Sob a gestão de Jair Bolsonaro, o Brasil vem atingindo recordes de desmatamento na Amazônia desde o ano passado. A pressão de outros países e investidores internacionais tem feito integrantes do governo, como o vice-presidente Hamilton Mourão e a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, prometerem baixar os índices e afirmarem que não é preciso derrubar floresta para expandir a agropecuária.
Mesmo assim, o embaixador da União Europeia (UE) no Brasil, Ignacio Ibáñez, disse em entrevista para a DW Brasil que não bastam declarações, é preciso mostrar dados concretos. No cargo desde julho de 2019, uma de suas principais missões é avançar o acordo comercial entre o Mercosul e a UE, assinado no ano passado, mas que para entrar em vigor precisa ser aprovado pelos governos dos países do bloco e por órgãos da União Europeia.
Segundo Tanguy Baghdadi, professor da Universidade Veiga de Almeida, o desrespeito do governo brasileiro ao meio ambiente pode dificultar ainda mais a concretização do pacto, assim como de qualquer acordo com outras nações ou blocos.
'Interesseira ou sincera, tanto faz'
"Essa dificuldade pela qual o Brasil passa para colocar um acordo tão estratégico como esse com a União Europeia em vigor, é uma dificuldade que o Brasil pode ter com outros parceiros. Existe uma conscientização internacional acerca da importância da temática ambiental. A gente pode chamar ela de interesseira ou sincera, tanto faz, mas o fato é que assinar um acordo com um Estado como o Brasil, que tem a Amazônia, mas que não respeita padrões ambientais rígidos, de alto padrão, é considerado algo muito nocivo para quem participa de um acordo como esse", disse o especialista.
Baghdadi diz ainda que as negociações sobre o acordo Mercosul-UE já eram naturalmente complicadas, "mas a questão ambiental torna ainda mais difícil algo que já era bastante complicado".
Balanço divulgado no dia 5 de junho pelo sistema Deter, do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), mostra um aumento de alertas de corte raso na Amazônia de 34% em maio em relação ao mês anterior. No período de agosto de 2019 a 28 de maio de 2020, os dados apontam uma área desmatada de 6.064 km², maior índice dos últimos anos e 78% superior do registrado no mesmo período entre 2018 e 2019.
No ano passado, Bolsonaro acabou demitindo Ricardo Galvão da diretoria do Inpe, após o presidente questionar números divulgados pelo instituto que apontavam um aumento das queimadas e do desmatamento. Segundo o chefe de Estado, ONGs estariam por trás das queimadas na Amazônia.
'Grupos que têm interesse no desmatamento'
Para o professor de relações internacionais, Bolsonaro contribui para aumentar a desconfiança externa em relação às intenções do governo de impedir a destruição das florestas.
"São desconfianças que vêm pelo fato do próprio Bolsonaro, como candidato ainda, falar sobre o apoio ao agronegócio, que naturalmente é um setor importantíssimo da economia, ninguém duvida, mas tem que haver um equilíbrio. A tendência do discurso do presidente como candidato, e depois de empossado, era de favorecimento de grupos que têm interesse no desmatamento", avaliou Baghdadi.
Para o especialista, "o papel do presidente deveria ser mais de mediador": entre a "necessidade de crescimento econômico e investimento na agricultura" e o "cuidado com o meio ambiente".
O analista disse ainda que a imagem ambiental do Brasil junto à comunidade internacional, que demorou décadas para ser recuperada, está sendo deteriorada rapidamente. Ele cita a organização da Rio-92 como um marco do compromisso do país em relação ao tema.
Desmatamento é um 'mau negócio' do ponto de vista das exportações brasileiras, diz especialista.https://t.co/9VA9yLq57e pic.twitter.com/9SAA9fUV14
— Sputnik Brasil (@sputnik_brasil) July 18, 2020
'Pressão internacional é incontornável'
"Foram décadas para tentar recuperar um pouco da imagem internacional do Brasil, é uma pena que a gente esteja vendo tão rapidamente uma deterioração dessa imagem", afirmou.
Segundo ele, "a pressão internacional é incontornável", seja de países, de empresas ou de consumidores, que se recusam a "consumir produtos feitos em países que não respeitam padrões" ambientais rígidos.
"Isso acaba fazendo com que as próprias empresas assumam esse discurso também. Todas as empresas atualmente têm a intenção de serem vistas como sustentáveis, verdes, que se importam com o meio ambiente. E nem estou falando de empresas absolutamente verdes, estou falando de empresas de exploração de petróleo, bastante poluidoras, mas que têm a intenção de serem vistas pelos consumidores como empresas que, muito embora atuem em ramos que sejam poluidores, agressivos ao meio ambiente, têm uma preocupação com o que fazer nesses cenários", afirmou Tanguy Baghdadi.
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