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Indicação de Mendonça é ruim para STF, sociedade brasileira e valores constitucionais, diz assessora

© Folhapress / Wallace Martins/Futura PressO advogado-geral da União, André Mendonça
O advogado-geral da União, André Mendonça - Sputnik Brasil, 1920, 12.07.2021
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Para a assessora jurídica no Senado, Tânia Maria de Oliveira, a possibilidade de André Mendonça comandar o Supremo Tribunal Federal é negativa "sobretudo para os valores constitucionais que foram tão caros para conquistar".

Marco Aurélio Mello, que completa 75 anos nesta segunda-feira (12), teve sua aposentadoria publicada no Diário Oficial na sexta-feira (9). Com isso, o decano deixa a posição após 31 anos dedicados em serviço ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Com a saída de Mello, o presidente Jair Bolsonaro confirmou a pretensão de nomear para o tribunal seu atual Advogado-Geral da União (AGU), o "terrivelmente evangélico" André Mendonça, que antes foi ministro da Justiça após Sergio Moro. Assim que oficializar sua indicação, o nome dele precisa ainda passar pela aprovação do Senado.

Tânia Maria de Oliveira, assessora jurídica no Senado e membro da coordenação executiva nacional da Associação Brasileira de juristas pela democracia (ABJD), acha que o mandato de Marco Aurélio Mello, apesar de polêmico, deixa um legado positivo e enfatiza a conduta estrita do ex-ministro em matéria de cumprimento da lei penal.

O legado do decano Marco Aurélio Mello

"Costumava-se dizer que ele era o ministro 'voto vencido' por que muitas vezes ele ficava sozinho isolado nas posições, mas é preciso dizer que ele foi um ministro muito corajoso e muito leal às posições que assumia", disse ela, citando a decisão de Mello de mandar soltar todos os presos condenados em segunda instância. Atitude que deu impulso às discussões sobre prisões em segunda instância.

"O legado dele é de um ministro garantista e muito corajoso", afirmou a assessora. Em contrapartida, Tânia vê com preocupação a garantia de direitos constitucionais com a indicação do "terrivelmente evangélico" André Mendonça.

"A saída dele [Marco Aurélio Mello] altera a correlação de forças no sentido de [afetar] justamente nessas pautas de direto penal, processual e de garantia de acusados ou condenados", explica.

A provável entrada de André Mendonça

A troca do cargo por um ministro indicado por Jair Bolsonaro modifica o STF, pois André Mendonça, sendo um bolsonarista convicto pode fazer alterar completamente as "revoluções" geradas pela gestão Marco Aurélio. Para Tânia a indicação é negativa.

© AP Photo / Eraldo PeresPresidente Jair Bolsonaro durante a posse do ministro da Justiça, André Mendonça, em Brasília
Indicação de Mendonça é ruim para STF, sociedade brasileira e valores constitucionais, diz assessora - Sputnik Brasil, 1920, 12.07.2021
Presidente Jair Bolsonaro durante a posse do ministro da Justiça, André Mendonça, em Brasília
"A mudança de um único ministro não tem o condão de fazer do STF conservador, por exemplo, o André Mendonça foi defender a abertura dos templos durante a pandemia e teve só dois votos favoráveis", relembrando o ato de Mendonça como Advogado-Geral da União.

Nas pautas de costumes, o STF tem uma maioria bastante ampla e a troca de um único ministro não vai tornar a corte mais conservadora", mas o fato é que o ato "leva o conservadorismo para dentro da corte e altera essa maioria […] Um ministro só não vai alterar a jurisprudência nesse sentido", conclui.

Indicação vs. aprovação

Segundo a assessora, ao realizar a nomeação em um momento de fragilidade política, Bolsonaro pode ter dificuldade de aprovar o seu novo ministro.

"Hoje o governo Bolsonaro está em uma crise. Existe uma crise inclusive entre os poderes e uma crise no âmbito do próprio governo com denúncias de corrupção com o andamento da CPI da pandemia", detalha.

A dificuldade de aprovar o nome do André Mendonça dentro do Senado entra nesse âmbito da conjuntura. Ela diz que o próprio nome dele tem muita resistência dentro do Senado e dentro do STF pelas posições assumidamente conservadoras perante as pautas sociais e de costumes.

"André Mendonça como ministro de Justiça usou a Lei de Segurança Nacional para perseguir coletivos sociais como os membros dos policiais anti fascismo, abriu vários inquéritos de manifestações, inclusive contra jornalistas por terem publicado alguma coisa contra o governo Bolsonaro", exemplifica.

Ela critica que Mendonça, ainda à frente da AGU fez uso de "instrumentos considerados não republicanos" para defender vontades do governo, vide a abertura dos templos em meio à pandemia, indo contra as recomendações científicas e da OMS.

A executiva da ABJD comenta com temor a citação do bolsonarista para defesa da abertura: "Foi muito assustadora a defesa que ele fez no STF citando a Bíblia para defender a abertura dos templos. Isso mostra que existe ali uma deturpação da própria religiosidade que é dele com os valores constitucionais das liberdades em geral, isso aí pode impactar e diversos julgamento do STF".

© Foto / Dorivan Marinho/Divulgação/STFFachada do prédio do Supremo Tribunal Federal (STF), em Brasília.
Indicação de Mendonça é ruim para STF, sociedade brasileira e valores constitucionais, diz assessora - Sputnik Brasil, 1920, 12.07.2021
Fachada do prédio do Supremo Tribunal Federal (STF), em Brasília.

Estado laico

Tânia Maria de Oliveira recorda que concepções religiosas não podem guiar as decisões do Estado, que é: "O Estado é necessariamente laico, o que não pode ser confundido com liberdade religiosa".

"O que preocupa é que ele seja um ministro que não respeite a Constituição, completamente vinculado ao governo de Jair Bolsonaro e às suas pautas absolutamente reacionárias. Não são nem apenas conservadoras, são reacionárias mesmo", critica a assessora jurídica no Senado.

"A indicação do André Mendonça é muito ruim para o Supremo, é muito ruim para a sociedade brasileira sobretudo e para os valores constitucionais que foram tão caros para conquistar", retoma ela, tendo em conta que as nomeações também devem contar com o consentimento tácito de ministros do STF.

Crise no governo Bolsonaro

Tânia acha que a questão da Lava Jato não será o problema para Mendonça e explica que "ele esteve no governo no momento em que o governo virou antagonista da operação Lava Jato virou um embate entre Bolsonaro e Moro", ela opina ainda que "os problemas com ele são de outra natureza".

A assessora fala que "apesar de toda a crise que está no governo apesar da CPI, apesar de tudo, Bolsonaro segue aprovando os projetos dele no Congresso". E acrescenta que pode haver um tipo de resistência que complique a aprovação de André Mendonça, "mas é cedo ainda para dizer isso".

Tânia de Olivera conclui: "André Mendonça é uma escolha pessoal de Jair Bolsonaro, quanto a isso eu não tenho a menor dúvida".
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