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Aproximação com países do Sul Global reforça caráter anti-hegemônico do BRICS, diz especialista

© Foto / Alan Santos / Palácio do Planalto / CCBY 2.0Sessão Plenária da XI Cúpula de Líderes do BRICS, em Brasília, em novembro de 2019 (foto de arquivo)
Sessão Plenária da XI Cúpula de Líderes do BRICS, em Brasília, em novembro de 2019 (foto de arquivo) - Sputnik Brasil, 1920, 04.11.2022
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Em entrevista à Sputnik Brasil, especialista aponta que, ao se distanciar de EUA e Europa e estreitar laços com Rússia e China, duas potências do BRICS, países da África e da América Latina, o chamado Sul Global, mostram que há limites ao que o Ocidente tenta vender como "consenso internacional".
Uma tendência observada desde o início do conflito entre Rússia e Ucrânia é a resistência de países do continente africano e da América Latina em apoiar as ações anti-Rússia lideradas por Washington e países da União Europeia. Do mesmo modo, nessas regiões, o apoio ao presidente ucraniano, Vladimir Zelensky, é bem mais fraco do que na Europa e nos Estados Unidos.
Prova disso é que, em junho, apesar das pressões, líderes da União Africana boicotaram uma reunião virtual com Zelensky. Dos 55 países do grupo, 51 não compareceram. No mês seguinte, um pedido de Zelensky feito aos países do Mercosul para discursar em uma cúpula realizada em Assunção, no Paraguai, foi rejeitado e os países do bloco optaram por uma posição neutra em relação ao conflito.
Em contraponto, países do continente africano e latino-americanos cada vez mais estreitam laços com Rússia e China, tornando-se, como consequência, mais próximos do BRICS, grupo ao qual alguns deles já manifestaram o interesse em aderir.
Funcionária arruma as bandeiras nacionais do Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul antes de uma foto de grupo durante a Cúpula do BRICS no Centro Internacional de Conferências e Exposições de Xiamen, província de Fujian, sudeste da China, 4 de setembro 2017 - Sputnik Brasil, 1920, 01.11.2022
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Para entender por que países dos dois continentes resistem às pressões ocidentais contra a Rússia, a Sputnik Brasil conversou com Valdir Bezerra, mestre em relações internacionais pela Universidade Estatal de São Petersburgo e membro do Grupo de Estudos sobre Ásia (Geasia) do Núcleo de Pesquisa em Relações Internacionais da Universidade de São Paulo (Nupri-USP) e do Grupo de Estudos sobre os BRICS (GEBRICS), também da USP.
Valdir Bezerra explica que "a sinalização de neutralidade por parte dos países africanos e latino-americanos, o chamado Sul Global, indica de forma clara os limites daquilo que os Estados Unidos e seus aliados ocidentais tentam vender como 'consenso internacional' em relação ao conflito na Ucrânia".

"Muitos desses países se recusam a condenar a Rússia por não estarem dispostos a, mais uma vez, seguir os ditames do Ocidente a respeito de como eles devem ou não devem se comportar ou como eles devem ou não interpretar eventos atualmente em curso não somente na Ucrânia, como no mundo", afirma o especialista.

Ele ressalta que "muitos dos países africanos ainda têm memória de quando Moscou os apoiou em seus processos de descolonização, sobretudo na década de 1960".
No entanto, segundo Bezerra, há ainda outros dois fatores que influenciam no apoio à Rússia: as relações comerciais e os investimentos.
"É preciso levar em conta que a Rússia sustenta relações comerciais importantes com o continente africano por conta de ser um proeminente exportador mundial de trigo e de alimentos, além do fato de manter parcerias nos âmbitos educacional e militar com diversos Estados na África desde o período soviético", destaca o especialista, acrescentando que o mesmo ocorre em relação à China.

"A China também tem uma presença muito significativa no continente por conta de seus investimentos em infraestrutura e por ser o principal parceiro comercial da esmagadora maioria dos países africanos e na América do Sul, o que faz com que a aproximação dessas duas regiões com o BRICS seja natural, visto que Rússia e China representam as principais potências desse agrupamento."

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Questionado sobre o que levou ao enfraquecimento da influência dos EUA e da Europa tanto na África quanto na América Latina, Bezerra aponta que o principal erro foi a tentativa de impor um modelo de democracia liberal de maneira uniforme, sem levar em conta as particularidades existentes em cada região.
"O que deu errado foi a tentativa americana de imposição de seu modelo democrático liberal pela força em regiões no Norte da África, Oriente Médio, Ásia Central e outros e a presunção de que os valores ocidentais seriam 'universais' e, portanto, deveriam ser aceitos sem resistência pelo resto do globo, o que obviamente ignora as especificidades de diferentes civilizações", destaca o especialista.
Nesse contexto, também pesa a recente memória de intervenções lideradas pelo Ocidente em países da África e da América Latina.

"Países africanos tiveram experiência com o imperialismo ocidental e com intervenções americanas em seu continente, do mesmo modo a América Latina. Logo não é de se esperar que essas regiões sigam, sem o mínimo de senso crítico, a cartilha daquelas mesmas potências que por tanto tempo as subjugaram e as atrapalharam, em alguma medida, de desenvolver-se autonomamente."

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Por fim, Bezerra destaca que a postura adotada por esses países abre uma janela de oportunidade, que também influencia no avanço da multipolaridade no mundo. Se por um lado, a contragosto de Washington, eles rejeitam a cartilha ocidental, por outro se tornam mais próximos de países do BRICS, possibilitando inclusive adesões ao agrupamento.
"A postura desses países pode, de certo modo, ampliar a possibilidade em torno de suas eventuais candidaturas ao BRICS no futuro, mesmo se tendo em conta algumas das deficiências de cunhos econômico e político vivenciadas por muitos deles", afirma Bezerra.
Ele finaliza destacando que essa aproximação pode fortalecer a posição do BRICS perante potências ocidentais.

"Sua aproximação com o grupo acabaria por fazer do BRICS mais do que uma coalizão de potências econômicas emergentes, como originalmente idealizado, para se tornar um agrupamento mais amplo de Estados, cuja articulação diplomática reforçaria ainda mais seu caráter anti-hegemônico e em prol da multipolaridade ou 'policentricidade' nas relações internacionais", conclui o especialista.

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