Farhad Saidi: A Rússia tem potencial para desenvolver sistema bancário islâmico

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Quando a economia se pode comparar a um sorvete: Farhad Saidi, um banqueiro iraniano, explica as vantagens do sistema bancário islâmico.

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O sistema financeiro islâmico, difundido no Oriente Médio e no Sudeste Asiático está experimentando uma fase de grande crescimento.

Este sistema bancário, organizado segundo as normas islâmicas que proíbem a usura, está chegando à Rússia.

Mas o seu desenvolvimento ativo não levará a investimentos por parte de países islâmicos enquanto no país não surgirem projetos adequados, diz o banqueiro iraniano Farhad Saidi, que vive há quase três décadas na Rússia. Saidi, presidente do Conselho de Administração do Asia Bank, falou à agência RIA Novosti sobre as especificidades do sistema bancário islâmico e suas perspectivas de desenvolvimento.

Pergunta: O mundo financeiro do Oriente continua sendo um mistério para os agentes do mercado russo. Por favor, conte-nos sobre as vantagens do sistema bancário islâmico. De que forma ele pode ser interessante para a Rússia, na sua opinião?

Resposta: O sistema bancário islâmico é uma variante do sistema bancário convencional. É a mesma coisa que dizer que o sorvete com açúcar é prejudicial e substituir o açúcar por algo menos nocivo. Mas, em geral, o sorvete continua sendo sorvete.

P.: De que forma este sistema poderá ser interessante para a Rússia?

R.: Agora ele é interessante em todo o mundo e, se é interessante em todo o mundo, por que razão não deveria ser para a Rússia? Primeiro de tudo, na Rússia há mais de 20 milhões de muçulmanos. Este é um potencial muito bom.

Em segundo lugar, não é algo que se refira especificamente aos muçulmanos, é interessante para todos. As regras do sistema bancário islâmico existem também no Cristianismo e no Judaísmo, simplesmente no Islamismo elas foram aperfeiçoadas. No mundo de hoje, é um sistema alternativo de serviços bancários, e esta alternativa é necessária.

É um tipo de economia em que existe uma relação saudável entre o investidor e o beneficiário dos investimentos. Na organização tradicional de crédito, o banco dá dinheiro e diz ao cliente: "Eu não me importo o que acontece com você e com seu negócio, só preciso que pague o empréstimo e mais 15%”, por exemplo. No sistema bancário islâmico, o banco se considera um parceiro, um co-investidor no investimento. Portanto, no lucro e nas perdas, o banco e o cliente estão juntos.

No sistema bancário islâmico não existe mais ou menos lucro. O banco precisa saber o destino desses fundos e em que grau o cliente conhece o seu negócio. E este investimento tem de ser útil à sociedade. Se você precisa de dinheiro para abrir um casino, que terá o dobro dos lucros – o banco não aceitará. Porque neste caso existe lucro para o banco, mas não existe para a sociedade.

A economia, tal como o sangue no corpo, deve sempre se mover, mas este movimento tem de ser correto. Quinhentos anos atrás, as pessoas não tinham esse capital, mas as pessoas trabalhavam e a economia girava. Em seguida, o capital se tornou um instrumento, e isso começou na América. O instrumento pode ser bom, pode ser ruim — mas trabalha sempre a favor de quem detém o instrumento em suas mãos. No sistema bancário islâmico não existe tal noção de capital — é essa a diferença.

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No nosso sistema bancário, o capital é um dos elementos da economia, vista como um time, tal como no futebol um goleiro ou um atacante. Agora, a situação chegou a tal ponto que na economia tradicional há um conflito com os interesses da sociedade. Portanto, o sistema bancário islâmico é visto como uma espécie de fenômeno.

Se implementarmos adequadamente o sistema bancário islâmico, isso será muito útil para a sociedade russa. Mas, se este sistema se tornar um instrumento nas mãos de alguém, isso só vai piorar.

A minha sugestão é que o sistema bancário islâmico deve começar em pequena escala, de forma correta, e se desenvolver sobre essa base.

P.: O que nos pode dizer sobre o Asia Bank? Quem é o dono do banco? Na mídia apareceu a informação de que o banco pertence a cidadãos do Irã.

R.: O banco é russo e não pertence a iranianos. Eu sou um cidadão do Irã e presidente do Conselho de Administração do banco. Ao mesmo tempo, sou iraniano e vivo há 27 anos na Rússia, e há 41 anos — na Alemanha.

P.: Em que medida as sanções têm complicado o trabalho do banco? Espera o levantamento das sanções em um futuro próximo?

R.: Eu responderia assim: se as sanções forem removidas, então trabalharemos sem sanções. Se não forem, trabalharemos com sanções. Em qualquer caso, para nós, o principal é o trabalho que fazemos. Nós não reclamamos, não pedimos ajuda a ninguém. Nós dissemos a nossa equipe: ou trabalhamos ou seremos testemunhas da destruição do banco.

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P.: Você é um cidadão de um país sujeito a sanções há muitos anos. A Rússia também foi submetida a sanções por parte dos países ocidentais. Será que a experiência do Irã na esfera econômica seria útil para a Rússia?

R.: Poderia dividir esta questão em duas partes. A primeira é a parte moral, a segunda é a parte técnica. Mas, o mais importante é a parte moral.

O que fez o Irã? Após a imposição de sanções, o Irã criou um grande número de centros de onde se podia transferir dinheiro, mesmo com perdas, para o país. As sanções têm lacunas, nunca acontece serem como um círculo vicioso.

Na economia russa, eu não vejo problemas nas sanções, vejo problemas na abordagem ao trabalho. O problema é que há muitos banqueiros que não querem aceitar o fato de que no mundo dos negócios, por vezes, há ascensões e quedas.

Uma vez, 30 anos atrás, eu me encontrei nos Emirados com um sheik muito rico. Ele costumava ir de vez em quando viver em sua tenda como um beduíno. Perguntei-lhe se era nostalgia. Ele respondeu — não, vivemos de tal modo que, se de repente perdermos tudo, saberemos como se vivia antes em tendas com camelos.

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