Mínima mudança política no acordo EUA-Talibã pode ameaçar processo de paz afegão, alerta analista

© REUTERS / Ibraheem Al OmariRepresentante dos EUA para o Afeganistão, Zalmay Khalizad (à esquerda) aperta mão do representante do Talibã (Abdul Ghani Baradar) em ato de assinatura de acordo de paz entre ambos os lados em 29 de fevereiro no Qatar
Representante dos EUA para o Afeganistão, Zalmay Khalizad (à esquerda) aperta mão do representante do Talibã (Abdul Ghani Baradar) em ato de assinatura de acordo de paz entre ambos os lados em 29 de fevereiro no Qatar - Sputnik Brasil
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Novo chefe do Pentágono anunciou retirada de tropas dos EUA do Afeganistão, contudo, analista político Sabtain Ahmed Dar disse à Sputnik que isso não é suficiente.

No dia 16 de novembro, administração do presidente Donald Trump ordenou o retorno de 2.500 soldados do Iraque e do Afeganistão, reduzindo assim a presença norte-americana nos dois países de 3.000 para 2.500 e de 4.500 para 2.500, respectivamente.

Anunciando a operação, o secretário da Defesa dos EUA em exercício Christopher C. Miller contou a jornalistas que esta decisão estava de acordo com a promessa do presidente Trump de acabar com "guerras eternas". Em 9 de novembro, Miller substituiu o ex-chefe do Pentágono Mark Esper, junto com Anthony Tata, Ezra Cohen-Watnick e Kash Patel, que assumiram cargos importantes no Departamento da Defesa após uma série de demissões.

Acordo EUA-Talibã e retirada de tropas

A retirada dos militares foi uma das principais disposições do acordo de Washington com o Talibã (organização terrorista proibida na Rússia e em outros países) assinado em 29 de fevereiro 2020, em Doha, Qatar. Em troca, o grupo, que se refere a si mesmo como o Emirado Islâmico do Afeganistão, se comprometeu a cessar todas as atividades militares e entrar em negociações com o governo do país.

Reforma de hoje está diretamente alinhada com todas as três minhas prioridades, como foi ressaltado na minha mensagem às Forças na segunda-feira (16)

Em 10 de novembro, o Talibã ligou a Joe Biden, que a mídia previa que ganharia a eleição, para continuar comprometido com o acordo de paz assinado em Doha.

Não é certo qual estratégia Biden adotaria, no entanto, mesmo a mínima mudança política no acordo EUA-Talibã poderia ameaçar o processo de paz no Estado da Ásia Central, considera o analista político paquistanês Sabtain Ahmed Dar.

Ele elogia a decisão de Trump de iniciar negociações com Talibã que, segundo a opinião dele, terminou o impasse de décadas e abriu caminho para a paz no país dilacerado pela guerra.

"A principal razão por que a resolução do conflito na crise afegã correu tranquilamente desde setembro de 2019 é a administração de Trump ter entendido que sem reconciliação com o Talibã não existiria saída do Afeganistão", notou o especialista durante entrevista à Sputnik Internacional, adicionando que Islamabad desempenhou um papel importante no processo.

No entanto, Joe Biden provavelmente se oporia à retirada total porque a mesma derrubaria "uma narrativa de duas décadas sobre o movimento Talibã e suas alegadas ligações com Al-Qaeda", explicou.

"[Ao mesmo tempo], Biden não vai se sentir confortável com impasse atual entre as partes interessadas no Afeganistão", sugeriu ele. "No processo de paz inteiro pode ocorrer uma falha e isso vai acontecer pelas mãos do governo afegão, o qual frequentemente se sentiu irrelevante durante todo o processo de paz afegão. Eles poderiam considerar este fato como grande lacuna a explorar para sua inclusão no processo de paz afegão, algo de que o Talibã não gostaria."

Mesmo assim, Dar espera que Biden não abandone o processo de paz no Afeganistão e continue respeitando as principais disposições do acordo EUA-Talibã.

Depois de principais mídias norte-americanas terem declarado Biden como ganhador provisório da corrida presidencial, o presidente do Afeganistão Ashraf Ghani pediu a ajuda do ex-vice-presidente para "ajudar a combater o terrorismo" no país e aprofundar a "parceria estratégica multicamada" entre Cabul e Washington. Ao mesmo tempo, políticos afegãos expressaram já várias vezes suas preocupações pela retirada "apressada" das tropas dos EUA da região.

Mais provável é que Biden deixe uma força contraterrorista no Afeganistão, escreveu Stars and Stripes em 10 de novembro, citando sua entrevista com o ex-vice-presidente em setembro. O jornal militar dos EUA também sugeriu que Biden "manteria a maioria dos pontos do acordo" celebrado entre Talibã e administração de Trump.

Além do mais, em fevereiro o candidato presidencial do Parido Democrata contou sem rodeios à CBS News que a América teria "responsabilidade nula" se o Talibã voltasse ao poder no Afeganistão após a retirada.

Afeganistão necessita presença policial dos EUA e Paquistão

Por sua parte, o Paquistão, aliado regional mais próximo do Afeganistão, está pronto para colaborar com qualquer administração norte-americana, apoiando seu vizinho centro-asiático, anuncia Dar.

"É importante entender a mudança recente na política do Paquistão no relacionamento com os EUA. O principal objetivo da política externa do Paquistão refere que 'nós não faremos parte de nenhuma guerra norte-americana'", ressaltou o analista. "O Paquistão quer boas relações com os EUA e quer que Washington continue participando do processo de paz no Afeganistão."

Ao mesmo tempo, Islamabad seguirá defendendo um papel político para o Talibã no futuro governo de Cabul e apela à Casa Branca para aprovar a nova estrutura híbrida de poder, segundo as palavras de Dar.

"O fundamental é ter visão compartilhada e encontrar terreno comum para uma estrutura de poder afegã entre Cabul e o Talibã", acredita. "Em qualquer caso, tanto o Talibã como Cabul teriam que chegar a acordo e elaborar um manifesto de partilha do poder que possa ser executado estruturalmente na direção de um sistema político híbrido."

Após décadas de hostilidades, o acordo de paz final entre Cabul e a liderança política do Talibã tem importância extrema, destaca analista. Entretanto, as aparentes tentativas do governo afegão de fazer fracassar este processo, excluindo o Talibã da vida política do país, deveriam ser prevenidas em prol do processo de paz, segundo Dar.

"Se não estiver devidamente integrado em um acordo de partilha do poder, o Talibã provavelmente continuaria lutando por seus direitos, usando mesmo a militância para atingir seus objetivos", avisou o especialista em conclusão.

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