Indústrias tiram água do povo no México; qual será o resultado?

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O México vive momentos críticos com relação ao manejo de um dos recursos fundamentais para a vida - a água. Sputnik apresenta os diferentes pontos de vista que existem sobre o mesmo problema.

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O ano de 2018, último da Administração Peña Nieto, está marcado por um debate vital, o das águas potáveis. A polêmica é apresentada no projeto de Lei Geral de Águas, ou Lei Pichardo, como é conhecida popularmente, um conjunto de documentos que, para alguns, pode colocar em risco o consumo do recurso mais importante para a vida, enquanto que para outros não é um tema que sequer existe na agenda política do país.

"Está sendo discutida a privatização da água. As autoridades estão dando prioridade de uso deste recurso vital para as indústrias extrativistas. Estão levando água das bacias para zonas áridas onde há petróleo, gás e minerais. Trata-se de atividades que utilizam grandes quantidades de água e, além disso, contaminam-na", disse à Sputnik Mundo Juan Ángel Trasviña Aguilar, presidente da Sociedade Meio Ambiente, uma associação civil com mais de 10 anos de experiência defendendo recursos hídricos.

"Os que falam da Lei Pichardo não estão informados, ou se estão, possuem más intenções. Não existe essa lei, mas uma plataforma a cargo da Comissão de Água Potável da Câmara dos Deputados. Tratou-se de apresentações e propostas para falar de uma mudança radical de modelo de gestão da água no México", destacou em diálogo com a Sputnik Mundo Roberto Oliveira, diretor-geral da Associação Nacional de Empresas de Água e Saneamento do México (ANEAS).

Mas nem todos compartilham a mesma visão. Trasviña Aguilar afirmou que "o projeto está sendo discutido entre deputados e de lá iria para o Senado. Sabemos que quando isso acontece em uma Câmara, na outra se maquia e se produz um passe automático. A norma viola os direitos humanos de acesso à água. Não garante a acessibilidade do líquido, em especial a pessoas de baixa renda".

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De acordo com dados do portal Agua.org.mx, 102.653 aquíferos do país estão sendo explorados, e entre 30 e 50% da água para abastecimento público é perdida por vazamentos nas redes e domicílios. No México, apenas 10% da água doce é destinada ao consumo doméstico.

Globalmente falando, as atividades agropecuárias consomem a maior quantidade de água doce, com uma média de 70%, no México a média é maior, pois agricultura e pecuária consomem 76% do recurso disponível. Neste país, o setor agropecuário não paga direitos pelo uso e recebe subsídios no custo de energia quando são utilizadas águas subterrâneas. O setor gera cerca de 62% das águas residuais (cargas orgânicas, pesticidas e fertilizantes, entre outros poluentes).

Diante da perspectiva de uma nova Lei de Águas, há grupos civis que estão se organizando para assegurar que seus interesses sejam representados. "Há muita pressão social, mas o panorama é muito complicado, porque os nossos representantes não querem ouvir", disse Trasviña Aguilar, que está preocupado com a segurança de sua família.

De acordo com um relatório do Centro Mexicano de Direito Ambiental (CEMDA), entre 2010 e 2016, foram registrados 303 casos de ataques a defensores dos direitos ambientais. Trasviña Aguilar e seus apoiadores foram ameaçados.

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A Lei de Águas Nacionais que está em vigor atualmente foi imposta como condição para que o México entrasse no Tratado de Livre Comércio da América do Norte em meados dos anos 90, explicou Helena Burns, coordenadora nacional da associação Agua para tod@s, água para la vida.

"Privatizaram a água através de concessões. Em seguida, veio uma reforma que obrigou mudar o quadro legal e ter uma nova lei geral voltada para o direito humano à água e que tem que assentar as bases para a participação da cidadania em conjunto com os três níveis do governo, para conseguir o acesso equitativo e sustentável à água. Há 360 dias para alcançá-lo, mas não fizeram nada, querem que a água passe do Estado às empresas transnacionais e nós do estado para a cidadania", acrescentou.

Burns indicou que o que procuram os privatizadores é cortar a drenagem e a água, se houver atraso de dois pagamentos. Disse também que o direito humano à água é grande e alguns setores governamentais e financeiros estão à procura de uma definição restrita, que prevê um limite de 50 litros diários de água por pessoa. Por isso, enfatizou que o atual é "um debate com consequências enormes" para o país.

No entanto, para Olivares, as asserções de que a suposta Lei Pichardo favorece as indústrias extrativistas "são mitos". "Em qualquer parte do mundo hoje tem participação privada, porque assim é requerido. Estamos sofrendo uma redução orçamentária de quase 80% do ano passado para agora, para investimento em subsídio. Nestas condições, como é que vamos ir adiante, se não é com concessões?", disse.

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Para o diretor da ANEAS há uma diferença entre o direito humano de acesso à água e os serviços de água potável e saneamento que necessitam de recursos e insumos para realização. "Quando alguém está falando ‘não à privatização' há que perguntar de onde os operadores vão tirar dinheiro?", questionou Olivares, que participa do Conselho Mundial da Água a nível regional.

A visão de Burns é oposta. Segundo a ativista, os legisladores mexicanos têm sido "muito sensíveis" às exigências dos investidores privados estrangeiros. "O executivo realizou reformas legislativas que permitiram o uso de águas nacionais para extração. Isso é inconstitucional, pois o executivo está legislando. Agora se procura separar as empresas de suas responsabilidades sobre a poluição. Estamos falando de uma crise da água que se sente em todo o país", sublinhou.

As visões para melhorar o serviço também são diferentes. "Sem participação privada ou receitas forte por tarifa, de onde vão sair os recursos? Não se entrega a água aos estrangeiros para que continuem nos colonizando, há ncessidades de investimento importantes. Se a Lei de Águas Nacionais determina que a água é um assunto prioritário e de segurança nacional, não vejo como se pode fazer para atender às suas necessidades, a curto, médio e longo prazo. A nova lei apresentada deve ter um conteúdo que possibilite a participação privada. Não há outra forma de garantir a sustentabilidade dos serviços de água e saneamento", insistiu Olivais.

Além da disputa, o certo é que, no México, um dos países mais populosos do mundo, o acesso à água é um problema grave. De acordo com Agua.org.mx, quase 13 milhões de pessoas não dispõem de água potável, e 43% dos mexicanos não têm instalações sanitárias mínimas.

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