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Exclusivo: Otaviano Canuto, diretor do FMI, elenca desafios da economia brasileira

ENTREVISTA COM OTAVIANO CANUTO
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O economista Otaviano Canuto, diretor para o Brasil e mais 10 países no Fundo Monetário Internacional, falou com exclusividade à Sputnik Brasil sobre os desafios do novo ministro da Fazenda, Nélson Barbosa, e sobre a nomeação de Joaquim Levy à Diretoria Financeira do Banco Mundial.

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“O novo ministro da Fazenda, Nélson Barbosa, tem pelo menos 4 desafios à frente para recuperar a economia do Brasil”, comenta Otaviano Canuto. E entre esses desafios o economista destaca as dificuldades para levantar taxas de investimentos e os efeitos do fim do ciclo das commodities.

Sobre a indicação do antecessor de Nélson Barbosa, Joaquim Levy, à Diretoria Financeira do Banco Mundial, Canuto ressalta: “Levy trará experiência e conhecimento de finanças internacionais à Direção do Banco Mundial. Foi uma feliz decisão do Presidente Jim Yong Kim convidar Joaquim Levy”.

 

Sputnik: O ministro da Fazenda, Nélson Barbosa, está diante de enormes desafios, e o principal deles é o de recuperar a economia brasileira. Em sua avaliação, quais são esses desafios?

Otaviano Canuto: Antes de tudo é um privilégio, para nós, termos alguém como o Ministro Nélson Barbosa, com a experiência e a competência já demonstradas em sua passagem pelo Governo anterior. É alguém que conhece profundamente nossos problemas. Os desafios apresentados pelo Brasil só podem ser compreendidos se levarmos em conta que há, pelo menos, 4 níveis aí. Um, que vem de longa data são as dificuldades para levantar a taxa de investimentos como proporção do PIB brasileiro. São problemas estruturais que dizem respeito à dificuldade de levantar os investimentos em infraestrutura, a uma proporção crescente do PIB ter que ser dedicada ao pagamento de tributos por conta de gastos públicos, e assim por diante. Há uma segunda ordem determinante de dificuldades de crescimento que tem a ver com o fim de um longo ciclo da economia mundial em que os preços das commodities, depois de um longo período de ascensão, passaram a enfrentar uma situação de queda ao mesmo tempo que também as condições de acesso a financiamentos estiveram muito favoráveis e hoje viraram o sinal. Há um terceiro nível de determinante, que vem do fato do bem sucedido esforço do Governo de manejar contraciclicamente políticas fiscais e monetárias após a grande crise financeira global de 2008-2009. A partir de certo ponto esse manejo contracíclico já não apresentou os mesmos resultados eficazes do primeiro momento, e ao mesmo tempo esse manejo estendido de instrumentos contracíclicos deixou um legado fiscal que é, talvez, o grande desafio imediato. E uma quarta ordem de determinante, por razões que não são estritamente macroeconômicas, diz respeito ao ajustamento das estruturas de mercado do setor privado no Brasil como decorrência das investigações de cartéis ou de arranjos de mercado não compatíveis com concorrência plena. Elas estão se revelando a partir das investigações da Lava Jato, e o resultado imediato tem sido uma paralisia de investimentos não apenas das empresas diretamente afetadas mas também de outras empresas que operam no mesmo ramo. Por uma questão de contágio, de insegurança, de dúvida por parte de credores, mesmo aqueles que potencialmente podem ocupar esse espaço no futuro estão esperando para ver até onde a coisa vai chegar. Essa quarta ordem de determinante de desafios pelo menos traz um potencial ganho em médio prazo, que é o de não apenas assistirmos a mais concorrência, a mais busca de eficiência no setor privado por conta da maior concorrência que estará lá presente, mas também, muito provavelmente, termos um resultado do gasto público muito melhor em relação a custos, já que vão desaparecer alguns dos pedágios que faziam parte dos arranjos de mercados anteriores. É um desafio múltiplo, e, como bem tem dito a Presidenta Dilma e o Ministro Nélson Barbosa afirmou claramente em suas comunicações iniciais, cada coisa a seu tempo. Cabe ao Governo equacionar a questão fiscal ao mesmo tempo em que sedimente as bases para uma retomada do crescimento tão rapidamente quanto possível.

S: O senhor acredita numa boa convivência entre o ministro da Fazenda e o Partido dos Trabalhadores?

OC: Vem com a democracia que os diversos grupos de interesse, que as diversas visões do processo econômico se manifestem politicamente. Eu entendo que, como bem disse a Presidenta Dilma, o Governo não é apenas o Governo do PT, não é o apêndice de um partido, ou do PT, ou do PMDB ou de qualquer outro partido em particular. Ele é uma coalizão de forças, ele tem uma identidade. É perfeitamente natural e compreensível que os diversos partidos que assim o queiram exerçam sua pressão, mas cabe ao Governo ser Governo, ou seja, cabe ao Governo não se deixar transformar num apêndice de qualquer visão em particular. A Presidenta Dilma Rousseff e o Ministro Nélson Barbosa certamente vão conviver com a pressão, é parte do jogo, é parte do processo, mas o Governo tem um programa que lhe é próprio.

S: Como o senhor vê a ascensão do ex-Ministro Joaquim Levy ao Banco Mundial?

OC: Falo agora como indivíduo, porque funcionalmente não tenho relação hoje com o Banco Mundial – apenas o fato de que durante 12 anos trabalhei na instituição, onde fui diretor executivo e vice-presidente, e também falo como alguém que foi colega de Joaquim no Tesouro e que o sucedeu numa Vice-Presidência do Banco Interamericano de Desenvolvimento. Conheço bem o Banco Mundial e conheço bem Joaquim Levy. Acho que ele vai trazer uma mistura de experiência em finanças, em mercados, uma forte perspectiva de gestão econômica de um país e um conhecimento profundo do sistema multilateral, e essa combinação é muito rara e ao mesmo tempo todos esses elementos são importantes para o sucesso na posição que ele vai exercer. Eu congratulo não apenas o próprio Joaquim, por essa missão, que é importante para nós todos, para o mundo, dada a relevância do Banco Mundial, mas também dou minhas congratulações ao Presidente Jim Kim por ter feito esse convite. Acho um grande acerto.

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