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Aras x Lava Jato: PGR quer corrigir excessos ou implodir operação?

© Sputnik / Thales SchmidtAto em defesa da Lava Jato em Copacabana, Rio de Janeiro, em 25 de agosto de 2019.
Ato em defesa da Lava Jato em Copacabana, Rio de Janeiro, em 25 de agosto de 2019.  - Sputnik Brasil
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Embate entre procurador-geral da República, Augusto Aras, e operação Lava Jato está claro. Resta saber, disse cientista político à Sputnik Brasil, se intenção é corrigir erros ou acabar com força-tarefa.

Aras, mesmo antes de ser escolhido pelo presidente Jair Bolsonaro para chefiar a PGR, fora da lista tríplice da categoria, como era o costume, criticava pontualmente a Lava Jato. 

"A grande questão é saber se o procurador-geral, que me parece muitíssimo alinhado ao presidente Bolsonaro, visa realmente a correção de rumos da Lava Jato, ou um ataque mais frontal à operação", questionou Rodrigo Prando, professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, em São Paulo.

Nos últimos meses o conflito entre a operação, principalmente a força-tarefa de Curitiba, e a Procuradoria-Geral aumentou, com visita da subprocuradora Lindôra Araújo à Lava Jato do Paraná, em junho, para consultar arquivos. Os integrantes da operação acusam a Procuradoria de interferência em seu trabalho, enquanto a PGR afirma que a Lava Jato deve prestar contas de sua atuação.  

© REUTERS / Adriano MachadoAugusto Aras, indicado pelo presidente Jair Bolsonaro para assumir a Procuradoria-Geral da República do Brasil, gesticula durante sabatina no Senado
Aras x Lava Jato: PGR quer corrigir excessos ou implodir operação?  - Sputnik Brasil
Augusto Aras, indicado pelo presidente Jair Bolsonaro para assumir a Procuradoria-Geral da República do Brasil, gesticula durante sabatina no Senado

'Avanço civilizacional' 

Segundo Prando, a Lava Jato é um "avanço civilizacional no combate à corrupção, pois conseguiu levar figuras poderosíssimas a julgamento, à condenação e à prisão", além de ter trazido "de volta ao Brasil muito dinheiro desviado de corrupção". 

Apesar disso, ele avalia que existem "excessos" na atuação de seus operadores, o ex-juiz Sergio Moro e os procuradores das forças-tarefas, entre eles Deltan Dallagnol, que ficaram "muito claros" na Vaza Jato, diálogos expostos pelo site The Intercept e outros veículos de mídia. 

"Em alguns momentos, a operação cometeu atos para além daquilo que se espera dos operadores do direito. Existem teóricos do direito, independentemente de coloração partidária, que apontaram esses excessos", afirmou Prando. 

Lavajatismo nocivo à democracia

Ele aponta ainda a existência de um "produto cultural" da operação, o "lavajatismo", uma "crença de que juízes e procuradores estariam acima da sociedade, numa posição de pureza ética absoluta e capazes de fazer uma assepsia da sociedade brasileira, de expurgar todos os seus males, especialmente a corrupção". 

Essa crença, de acordo com o cientista político, "levou a uma identificação da corrupção ao próprio exercício da politica, uma identificação incorreta, e que gera problemas enormes, inclusive aos alicerces da própria democracia". 

Nesta semana, o embate entre a Lava Jato e a PGR se tornou ainda mais claro, quando, na terça-feira (28), Aras, em debate virtual promovido por grupo de advogados, disse que era preciso "corrigir rumos" da operação para que o "lavajatismo" não perdurasse. 

​Para Prando, a pergunta que surge é se a "fala aponta uma necessidade de correção de rumos", algo suscetível de ocorrer em "qualquer instituição republicana", e a "Lava Jato não passa longe disso" e "não pode ser uma figura com vontade e regras próprias", ou um "ataque frontal visando desestabilizar e desarticular por completo" a operação. 

Aras 'revelando ao que veio'

Para o cientista político Ricardo Ismael, professor da PUC-Rio, "há uma preocupação no ar" e tudo indica que sim, a intenção de Aras é implodir a Lava Jato. Segundo ele, o procurador "agora está revelando ao que veio", e um conjunto de fatores causa dúvidas se o combate à corrupção, "questão que foi muito importante nos últimos anos", continuará priorizado pelo governo, que teve como bandeira justamente a luta contra a impunidade. 

"Esse embate agora é decisivo: se prevalecer aquilo que Aras vem declarando até agora, ele está querendo tirar a independência do Ministério Público Federal, e, se assim acontecer, quem vai ser investigado vai depender da vontade do procurador-geral da República", disse o especialista, que ressalta o apoio que os dois últimos ocupantes do cargo, Raquel Dodge e Rodrigo Janot, davam à Lava Jato. 

Ismael afirma ainda que uma operação da "complexidade" e "magnitude" da Lava Jato até pode ter cometido erros pontuais, mas que eles são "aperfeiçoados" com o tempo. Para o especialista, a operação "prestou relevantes serviços à população brasileira" e está em conformidade com a Constituição de 1988, atuando no "controle das demais instituições públicas e defesa da cidadania". 

Reflexos no Bolsonarismo

Por outro lado, os dois especialistas concordam que o conflito entre o escolhido do presidente para a PGR e a Lava Jato provoca um racha em parte do grupo de apoio a Bolsonaro, algo que já vinha ocorrendo desde a saída de Moro do Ministério da Justiça. 

Segundo Ismael, eleitores que votaram no então candidato do PSL em função de seu apoio à Lava Jato estão "decepcionados" e "preocupados". 

"Bolsonaro está tendo agora que esclarecer para o seu eleitorado se o combate à corrupção vai continuar sendo uma prioridade de seu governo e do resto de seu mandato", disse o cientista político à Sputnik Brasil. 

Prando também enxerga um afastamento de bolsonaristas menos "convictos" do governo, ressaltando que seus eleitores não formavam um grupo uniforme. O grupo Vem pra Rua, por exemplo, que capitaneou diversas manifestações pelo impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, criticou a atual postura do chefe de Estado brasileiro. 

© Fernando Frazão/Agência BrasilManifestantes favoráveis ao impeachment da então presidente Dilma Rousseff acompanham a votação na Câmara que aprovou a destituição da mandatária em telão em Copacabana, no Rio de Janeiro
Aras x Lava Jato: PGR quer corrigir excessos ou implodir operação?  - Sputnik Brasil
Manifestantes favoráveis ao impeachment da então presidente Dilma Rousseff acompanham a votação na Câmara que aprovou a destituição da mandatária em telão em Copacabana, no Rio de Janeiro

"Alguns desses grupos começam a dar sinais de se afastar do presidente, por entender que essas manobras dentro do governo visam enfraquecer, paralisar e até mesmo desintegrar a operação Lava Jato", afirmou. 

'Atacar legado de Moro'

Prando faz ainda uma outra análise, de que as críticas que partem da PGR à operação tenha como objetivo enfraquecer a imagem de Moro, um possível adversário de Bolsonaro nas eleições de 2022. 

"Por trás dessa tentativa de correção de rumos de Aras, e de outros funcionários públicos de carreira ligados a ele, em relação à Lava Jato, tem também a tentativa de atacar a imagem e o legado de Moro e da operação", afirmou Rodrigo Prando.
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