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Doria ganha capital político com vacina, mas caminho é longo até 2022, opina analista

© Folhapress / Antonio MolinaO governador de São Paulo, João Doria (PSDB), anuncia a eficácia de 78% da Coronavac contra o novo coronavírus
O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), anuncia a eficácia de 78% da Coronavac contra o novo coronavírus - Sputnik Brasil
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Após o governo brasileiro antecipar a vacinação contra a COVID-19, a Sputnik Brasil conversou com um especialista que avalia que esse adiantamento é resultado da pressão provocada pela vitória política do governador de São Paulo sobre Bolsonaro.

O ministro da Saúde do Brasil, Eduardo Pazuello, se reuniu na manhã desta segunda-feira (18) com diversos governadores e, pressionado pelos mesmos, anunciou a antecipação da vacinação nacional contra a COVID-19, que incialmente estava prevista para a próxima quarta-feira (20).

As primeiras doses que já estão sendo aplicadas, apesar dos atrasos na entrega dos lotes para diversos estados, são da chinesa CoronaVac, produzidas pelo laboratório Sinovac e em parceria com o Instituto Butantan, em São Paulo, o que muitos acreditam que representa uma vitória política do governador paulista, João Doria, sobre o presidente Jair Bolsonaro. 

Até o momento, são seis milhões de doses que serão distribuídas pelo governo federal aos estados e ao Distrito Federal. Destas, 4.636.936 serão enviadas a Brasília e aos estados, enquanto as outras 1.357.640 serão distribuídas no estado de São Paulo, segundo o governo estadual. 

Os primeiros voos deixaram a capital paulista nesta segunda-feira (18), e algumas localidades já iniciaram a vacinação, como o Rio de Janeiro, que realizou uma cerimônia no Cristo Redentor para marcar o início da campanha de imunização no estado. No entanto, devido a problemas logísticos que resultaram em alterações nos voos que transportariam as vacinas, muitos lugares receberão os lotes com imunizantes apenas durante a noite e nos próximos dias, o que os obrigará a atrasar a vacinação.

Doria colhe os frutos de apostar na CoronaVac 

Em conversa com a Sputnik Brasil, o cientista político Rodrigo Prando, professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, em São Paulo, considera que a vacina da CoronaVac é uma grande vitória política para João Doria sobre o presidente Jair Bolsonaro, que foi colocado contra as cordas e acabou sendo obrigado a reagir e a aceitar a vacina desenvolvida pela China, que ele tanto criticou.

"Não há dúvida de que existe uma disputa política em torno da vacina entre o presidente Jair Bolsonaro e o governador João Doria. Só que, nessa disputa, os dois não estão em patamar de igualdade. No domingo (17), o governador João Doria, junto com o Instituto Butantan, cientistas, médicos e especialistas em epidemiologia, conseguiu entregar ao Brasil uma vacina, a CoronaVac, enquanto o presidente Bolsonaro, ao longo de toda a pandemia, não consegue entregar nada, a não ser discursos de confrontação", avalia Prando.

Para o professor da Mackenzie, a disputa política dentro do ambiente de uma pandemia deveria ser colocada de lado, mas é absolutamente normal e previsível dentro de uma sociedade que está polarizada há muitos anos como o Brasil. Além disso, Prando ressalta que, desde o primeiro dia do mandato, quem decidiu politizar e tornar ideológico todas as posturas e essencialmente confrontar, foi Bolsonaro.

"Doria colhe os frutos de ter apostado na vacina da Sinovac, que é uma vitória da ciência e do próprio João Doria, uma vitória do encontro da ciência com a política. O presidente Bolsonaro, por sua vez, abdicou de fazer política, de fazer a gestão da crise da pandemia e agora está calado porque não tem o que falar", afirma Prando.

Bolsonaro sente o golpe

Depois que Doria capitalizou os ganhos políticos com a vacina durante a cerimônia de ontem (18), na qual apareceu para todas as mídias nacionais e internacionais mostrando a primeira pessoa vacinada no país contra a COVID-19 após a aprovação do uso emergencial da CoronaVac pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Bolsonaro finalmente se pronunciou nesta segunda-feira (18) ao sair do Palácio do Planalto.

O presidente voltou a insistir nas narrativas que ele vem adotando ao longo da pandemia, como a recomendação de um suposto tratamento precoce com medicamentos que não têm efeito comprovado cientificamente, e voltou a criticar a taxa de eficácia da vacina, como já havia feito há poucos dias.

"Não desisto do tratamento precoce. Não desisto. A vacina é para quem não pegou ainda. E essa vacina é 50% de eficácia. Jogar uma moedinha para cima, é 50% de eficácia", disse o presidente durante a entrevista na saída do Palácio da Alvorada, segundo o portal UOL, na qual também ressaltou que a CoronaVac é "a vacina é do Brasil, e não é de nenhum governador".

As declarações de Bolsonaro refletem o incômodo do presidente com a vitória política de João Doria. Segundo Prando, Bolsonaro e o bolsonarismo "sentiram o golpe e estão desesperadamente procurando uma narrativa na tentativa de obnubilar o governador de São Paulo".

Disputa presidencial de 2022

Apesar disso, o cientista político não acredita que a vitória na corrida pela vacina terá como consequência direta um eventual triunfo de Doria nas eleições presidenciais de 2022, já que muitos apontam que tanto Bolsonaro quanto o governador paulista estarão entre os protagonistas dessa disputa, e ambos já demonstraram publicamente que pretendem concorrer ao cargo máximo do país, no caso de Bolsonaro a tentativa de uma reeleição. 

"Não há dúvida de que Doria ganha capital político com a vacina CoronaVac, mas não necessariamente será eleito presidente, pois o caminho até 2022 é longo e tudo depende de um conjunto de fatores", opina o especialista, que acrescenta que "a vacina é uma possibilidade de Doria ultrapassar os limites do estado de São Paulo e nacionalizar o seu nome".

Para Prando, outras questões também influenciarão na escolha dos eleitores. "A questão da economia será leveda em conta. Além da vacinação, se o estado de SP tiver um crescimento maior do que a média nacional, isso também reforçará a imagem do Doria como gestor, credenciando-o a concorrer ao Palácio do Planalto", afirma.  

O professor da Mackenzie considera que, apesar de Bolsonaro estar fragilizado pela paralisação da economia, pela dificuldade de crescimento e por questões relacionadas à disputa das presidências da Câmara e do Senado, Doria "não pode focar apenas na questão da vacina, ele deve trabalhar em outras áreas, dentro do governo de São Paulo, para postular ao Palácio do Planalto".  

Prando, no entanto, avalia que a questão da vacina ainda deve permanecer no cenário político por um bom tempo, pois a ciência ainda não tem certeza sobre uma imunização comprovadamente efetiva para conter a pandemia, o que torna "impossível prever até quando haverá essa disputa pelas vacinas".

"O que se sabe é que existem lógicas e tempos distintos. O tempo da ciência é muito maior, demanda muito mais preparo, estudos, ensaios, análises, o que leva anos para que se tenha um resultado. Já o tempo da política exige uma celeridade muito maior. O tempo da sociedade, por sua vez, é um tempo muito mais acelerado, especialmente de uma sociedade que está hiperconectada, então temos pelo menos 3 grandes dimensões temporais que, dentro de uma situação de pandemia, tiveram que ser concatenadas, e nem sempre as respostas que queremos agora serão dadas pela ciência", conclui.
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