O Mercosul é uma organização intergovernamental, fundada a partir do Tratado de Assunção de 1991. Seus integrantes originais – Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai – recentemente incorporaram mais dois Estados-parte: Venezuela e, mais recentemente, Bolívia.
Nesta entrevista exclusiva para a Sputnik Brasil, o professor de Relações Internacionais Rafael Araújo, da Unilasalle e da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, especialista em políticas latino-americanas, fala do Mercosul e do que se espera dos integrantes do Parlasul, o Parlamento do bloco.
Rafael Araújo: Talvez o mais importante da reunião desta semana seja a análise do futuro do Mercosul ou, pelo menos, os próximos passos que o bloco deve tomar diante da crise econômica que assola principalmente o Brasil e a Venezuela. De acordo com dados da Cepal – Comissão Econômica da América Latina e Caribe, o Brasil deve ter uma retração de 1,5% de sua economia, algo que já foi indicado pelo Banco Central no Relatório Focus, que saiu esta semana, e também a Venezuela tem a perspectiva de retração de sua economia, em 5,5%. De certa forma, como foi apontado pelo senador brasileiro Blairo Maggi, do Partido da República, há que se pensar o futuro, os próximos passos que o Mercosul deve dar em razão da crise econômica que assola o Brasil e a Venezuela, que são dois países fundamentais dentro do bloco.
S: E o Mercosul poderá ser uma ponte para o engajamento comercial da América do Sul com o bloco BRICS e até mesmo com a SCO – Organização para Cooperação de Xangai?
RA: Sim, com certeza. De fato, a saída principal para o Mercosul hoje, e isso já vem há alguns anos, é justamente em relação ao estreitamento das relações econômicas com os BRICS, e aí destacadamente a Rússia e a África do Sul são as duas pontes centrais com que o Mercosul vem buscando estreitar relações nos últimos anos. E a China: é inegável pensar a proximidade da América do Sul com a China em razão do fato de os chineses serem centrais na compra de matérias-primas da região há 10 anos. O bloco hoje tem uma tendência maior a olhar para o BRICS e para a China como uma forma de diversificação das suas parcerias comerciais e de ampliação de suas exportações, já que sabemos que os países que compõem o Mercosul têm grandes reservas de matérias-primas, tanto de origem mineral quanto de origem agrícola.
RA: Na última década, o fortalecimento do Mercosul foi visto como uma alternativa à expansão econômica norte-americana. E o próprio fato de a Aliança de Livre Comércio das Américas, a Alca, não ter sido implementada simboliza um pouco isso, esse freio a uma integração que beneficiasse os interesses econômicos norte-americanos. Neste sentido, como a própria pauta que levou a que o projeto da Alca se estancasse, o fortalecimento do Mercosul fez parte deste processo e quando a gente pensa o Brasil, o Fernando Henrique Cardoso, principalmente nos últimos dois anos do seu segundo mandato, revitalizou uma política externa brasileira direcionada a fortalecer o Mercosul. A ascensão de governos de esquerda, ou de centro-esquerda, nos países sul-americanos, na primeira década do século XXI, destacadamente a Venezuela, a Bolívia, a Argentina, com os Kirchner, contribuiu para que o Mercosul fosse fortalecido e, muito mais do que isso, ganhasse novos adeptos, no caso a Venezuela e a Bolívia, o que deu mais capilaridade ao bloco. O fortalecimento do Mercosul é uma forma de fortalecer os países sul-americanos contra os interesses econômicos dos EUA, e isso contribuiu decisivamente para que o projeto Alca fosse enterrado ou paralisado, a gente não sabe o que pode vir a acontecer, mas de fato fortaleceu o Mercosul. E fortalecer a relação do bloco com os BRICS ou com os países asiáticos como a China é uma forma de frear possíveis dependências da economia norte-americana, uma forma de quebrar esta dependência histórica que a América Latina tem em relação aos EUA. Neste aspecto, quanto mais fortalecido o Mercosul, melhor para o Brasil e para os demais países da América do Sul. Por mais que tenha força econômica, ainda é necessário que o Mercosul se amplie e consiga atrair outros países da América do Sul para dentro do bloco, ainda que seja difícil, já que sabemos que Peru e Chile se alinhavaram junto com o México e com a Colômbia na Aliança do Pacífico. Quem sabe no futuro poderemos ter um grande bloco – quer seja com a denominação do Mercosul ou com uma outra denominação – que contribua com o fortalecimento das economias sul-americanas e diminua a dependência em relação às transações econômicas e comerciais com os EUA.
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