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Bolsonaro promove desinformação e 'quer botar fogo' na Amazônia, afirmam especialistas

© Folhapress / AgifMembros da brigada de incêndio do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) tentam controlar fogos de queimada na floresta Amazônica, no município de Novo Progresso, no estado do Pará
Membros da brigada de incêndio do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) tentam controlar fogos de queimada na floresta Amazônica, no município de Novo Progresso, no estado do Pará - Sputnik Brasil
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Em meio aos persistentes relatos de degradação na floresta amazônica, especialistas denunciam a negligência do governo brasileiro na área e também uma campanha de desinformação que estaria sendo promovida pelo próprio chefe de Estado.

No último domingo (29), em meio ao segundo turno das eleições municipais no Brasil, o presidente Jair Bolsonaro voltou a culpar indígenas e caboclos e também fogueiras de São João pelos altos registros de queimadas na região da Amazônia.

Na mesma ocasião, de acordo com o Valor, o chefe de Estado brasileiro também se queixou do endurecimento da postura ambiental do Reino Unido, que pretende dificultar a importação de produtos de países com altas taxas de crimes ambientais, como é o caso do Brasil.

"Quando nós apanhamos lá fora não é ruim para mim, é ruim para todos nós. O Reino Unido se prepara para a reunião do ano que vem [COP-26]. Eu vou estar lá com o ministro Salles, se ele quiser estar comigo, para rebater com coragem", disse Bolsonaro, citado pelo jornal. 

​Dados preliminares do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais divulgados nesta segunda-feira (30) mostram que a taxa oficial do desmatamento na Amazônia em 2020, dada pelo sistema Prodes, é de 11.088 km², a maior desde 2008.

A alta é de 9,5% em relação ao ano passado. Mas, segundo o Observatório do Clima, levando-se em conta a média dos dez anos anteriores à posse de Jair Bolsonaro, o desmatamento cresceu 70%: de 2009 a 2018, a média apurada pelo INPE foi de 6.500 km² por ano. 

​De acordo com Antonio Eduardo Cerqueira de Oliveira, secretário-executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), os próprios órgãos de segurança do governo já constataram que os incêndios são provocados principalmente por agropecuaristas, madeireiros, garimpeiros e outros grupos que exploram a floresta amazônica, não tendo "nada a ver" com os povos indígenas.

Para ele, ao insistir nessas acusações, o presidente da República distorce os fatos e se coloca em uma situação "ridícula" diante, inclusive, da comunidade internacional. Ao contrário do que alega Bolsonaro, os povos indígenas, destaca Oliveira, estão interessados é em ver a mata de pé e proteger a biodiversidade da região.

"Os indígenas não têm nenhum interesse em atear fogo na mata, nos seus territórios, porque eles sabem que o fogo, além de destruir a mata, destrói toda a biodiversidade, destrói os animais, destrói a sua sobrevivência, destrói a sua cultura. Eles não têm interesse nenhum. E isso já foi comprovado pela Polícia Federal, pelo Ibama, pelo ICMBio", explica o especialista em entrevista à Sputnik Brasil.

O secretário-executivo do Cimi acredita que, em vez dos indígenas, é Bolsonaro que está interessado em "botar fogo" na Amazônia, conforme evidenciam as medidas adotadas ao longo da atual gestão, como a flexibilização das normas de exportação de madeira e da aplicação de multas por crimes ambientais.

"O presidente da República quer o contrário, ele quer botar fogo. E ele utiliza, muitas vezes, os artifícios para tirar de foco os verdadeiros problemas que o seu governo tem causado", opina. "Portanto, o presidente Jair Bolsonaro, quando fala esse tipo de mentira, ele está querendo tirar o verdadeiro foco do problema, que é a sua irresponsabilidade no trato da questão ambiental e no trato com a vida e o bem estar de toda a população brasileira." 

A antropóloga Elaine Moreira, professora do Departamento de Estudos Latino-Americanos da Universidade de Brasília e coordenadora do Observatório de Direitos e Políticas Indigenistas da instituição, explica que é verdade que comunidades indígenas façam uso do fogo para manejo. Mas, ao contrário do que afirma o presidente, isso é feito de maneira muito consciente e responsável, envolvendo um trabalho coletivo, uma época do ano específica, algo que não pode ser responsabilizado pelos grandes incêndios vistos na Amazônia ao longo dos dois últimos anos.

"É toda uma tecnologia comprovadamente reconhecida por bibliografia científica da importância dela, inclusive do manejo florestal. De certa forma, a floresta, hoje, está em pé por essa tecnologia também do uso do fogo", explica a pesquisadora também em declarações à Sputnik Brasil.

Assim como os indígenas não podem ser culpados pela devastação da floresta, também não tem cabimento, segundo a especialista, o presidente querer envolver tradicionais fogueiras de festas juninas em um problema tão grande, ainda mais considerando o grau de "sofisticação" das tecnologias empregadas nesse monitoramento.

"Vamos deixar de lado as nossas tradições de festas juninas, pois não são elas as responsáveis pelos danos que nós vimos e na proporção que vimos sobretudo neste ano."

Para Moreira, em vez de assumir as suas responsabilidades, o governo não apenas permite um ambiente favorável a ações ilegais na Amazônia como também contribui para a desinformação.

"Não traz nenhuma informação nova, não informa o público, desqualifica os povos indígenas, desqualifica as comunidades tradicionais. Acho que isso é a outra questão que também precisa ser questionada." 
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