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Como o pacote anticrime demonstra as dificuldades de Moro em Brasília

© AP Photo / Eraldo PeresO então ministro da Justiça, Sergio Moro, e o presidente Jair Bolsonaro durante evento em Brasília em 9 de agosto de 2019, quando ainda tinham bom relacionamento e forte aliança
O então ministro da Justiça, Sergio Moro, e o presidente Jair Bolsonaro durante evento em Brasília em 9 de agosto de 2019, quando ainda tinham bom relacionamento e forte aliança - Sputnik Brasil
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Tratado como prioridade por Sergio Moro, o pacote anticrime está passando por alterações na Câmara dos Deputados. A Sputnik explica o que é a iniciativa do ex-juiz da Lava Jato e como ela está tramitando.

O que é o pacote anticrime?

Lançado em evento com a presença do presidente Jair Bolsonaro (PSL) em Brasília nesta quinta-feira (3), o plano de Moro foi dividido em três projetos de lei que estão sendo analisados pela Câmara dos Deputados e o Senado. O primeiro deles criminaliza o caixa dois em eleições; o segundo, faz mudanças no Código Penal com implicações para a área de segurança pública; já o terceiro, abre caminhos para que ferramentas do Código de Processo Penal sejam usadas em casos eleitorais.

Entre as medidas defendidas pelo pacote estão: redução ou extinção de pena em homicídios praticados por policiais em casos de "escusável medo, surpresa ou violenta emoção", prisão após a condenação em segunda instância, endurecimento de penas e regras mais duras para progressão penal, aumento da punição para casos de caixa dois, monitoração mais rígida de detidos em presídios federais, entre outras medidas.

O pacote anticrime ocupa lugar de destaque no site do Ministério da Justiça e Segurança Pública e tem uma área própria que reúne informações e notícias sobre o assunto. Além disso, o ministério de Moro afirma em texto que "a medida [pacote anticrime] tornou-se prioridade governamental".

A bandeira de Moro, contundo, já enfrentou percalços e foi motivo de rusga entre o ex-juiz da Lava Jato e o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Em março deste ano, Moro estava descontente com o ritmo em que o pacote anticrime era analisado na Câmara e cobrou Maia. O presidente da Câmara não gostou e afirmou em público que Moro "conhece pouco" a política, era apenas um "funcionário" de Bolsonaro e que sua iniciativa era um "copia e cola" de projeto do hoje ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes.

Aprovada a reforma da Previdência, o pacote anticrime voltou a ser debatido e o Governo Federal investirá R$ 10 milhões em uma campanha publicitária para defendê-lo na TV, cinema, rádio, internet e nas ruas. A ação publicitária havia sido prevista originalmente para junho, mas foi adiada após o vazamento de conversas de Moro e outros membros da Lava Jato pelo The Intercept Brasil. 

Como está a tramitação?

Maia criou um grupo de trabalho para analisar a parte do projeto de Moro que versa principalmente sobre segurança pública. A iniciativa é composta por 15 deputados federais e já derrubou algumas das propostas do ex-juiz da Lava Jato.

Embora os vetos do grupo de trabalho ainda possam ser revertidos pelo plenário da Câmara dos Deputados, ele já vetou a previsão de redução de pena em homicídios praticados com "violenta emoção" e a prisão em segunda instância. Os 15 deputados também fizeram inclusões, como maior assistência legal para policiais envolvidos em assassinatos e a criação do juiz de garantia.

A cientista política e professora da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) Maria do Socorro Sousa Braga acredita que o ritmo lento na tramitação do pacote anticrime mostra a falta de habilidade política de Moro. Ela elenca as diversas derrotas do ex-juiz da Lava Jato em Brasília, como a demissão de seu indicado para o Conselho de Controle de Atividades (Coaf), a queda de sua indicada para o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária e o fato de Moro não ter sido consultado sobre o decreto de armas assinado por Bolsonaro em seus primeiros dias de mandato.

Ainda assim, diz Braga, Bolsonaro deve adotar parte das bandeiras de Moro no projeto anticrime para garantir o voto de seu núcleo duro e lavajatista. Já o investimento de R$ 10 milhões em publicidade para a defesa da iniciativa é uma tentativa de mostrar uma proximidade que não existe entre o ministro e o presidente, avalia a professora da UFSCar em entrevista à Sputnik Brasil. 

Ághata Félix e a segurança pública

Ágatha Vitória Sales Félix, de 8 anos, foi baleada com um tiro de fuzil nas costas no Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro. Ela foi socorrida, mas não resistiu aos ferimentos e morreu. Os moradores afirmam que o disparo foi realizado por um policial militar.

Apesar de Ágatha ser a quinta criança morta por tiro no Rio de Janeiro em 2019, segundo dados do Fogo Cruzado, seu caso ganhou repercussão e abriu uma discussão sobre as propostas na área de segurança pública do pacote anticrime.

Maia foi ao Twitter defender uma "avaliação muito cuidadosa e criteriosa" sobre o "excludente de ilicitude" presente no pacote de Moro. O ministro reagiu classificando a morte de Ágatha como "lamentável e trágica", mas ressaltou que o episódio não tinha "nenhuma relação possível" com seus projetos de lei. 

Foi após o episódio que o grupo de trabalho da Câmara dos Deputados retirou o excludente do ilicitude, uma promessa de campanha de Bolsonaro, do pacote anticrime. 

Moro no xadrex de Brasília

Moro é mais popular que Bolsonaro. Enquanto o ex-juiz é aprovado por 52% dos brasileiros, segundo pesquisa do Datafolha divulgada em julho, o presidente é lido como ótimo ou bom por 31%, indica levantamento do Ibope de setembro.

A pesquisa que atribuí 52% de popularidade a Moro foi publicada após o vazamento de conversas do então juiz pelo The Intercept Brasil, demonstrando a resistência de seu nome ao desgaste das revelações.

Embora as pesquisas sejam de fontes e datas diferentes, elas indicam que Moro é um nome forte na arena política. A agenda do ministro indica o mesmo caminho. Levantamento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública mostra que 69% dos compromissos de Moro em seu primeiro mês em Brasília foram com técnicos e assessores do ministério. Esse perfil de reunião foi diminuindo até julho, mês mais recente da pesquisa, quando os parlamentares dominaram a agenda de Moro e representaram 39% dos seus compromissos.

"Bolsonaro vive um momento complicado, ele sabe que sua popularidade está caindo e não tem como resgatar a economia, tem que esperar a previdência, são elementos que reduzem a capacidade dele, do ponto de vista econômico, de trazer melhorias para o país. Seria uma forma de estancar uma popularidade que só caí. O Moro, por outro lado, ainda tem uma popularidade muito maior, mas ele está enterrado, não consegue mostrar para a população a que veio. O apoio a ele é retroativo, pelo o que fez na Lava Jato", diz Braga.

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