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Portugal: 40% dos novos títulos de residência de estrangeiros são de brasileiros, confira histórias

© AFP 2023 / Patrícia de Melo MoreiraTranseuntes caminham pela rua Augusta, no centro de Lisboa, enquanto governo português debate medidas contra a pandemia de coronavírus
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O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) de Portugal concedeu 85.338 novos títulos de residência a estrangeiros entre janeiro e setembro. Segundo o SEF informou à Sputnik Brasil nesta quarta-feira (18), 40% dos novos residentes, cerca de 34 mil, são brasileiros.

Para efeitos de comparação, em 2019 o SEF emitiu 48.627 novos títulos de residência, o que fez com que o número de brasileiros em Portugal tenha atingido o crescimento recorde de 43% no ano passado. Agora, já são cerca de 185 mil brasileiros vivendo legalmente no país. Isso representa 27% dos 675.686 estrangeiros em solo português. Não entram para as estatísticas oficiais brasileiros que também tenham nacionalidade portuguesa ou de outro país da União Europeia.

A videografista carioca Patricia Rodrigues de Souza chegou a Braga em julho, onde mora com o marido, Reinaldo Ferreira Vieira, que tem dupla nacionalidade. Eles tiveram que contratar um escritório especializado para agilizar a situação do título de residência dela. Recorreram aos Consultores Internacionais e conseguiram marcar o agendamento no SEF de Viana do Castelo em um mês, o que é considerado um prazo rápido em meio à pandemia de COVID-19. Mais 15 dias, o documento estava pronto. Patricia diz que o documento foi fundamental para que ela pudesse ter uma vida normal.

"Quando cheguei aqui, só tinha o NIF (Número de Identificação Fiscal, equivalente ao CPF). Meu marido já havia entrado com o processo e, depois de dois meses aqui em Portugal, finalmente saiu [o documento]. Percebi que antes não podia fazer quase nada: até para fazer uma compra, um curso, emprego, cartão de utente [para o sistema público de saúde], não podia fazer quase nada sem o título de residência. A importância desse título realmente chega a outro patamar, posso voltar para o Brasil a hora que quiser e estar de volta sem ninguém questionar nada", diz Patricia à Sputnik Brasil.

Ela conta que até para embarcar do Brasil para Portugal já foi difícil sem o documento. Por ser casada com um luso-brasileiro, ela já se enquadrava no reagrupamento familiar, modalidade que autoriza residência e trabalho em Portugal. No entanto, quando chegou ao Aeroporto Internacional Tom Jobim, no Rio de Janeiro, exigiram a comprovação.

© Foto / DivulgaçãoReinaldo e sua esposa Patricia: ela conseguiu o título de residência em dois meses
Portugal: 40% dos novos títulos de residência de estrangeiros são de brasileiros, confira histórias - Sputnik Brasil
Reinaldo e sua esposa Patricia: ela conseguiu o título de residência em dois meses

"No aeroporto já perguntam se eu tinha o cartão de residência. Ficamos meio apavorados na entrada, pois achamos que eu não conseguiria embarcar. Foi no auge da COVID-19, muita gente não entrou no voo, eles criavam caso com tudo. Na alfândega, me pediram o cartão de residência e, quando disse que não tinha, achei que iam me barrar. Mostrei a cópia do reagrupamento familiar que tinha sido agendado e foi cancelado por causa da pandemia. Com esse papel do agendamento, deixaram que eu embarcasse", ela recorda.

Sem título de residência, brasileira só conseguiu emprego sem contrato de trabalho

A advogada brasileira Nicole Adele Kertesz, especializada em dupla nacionalidade, alerta que o número de pedidos por títulos de residência tende a aumentar ainda mais com a entrada em vigor da legislação que flexibiliza as condições para que descendentes de portugueses da segunda geração possam requerer a nacionalidade portuguesa. A lei já foi aprovada, mas ainda está em fase de regulamentação. Ela explica que isso pode provocar um efeito em cascata.

"A nova lei libera os netos de portugueses para requerer a nacionalidade sem precisar provar vínculos com o país. Isso significa que virá uma nova gama de pessoas que já tem a dupla cidadania, mas que terá de enfrentar a parte burocrática para passar [a nacionalidade] para o cônjuge, o que pode levar dois ou três anos. As pessoas não têm como aguardar esse tempo todo. Essa gama de pessoas vai toda para o SEF em busca de título de residência, o que vai aumentar muito mais ainda a demanda", prevê Nicole, que tem filiais do escritório Consultores Internacionais no Rio de Janeiro e em Aveiro.

A carioca Nathália Mattos, que faz mestrado em Direito no ISCTE–Instituto Universitário de Lisboa, sabe bem o quanto a burocracia portuguesa demora. Ela fez a manifestação pelo título de residência em outubro de 2019 e só conseguiu marcar o agendamento para levar a documentação ao SEF nesta sexta-feira (20), mais de um ano depois. Conseguiu com a ajuda de um advogado português, que, ainda assim, só encontrou disponibilidade na filial do SEF em Setúbal, que fica cerca de uma hora de Rio de Mouro, onde ela mora.

"Estou em contagem regressiva, contando os dias, pois o título de residência faz bastante diferença. Comecei a ver isso antes de sair do Brasil. Tinha uma preocupação bastante grande de ficar ilegal. Sempre foi assustadora para mim essa possibilidade, já que sou advogada também. Por ser brasileira, já sofro muito preconceito aqui, ainda mais sem esse documento. Vai ser libertador para mim", comemora Nathália.

Com a carreira consolidada no Brasil, ela decidiu realizar o sonho antigo de morar em Portugal, mas não imaginava que a burocracia atrapalhasse tanto, dificultando a procura por trabalho na sua área. Isso porque grande parte das empresas exige que os funcionários tenham alguma nacionalidade europeia ou ao menos um título de residência.

© Foto / DivulgaçãoNathália vai ao SEF na sexta levar a documentação para o título de residência: mais de um ano de espera
Portugal: 40% dos novos títulos de residência de estrangeiros são de brasileiros, confira histórias - Sputnik Brasil
Nathália vai ao SEF na sexta levar a documentação para o título de residência: mais de um ano de espera

Nathália acabou conseguindo emprego no setor administrativo de uma empresa mediadora de seguros, mas sem contrato de trabalho, uma garantia legal. Ela começou a trabalhar em agosto, mas no início de novembro o dono da empresa a fechou, pois não tinha dinheiro para pagar os funcionários.

"No dia do pagamento desse mês, disseram que não tinham condições de pagar, e ficou todo mundo na rua. Agora, o dono disse que vai parcelar em sete vezes. Quando chegou a data de assinar o contrato, eles haviam pedido para não registrar por dois meses para não pagarem impostos. Eu já havia decidido sair da empresa depois da data do pagamento. Mas eles quebraram antes de eu receber o salário e entregar a minha carta de demissão. Sei que com o título de residência vai ser melhor, pois muitas vagas de trabalho exigem esse documento. A primeira coisa que vou fazer na sexta, quando sair do SEF, é botar o número do título de residência no meu currículo", prevê Nathália.

Despacho do governo prevê regularização provisória de imigrantes até março

Recentemente, o governo português emitiu um despacho definindo que os imigrantes com processos pendentes no SEF que tenham dado entrada entre 18 de março e 15 de outubro ficarão regularizados de forma provisória até 31 de março de 2021. A medida permite que eles tenham acesso ao cartão do Serviço Nacional de Saúde, a abonos e apoios a trabalhadores independentes, assim como abrir contas em bancos e fazer contratos para a locação de imóveis.

Sputnik Brasil questionou o SEF quantos brasileiros estariam nessa situação de regularização provisória, mas o órgão informou que não tem esse número. A brasileira Vanessa Rodrigues Lima, advogada especializada em imigração, do escritório Abreu Advogados, explica que muitas entidades ainda não cumprem a nova legislação por desconhecimento.

"A regularização protege a situação dos cidadãos estrangeiros, que é precária, sem poder fazer registro na Segurança Social, abertura de conta bancária etc. O imigrante vê seus direitos acautelados. Mas, muitas vezes, centros de saúde, bancos e Segurança Social não têm noção de que o despacho existe e não o aplicam na prática. Temos que explicar. Ainda enfrentamos alguns entraves. Não devia ser normal, mas infelizmente é. As entidades terceiras, várias vezes, não têm noção dos diplomas aprovados", destaca Vanessa. 

A advogada brasileira, que mora há 27 anos em Portugal, diz que o atendimento no SEF está restrito e que os agendamentos estão sendo feitos para março e abril de 2021. Ela acredita que, permanecendo a situação da pandemia do novo coronavírus, um novo despacho governamental prorrogue o prazo da regularização provisória para imigrantes.

"O SEF tem adotado uma postura de limitar os agendamentos ao máximo, até tem feito alguns agendamentos aos poucos, mas de forma muito limitada e reduzida. Quando a COVID-19 for controlada, a tendência é aumentar ainda mais o número de imigrantes brasileiros aqui devido às crises política e econômica no Brasil", ela conclui.

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