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Como ficarão os programas sociais no Brasil em 2021?

© Folhapress / Rubens CavallariEm São Paulo, cidadãos formam filas para atendimento nas agências da Caixa Econômica Federal durante a pandemia da COVID-19, em 28 de julho de 2020.
Em São Paulo, cidadãos formam filas para atendimento nas agências da Caixa Econômica Federal durante a pandemia da COVID-19, em 28 de julho de 2020. - Sputnik Brasil
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A pergunta ainda é uma incógnita na sociedade. O programa Bolsa Família deve ser mantido, apesar de idas e vindas.

O governo do presidente Jair Bolsonaro queria dar nova roupagem ao programa petista, mas a ideia foi atropelada pela pandemia do novo coronavírus. Para minimizar os efeitos da crise sanitária, foi instituído o Auxílio Emergencial, cuja última parcela foi paga em dezembro de 2020, e o desafio agora é seguir atendendo mais de 60 milhões de pessoas afetadas pela crise sanitária e consequente crise econômica.

Será que um novo programa vai substituir o já consagrado Bolsa Família? O ministro da Economia, Paulo Guedes, chegou a anunciar a criação do que inicialmente se chamaria Renda Brasil, que virou Renda Cidadã, e voltou a ser alcunhado de Renda Brasil, mas que no final das contas não saiu do papel.

Qual o futuro do programa Bolsa Família?

O programa de transferência direta de renda, direcionado às famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza em todo o País, para que consigam superar a situação de vulnerabilidade e pobreza, foi criado no governo petista do presidente de Luís Inácio Lula da Silva.

© Folhapress / Everton Silveira/Agência FreelancerVista do Cartão Bolsa Família, da Caixa Econômica Federal, que serve para o beneficiário do programa realize o saque mensal do valor do programa
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Vista do Cartão Bolsa Família, da Caixa Econômica Federal, que serve para o beneficiário do programa realize o saque mensal do valor do programa

O programa busca garantir a essas famílias o direito à alimentação e o acesso à educação e à saúde. Em todo o Brasil, mais de 13,9 milhões de famílias são atendidas pelo Bolsa Família.

Em entrevista à Sputnik Brasil, o doutor em economia e professor da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), Cícero Péricles de Carvalho, disse que o Bolsa Família é um programa paliativo para atender aqueles que estão na pobreza ou extrema pobreza, mas a solução definitiva só pode ser conseguida com o crescimento econômico do país.

"O programa foi criado em 2004 e acredito que ainda tenha um longo futuro pela frente. É um programa elogiado a nível mundial. O governo atual tentou este ano trocar o Bolsa Família pelo Programa Renda Cidadã, depois Renda Brasil. Mas encontraram dois grandes problemas pela frente", explicou o especialista.

Segundo ele, o primeiro problema é que o governo não conseguiu desenhar um modelo alternativo de funcionamento de um programa que atinge 15 milhões de brasileiros e que já tem uma trajetória de sucesso. Segundo ponto, não encontrou formas de financiamento que não a estabelecida. "Por isso, o Bolsa Família deve permanecer por muito tempo fazendo parte da vida dos brasileiros", disse Cícero.

Para se candidatar ao programa, é necessário que a família esteja inscrita no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal, o CadÚnico, com seus dados atualizados há menos de dois anos.

O Bolsa Família deve reajustar o valor médio do benefício para R$ 200 (R$ 8 a mais em relação ao que é pago atualmente) e incluir mais 300 mil famílias, segundo informou o Ministério da Cidadania. O programa beneficia atualmente 14,2 milhões de famílias e tem orçamento previsto de R$ 34,8 bilhões para o ano que vem.

Para Luiz Signates — professor da Universidade Federal de Goiás (UFG) e coordenador do Núcleo de Pesquisas em Comunicação, Cidadania e Política — o governo Bolsonaro deve dar continuidade ao Bolsa Família, "mas por razões meramente eleitorais".

"Não existe uma política de equidade em curso, nem sequer uma preocupação do atual governo com a questão da desigualdade. Até por ser um governo de direita, o pensamento que prevalece é que a miséria é um problema de mercado, que se resolve sozinho se o Estado não intervir", analisou Signates.

Para o especialista, o programa deve continuar porque os políticos brasileiros descobriram que a população faminta agradece com voto a "esmola" que recebe: "Não que eu acredite que o Bolsa Família seja uma mera 'esmola', mas nesse governo atual a tendência é que o programa não seja mais do que a instrumentação das verbas públicas para garantir a reeleição do presidente Bolsonaro".

Programas sociais de distribuição de renda e pandemia

Com a decretação de situação de pandemia pela Organização Mundial da Saúde (OMS), governos de todo o mundo correram para criar medidas de ajuda financeira para as parcelas de suas populações afetadas diretamente pelas consequências da COVID-19.

No Brasil, foi criado o Auxílio Emergencial, programa que originalmente iria distribuir três parcelas de R$ 600 para ajudar trabalhadores com pouca ou nenhuma renda, além de informais, a fim de tentar amenizar as consequências econômicas da pandemia.

© Folhapress / Fernanda Luz / AgifEm Santos, litoral do estado de São Paulo, pessoas transitam de máscara em meio à pandemia da COVID-19 no Brasil, em 16 de agosto de 2020
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Em Santos, litoral do estado de São Paulo, pessoas transitam de máscara em meio à pandemia da COVID-19 no Brasil, em 16 de agosto de 2020

O programa foi depois ampliado com mais três parcelas de R$ 300. De início, Guedes queria que o programa servisse de base para o Renda Brasil/Cidadã. Lembrando que mães chefes de família (com idade mínimo de 16 anos) receberam três parcelas de R$ 1.200 e três parcelas de R$ 600.

Finalizado em dezembro de 2020, o Auxílio Emergencial atingiu cerca de 60 milhões de brasileiros. A partir da virada do ano essas pessoas ficam novamente desamparadas.

Para Cícero, o melhor cenário para a economia brasileira para o próximo ano seria o da continuidade dos mecanismos financeiros de apoio ao trabalhador, pois influenciaram fortemente o desempenho da economia nacional, principalmente nas regiões mais pobres, para a população que foi mais penalizada pela pandemia.

"Já em março tivemos a aprovação de uma agenda de medidas que já diminuiu em muito o impacto gerado pela pandemia. O Congresso Nacional aprovou um Auxílio Emergencial junto com o Ministério da Economia que chegou a cobrir até o mês de dezembro 67 milhões de brasileiros. Essa ajuda teve uma força muito grande para o setor de comércio e de serviços, que indiretamente beneficiou a agricultura e a indústria, e em consequência toda a economia nacional”, avaliou o economista.

O Legislativo federal, tem se mobilizado para achar outros meios de ajuda financeira após o fim do Auxílio Emergencial. Um exemplo é o Projeto de Lei 5009/20 que prevê a criação de um novo auxílio no valor de R$1.000 por mês. De acordo com o texto da proposta, o benefício seria pago pelo período de 12 meses.

​A nova proposta, já em trâmite na Câmara dos Deputados, objetiva beneficiar indígenas, quilombolas, ribeirinhos, pescadores artesanais, membros de outras comunidades tradicionais e assentados do programa de reforma agrária. Em resumo, visa a atender moradores do bioma Pantanal que tiveram a área onde vivem atingida por incêndios.

Outro Projeto de Lei propõe a extensão do Auxílio Emergencial e a prorrogação do estado de calamidade pública até 31 de março de 2021. A ideia é do senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE).

Essa forma de distribuição de renda é justamente o que muitos analistas avaliam que deveria ser permanente. Mas segundo Signates acabam esbarrando na "política de manutenção das desigualdades" imposta pelas elites.

"A questão da distribuição de renda é há muitas eleições a mais grave das carências do país. O Brasil é um dos mais desiguais, injustos e violentos do mundo. Este é um problema estrutural, ele não tem apenas um caráter econômico, mas também um aspecto muito forte político e talvez mais forte ainda cultural. A elite brasileira é mantenedora da desigualdade, é admiradora de privilégios e bastante indiferente ao sofrimento das pessoas pobres", declarou o especialista.

Equilíbrio entre assistência social e economia

O governo federal afirma que não pode manter o pagamento do Auxílio Emergencial sem desequilibrar as contas e aumentar o déficit fiscal, alegando que sinais de crescimento da economia também mostram que não "há necessidade" da continuidade do programa.

Mas para os especialistas ouvidos pela Sputnik, a manutenção dessa agenda de estímulo financeiro à economia deve continuar e já está sendo renegociada no âmbito do Congresso Nacional e do Ministério da Economia.

"O primeiro ponto importante a se entender é que com o fim do Auxílio Emergencial, permanece o programa Bolsa Família. O que está sendo discutido é se é possível estender esse programa — que atualmente atende 15 milhões de famílias — para aqueles que foram atendidos pelo Auxílio Emergencial, ou seja, cerca de 30 milhões de famílias. Isso seria estender o benefício para aqueles que estão inscritos no CadÚnico", avaliou Cícero.

Para Signates,  esse equilíbrio entre economia e assistência social só o Estado pode fazer: "Não é o socorro emergencial aos miseráveis que vai quebrar o país. O que compromete o Brasil é a destinação do orçamento, da ordem de metade da arrecadação nacional, para o sistema bancário, perpetuando com isso a concentração de renda".

Outras soluções são apontadas por eles, como por exemplo transformar o Programa Nacional de Apoio às Microempresas, o Pronampe, em linha permanente, com juros mais baixos, para "dar fôlego a cerca de seis milhões de negócios".

​"Essas empresas precisam ter acesso a essas linhas de crédito emergenciais, e o Pronampe foi o programa mais bem sucedido e já está aprovado no Senado Federal a sua transformação de linha emergencial em permanente”, esclareceu Cícero.

Esse tipo de abordagem vem ao encontro do que Signates descreve como "investimento da verba pública na redução das desigualdades: O discurso do Estado pesado por causa das políticas sociais é a meu ver absolutamente falso, pois uma política de reversão de renda que priorize o investimento da verba pública na redução das desigualdades, na promoção da justiça social, na criação de oportunidades dignas de trabalho só vai fazer o Brasil crescer".

O crédito emergencial para Microempreendedores Individuais (MEIs) também é uma ferramenta para fomentar a economia, ao auxiliar microempreendedores a dinamizar seus negócios e gerarem renda, com uma linha de crédito destinada à formalização do seu negócio.

Os especialistas ainda indicam outras medidas emergenciais que poderiam ser tomadas, como a antecipação para os meses de fevereiro e março do pagamento do 13ª salário para aposentados e pensionistas da Previdência Social, iniciativa que atingiria 21 milhões de brasileiros.

Perspectivas

O Ministério da Cidadania informou que em 2021 serão feitos pagamentos apenas resultantes de contestações administrativas e extrajudiciais, além de decisões judiciais, do Auxílio Emergencial. Se o auxílio realmente terminar, milhões de brasileiros ficarão sem ajuda do governo, o que pode gerar protestos e instabilidades sociais.

Ainda segundo o ministério, o Auxílio Emergencial esteve presente em cerca de 40% das residências brasileiras. O pico de pagamentos do programa aconteceu em julho, quando chegou a 44,1% dos domicílios.

© Sputnik / George RibeiroApós passeata pela avenida Rio Branco, os manifestantes se reuniram na Cinelândia, centro do Rio, 30 de maio
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Após passeata pela avenida Rio Branco, os manifestantes se reuniram na Cinelândia, centro do Rio, 30 de maio

Segundo os especialistas ouvidos nessa reportagem, outras formas de distribuição de recursos para dinamizar a economia são por exemplo o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda. Um milhão e meio de empresas brasileiras conseguiram realizar contratos, beneficiando 10 milhões de trabalhadores, com a garantia dos postos de trabalho ao longo da crise, segundo Cícero.

"As linhas emergenciais de crédito para empresas, com recursos federais, garantiram empréstimos de R$ 190 bilhões. Foi uma garantia para principalmente as micro e pequenas empresas, para que conseguissem atravessar esse ‘deserto’ econômico que se iniciou no mês de março", completou o economista.

O governo federal mantém vários outros programas de assistência social e de distribuição de renda como: FGTS Emergencial, Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec), Bolsa Verde, entre outros, que, por enquanto, devem continuar sendo executados. Somente nas próximas semanas as respostas serão dadas.

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