linha V do Programa Rota 2030, após ser aprovado em chamada pública lançada pela Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa (Fundep) — fundação de apoio vinculada à Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Para a administração dos recursos, o projeto tem também parceria com a Fundação de Apoio da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Faurgs).
Em conversa com a Sputnik Brasil, Thompson Lanzanova, professor do departamento de engenharia mecânica da UFSM e um dos coordenadores do projeto, responde à pergunta que não quer calar: fabricar hidrogênio pode ser 100% sustentável a partir da energia limpa?

"Sim. Podemos ter energia eólica, solar, das ondas [marítima], seja lá qual for a fonte de energia — desde que ela não tenha emissão de CO2 [dióxido de carbono] em nenhuma parte da cadeia de produção dessa energia —, e temos como resultado o hidrogênio verde", aponta.

© AP Photo / Esteban FelixPainéis em planta de energia solar construída no Chile com financiamento chinês, em Colina, Chile, 20 de agosto de 2019
Painéis em planta de energia solar construída no Chile com financiamento chinês, em Colina, Chile, 20 de agosto de 2019 (foto de arquivo) - Sputnik Brasil, 1920, 09.08.2022
Painéis em planta de energia solar construída no Chile com financiamento chinês, em Colina, Chile, 20 de agosto de 2019. Foto de arquivo
Para que se converta no elemento, a energia gerada por essas fontes passa pelas máquinas chamadas de eletrolisadores, que quebram as moléculas de hidrogênio a partir de energia elétrica.

"Atualmente, o hidrogênio verde não é tão competitivo devido ao custo de produção. Não temos número suficiente de eletrolisadores, ou as máquinas que vão quebrar o hidrogênio a partir de energia elétrica. Também não temos energia elétrica de fontes renováveis suficiente para se produzir hidrogênio verde. Mas se as empresas estão implantando esses parques, é porque algum tipo de viabilidade tem", disse.

Com o intuito de se criar uma indústria lucrativa, continua o professor, é preciso que se criem parques de energia renovável apenas para a produção de hidrogênio verde.
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A estimativa projetada pelos cientistas é que a partir de 2030, com o aumento da produção, as máquinas empregadas vão ter custo muito reduzido.
Essa ampliação da produção do elemento e da cadeia resulta em um barateamento dessa produção, o que vai torná-la viável em termos de custos.
Na avaliação de Lanzanova, é possível aproveitar as "sobras" produzidas pelas malhas de energia renovável para a geração de hidrogênio verde.

"A produção de hidrogênio a partir de uma matriz totalmente sustentável e renovável seria realizada com o excesso de energia nos horários de pico de produção. Por exemplo, a energia eólica é intermitente; ora está produzindo, ora não. Quando ela estivesse produzindo, e produzindo acima da demanda da rede, seria possível usar esse excesso de energia que estivesse sendo produzida para a produção de hidrogênio. Claro que, para isso, o ideal é que toda a nossa matriz fosse renovável e a gente tivesse um parque eólico grande o suficiente. Do mesmo jeito a energia solar: quando há energia solar acima do que a rede está demandando, essa energia solar seria energia elétrica, de produção fotovoltaica, e poderia ser designada para produção de hidrogênio verde através da eletrólise", explica.

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Carros movidos a hidrogênio verde

Na pesquisa em andamento na UFSM, os cientistas estão desenvolvendo um veículo movido por um motor de combustão interna com hidrogênio e com as emissões dele sendo apenas H2O, ou seja, apenas a água e o próprio nitrogênio do ar que vai passar pelo motor diretamente.

"Isso vai gerar um combustível limpo, e a partir da queima dele ou da aplicação em células combustíveis, vamos usar uma energia que vem de uma fonte limpa, diferentemente da energia produzida de fontes de petróleo, que libera CO2 no ar a partir da queima, e esse CO2 contribui para aumentar o efeito estufa, o que aumenta a temperatura média global — todos os problemas atuais que já conhecemos", observa o professor.

O maior entrave, no entanto, ainda são os investimentos na produção de hidrogênio verde.

"Apesar do custo, atualmente em torno de US$ 4 [R$ 20,50] por quilo de hidrogênio produzido, em torno de 2035 o custo de produção será de US$ 1 [R$ 5,12] por quilo. A partir daí, com a implementação de mais eletrolisadores, será possível reduzir ainda mais esse custo. Em torno de 2050, o custo será em torno de US$ 0,75 [R$ 3,84] por quilo de hidrogênio verde produzido. Ou seja, para que isso aconteça, temos que aumentar muito o número de eletrolisadores. É preciso aumentar muito esse parque fabril de hidrogênio, e isso vai acontecendo por escala. Por exemplo, algumas fontes falam que, a cada vez que dobrarmos a nossa produção de hidrogênio, vamos reduzir em torno de 14% o custo de produção", estima Lanzanova.

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Sobre a parceria da brasileira Unigel com a alemã Thyssenkrupp, o professor avalia que, independentemente do investimento ser privado ou público, internacional ou não, o Brasil precisa se inserir no novo cenário de utilização de recursos renováveis de maneira consciente.

"É necessário que, independentemente de governo de direita ou esquerda, o Brasil tenha um papel ativo nesse cenário de transição energética. Que possamos utilizar nossa matriz renovável para, além de gerar riqueza para o país, consigamos auxiliar na geração de soluções energéticas ambientalmente viáveis de fato a mitigar o impacto ambiental gerado pela emissão de gases de efeito estufa. Nesse sentido, o governo precisa estudar e implementar maneiras de fomentar a produção desses combustíveis renováveis. Não só do hidrogênio verde, mas também do etanol e do biodiesel, que são combustíveis renováveis e que já são parte da solução nacional para a descarbonização do setor de transportes", conclui.

© Folhapress / José AldenirParque de produção de energia eólica em Guamaré, na região da Costa Branca, no estado do Rio Grande do Norte, em 11 de março de 2020
Parque de produção de energia eólica em Guamaré, na região da Costa Branca, no estado do Rio Grande do Norte, em 11 de março de 2020 - Sputnik Brasil, 1920, 09.08.2022
Parque de produção de energia eólica em Guamaré, na região da Costa Branca, no estado do Rio Grande do Norte, em 11 de março de 2020
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