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Bolsonaro x STF: algum dos lados 'atropelou' a lei brasileira no caso do depoimento à PF?

© REUTERS / Adriano MachadoMinistro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), em uma sessão em 17 de abril de 2018
Ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), em uma sessão em 17 de abril de 2018 - Sputnik Brasil, 1920, 31.01.2022
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Especialistas ouvidos pela Sputnik Brasil elucidam conflito jurídico entre Bolsonaro e o ministro Alexandre de Moraes, do STF, após presidente se ausentar em depoimento à Polícia Federal.
O presidente Jair Bolsonaro alega que exerceu o "direito de ausência" ao não comparecer à Polícia Federal para prestar depoimento, na última sexta-feira (28), no inquérito que apura o vazamento de informações sigilosas durante uma transmissão ao vivo em sua rede social.
Mas o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), negou seu recurso e voltou a determinar que Bolsonaro deve comparecer presencialmente à PF.
Afinal, quem tem razão no novo embate jurídico entre os poderes? Algum lado cometeu abuso de poder ou algum tipo de infração passível de penalidade?
Especialistas consultados pela Sputnik Brasil entendem que não há motivos para alarde sobre o caso, já que existem bases jurídicas para as decisões de ambos os lados.
Tudo começou no dia 4 de agosto de 2021, quando Bolsonaro divulgou em suas redes sociais a íntegra de uma investigação da PF, que tramitava em segredo de justiça, sobre um ataque hacker aos sistemas internos do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
A pedido do tribunal, o ministro Alexandre de Moraes determinou a abertura de uma investigação sobre o vazamento do documento, ordenando a remoção das postagens das redes sociais e o afastamento do delegado da PF responsável pelo caso.
Durante o inquérito, o presidente concordou que teria 60 dias para agendar seu depoimento, escolhendo dia, hora e local. Porém, como Bolsonaro não se manifestou no período, Moraes o intimou a depor no último dia do prazo estabelecido, na sexta-feira (28) da semana passada, às 14h.
Momentos antes do horário estipulado, a Advocacia-Geral da União (AGU) impetrou recurso no STF para suspender o depoimento, mas o ministro Alexandre de Moraes rejeitou o pedido.
Mesmo assim, o presidente não compareceu. Em carta enviada à PF, Bolsonaro citou duas ações analisadas pelo STF em 2018 para embasar sua decisão.
As referências eram decisões do Supremo que proibiram a condução coercitiva, usada com frequência durante a Operação Lava Jato, inclusive contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2016.

"O que o presidente fez pode ser analisado como um constrangimento político, não como crime de responsabilidade", afirmou à Sputnik Brasil Leandro Mello Frota, cientista político e advogado especializado em Direito Público.

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Segundo ele, o presidente exerceu seu "direito constitucional ao silêncio" quando não compareceu à Polícia Federal. O especialista entende que a atitude, tomada a poucos minutos do horário do depoimento, denota, não uma infração de Bolsonaro, mas sim sua estratégia de confrontar os poderes para obter vantagens políticas.

"É natural que os poderes discordem em uma democracia, que tenham visões diferentes. O que acontece é que Bolsonaro tem uma política de choque, de polêmica. Ele vem testando até onde vai esse limite de crise institucional", disse Frota.

Para Acacio Miranda da Silva Filho, especialista em Direito Constitucional e Penal, a relação entre os poderes vem se desgastando desde o início do mandato de Bolsonaro.

"Ele estica a corda ao máximo e, quando sente que está próxima de estourar, faz alguns gestos que recompõem a relação entre os poderes", disse Miranda à Sputnik Brasil.

Quanto aos embates mais fervorosos com Moraes e com o ministro Luís Roberto Barroso, o especialista acredita que o presidente projeta a intenção de sugerir a "imparcialidade ou suspeição" de ambos em eventuais processos contra ele no TSE - além do STF, os dois também são ministros do tribunal.
Miranda, no entanto, avalia que o STF tem dois caminhos para responder à recusa do presidente em depor: permitir a remarcação do depoimento, seja por escrito ou de forma presencial, ou entender que o não comparecimento configura "desobediência de decisão judicial".
Ele afirma que, no segundo caso, a corte poderia, então, "oficiar a presidência do Congresso pelo eventual cometimento de um crime de responsabilidade".

Há previsão legal quanto a possibilidade de o presidente responder enquanto testemunha de forma escrita de acordo com circunstâncias que entender conveniente. Contudo, não temos na história nenhuma situação em que o presidente deixou de responder ou de comparecer a um depoimento. É uma situação totalmente inédita", afirmou Miranda.

Matheus Falivene, advogado e especialista em Direito Penal, admite a possibilidade de um debate sobre suposto crime de responsabilidade do presidente. Porém, em sua visão, Bolsonaro "está, em tese, exercendo o direito de autodefesa e de não comparecer perante autoridade policial ou judiciária".

"Para evitar o conflito entre poderes, o Código de Processo Penal prevê expressamente que o presidente, governadores e prefeitos podem combinar com o juiz o local e a hora que serão inquiridos. Com relação ao presidente e ao vice-presidente, é possível optar por responder por escrito", detalhou Falivene.

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Atuação de Moraes no caso

Embora tenham divergido em alguns pontos sobre a decisão do presidente, os especialistas foram unânimes ao avaliar a atuação do ministro Alexandre de Moraes. Nenhum deles acredita que Moraes tenha cometido abuso de poder ou outro tipo de excesso.
"Não houve abuso por parte do STF", garantiu Acacio Miranda da Silva Filho, recordando o respeito às normas constitucionais do ministro quanto ao prazo e a forma do depoimento. "O que houve foi um desrespeito por parte do presidente à corte constitucional".
O cientista político e advogado Leandro Mello Frota explica que a Advocacia-Geral da União (AGU) perdeu prazo do agravo para pedir a suspensão do depoimento, que se encerrou no dia 6 de dezembro.
Ao rejeitar o pedido da AGU, o ministro afirmou que, ao contrário do que diz o recurso, o presidente "concordou expressamente com seu depoimento pessoal".
De acordo com Moraes, a mudança de posição configura "preclusão lógica", que ocorre quando uma parte adota comportamentos que se contradizem em um processo ou investigação.

"Em razão da quebra do dever de cooperação e do princípio da boa fé, o ministro poderia ter aplicado multa processual ao presidente, mas a princípio não vejo excessos", apontou Frota.

Se não há infração de nenhum dos lados, teoricamente a divergência poderia abrir caminho para uma nova rodada de tensões políticas entre os poderes.
Porém, Falivene, advogado e especialista em Direito Penal, acredita que o caso ficará sob o guarda-chuva jurídico.

"Não acredito que o presidente deva politizar a questão. É uma questão jurídica e não política. Não acho que houve abuso, Bolsonaro ignorou e gerou um conflito, mas acredito que ficaremos no debate jurídico", afirmou.

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