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Por que evangélicos estão deixando de apoiar Bolsonaro e quais seriam as consequências em 2022?

© UESLEI MARCELINOPresidente do Brasil, Jair Bolsonaro, gesticula durante cerimônia para a Modernização das Normas de Segurança e Saúde Ocupacional, no Palácio do Planalto em Brasília, Brasil 7 de outubro de 2021
Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, gesticula durante cerimônia para a Modernização das Normas de Segurança e Saúde Ocupacional, no Palácio do Planalto em Brasília, Brasil 7 de outubro de 2021 - Sputnik Brasil, 1920, 27.10.2021
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A Sputnik Brasil conversou com Rafael Rodrigues da Costa, sociólogo, mestre em Ciências Sociais pela Unifesp e pesquisador visitante da Universidade Federal da Bahia (UFBA), para compreender o declínio de Bolsonaro entre os evangélicos.
Aparentemente, o apoio de Bolsonaro entre os evangélicos parece estar com os dias contados. De acordo com a última pesquisa Datafolha, 29% dos evangélicos consideram o governo Bolsonaro ótimo ou bom, sendo este o menor índice já registrado desde que assumiu o poder.
Para compreender este declínio do presidente Jair Bolsonaro, a Sputnik Brasil conversou com Rafael Rodrigues da Costa, sociólogo, mestre em Ciências Sociais pela Unifesp e pesquisador visitante da Universidade Federal da Bahia (UFBA).
Explicando como os evangélicos votaram nas eleições de 2018, quando Bolsonaro foi eleito, o especialista ressaltou que os evangélicos tiveram uma grande participação naquelas eleições para uma candidatura presidencial, o que é "algo novo para o Brasil", já que anteriormente os evangélicos eram mais envolvidos nas campanhas legislativas, elegendo senadores, vereadores e deputados federais, nunca tendo um apoio tão coeso em torno de uma candidatura presidencial.
Segundo ele, anteriormente alguns dos evangélicos "votavam muito mais por questões de classe do que necessariamente pelo voto religioso", contudo, isso mudou completamente em 2016 em virtude do impeachment da Dilma, do clima envolvendo o Brasil e da forte crise econômica que atingiu os pobres em cheio.
"Na eleição de 2016, o discurso antipetista se junta com o impeachment da Dilma, e isso vai virar literalmente uma onda evangélica em torno de algumas candidaturas, e é nessa onda que o Bolsonaro surge, principalmente em 2018", declarou Rafael Rodrigues da Costa, lembrando que em 2018 Bolsonaro contou com 70% dos votos evangélicos.
Além disso, o especialista destaca que em 2018 houve uma junção de fatores que colaboraram com a eleição de Bolsonaro, como o "caldo econômico, que vai fazer com que os evangélicos, que são pobres e negros em sua maioria, abandonem o petismo, o lulismo, para abraçar o próximo candidato que viria". Além disso, o "Bolsonaro tem um diálogo muito grande com os evangélicos", e compõe um quadro de pessoas que tinham um trânsito muito grande com os evangélicos, como a Damares, que já está há 20 anos no meio evangélico.
"Quando o conjunto de personagens evangélicos começa cada vez mais a se associar à candidatura de Bolsonaro, ele acaba se tornando mais palatável", afirmou.
Para o especialista, dessa forma o primeiro ponto foi o ponto de vista econômico, onde a crise veio e os evangélicos decidiram procurar um outro candidato que não fosse do PT. Já o segundo ponto foi o nível político, onde o Bolsonaro soube dialogar com os evangélicos como com nenhum outro grupo.
"Dentro da narrativa cristã, existe uma ideia de que aquele personagem que sofre uma violência, ele geralmente é o portador da verdade, ou seja, se a vítima estiver sofrendo uma violência, então ela é portadora da verdade, e os donos desse mundo estão querendo silenciar essa pessoa", recordou.
Ele também diz que o Bolsonaro soube explorar isso, com uma narrativa mitológica, onde ele é o "mocinho", como representante dos valores cristãos, conservadores, contra todo o progressismo e toda a ideologia de gênero, e o mais importante para os evangélicos era sentir que o Bolsonaro estava lutando contra "estas forças malignas", fazendo com que eles se unissem ao Bolsonaro.

Pandemia e temas mais importantes para os evangélicos

Com relação aos temas mais importantes para os eleitores evangélicos para 2022, Rafael Rodrigues da Costa afirma que a questão econômica deve ser um destes temas, já que o Brasil vive um momento em que metade de sua população está sofrendo algum nível de insegurança alimentar, o que atinge diretamente os evangélicos.
De acordo com o especialista, 65% dos evangélicos ganham apenas um salário mínimo, sendo "muito pobres", enquanto 57% dos evangélicos são negros, ou seja, eles vivem na base da pirâmide social brasileira, e estão sofrendo a inflação, a deterioração das condições de trabalho.
"Estas pessoas estão sofrendo muito durante a pandemia, tiveram uma melhora em 2020 com o auxílio emergencial, que teve um impacto enorme para essa população, mas agora estão dependendo muito do Auxílio Brasil, da melhora da economia, redução da inflação [...] E fora que muitas dessas pessoas perderam vidas durante a pandemia, perderam familiares, pessoas queridas", ressaltou.
Para o especialista, a pandemia e o fator econômico são fatores que surgirão na próxima eleição, com boa parte dos eleitorados tentando saber quais atitudes serão tomadas em relação ao emprego, à inflação e às questões econômicas.
Contudo, ele ressalta que ainda é cedo para prever o que vai acontecer nas eleições de 2022.
"Eu não posso dizer que não vai ter peso a questão dos costumes ou do que o Bolsonaro pode fazer para gerar informação e criar pauta na imprensa a seu favor, mas o fato é que as pessoas estão muito preocupadas com a questão econômica, mesmo entre os evangélicos", declarou.

Queda de Bolsonaro entre evangélicos não favorece Lula

Mesmo com uma queda de 11 pontos na aprovação do governo Bolsonaro entre os evangélicos, Lula não está conseguindo atrair votos destes eleitorados.
Rafael Rodrigues da Costa observa que hoje Lula e Bolsonaro estão em igualdade entre o eleitorado evangélico, contudo, os evangélicos possuem uma campanha muito forte antipetista realizada pelas lideranças.
Além disso, existe uma dificuldade da esquerda de dialogar com os evangélicos, "uma dificuldade estrutural", já que os quadros de liderança da esquerda, aparentemente, tendem a estar entre a classe média, mais intelectualizada e dos bairros centrais, ou seja, falta sensibilidade para notar a importância da igreja para essas pessoas. A igreja é o centro comunitário para a periferia.
"Muitas vezes uma parte da esquerda, mais intelectualizada, de extratos mais abastados, não entende a importância da igreja e olha apenas para a questão de fé, para os caciques, como Malafaia, Edir Macedo, e sempre trata com este desprezo estes segmentos", comenta.

Candidato da 'terceira via' com maior aceitação entre os evangélicos

Rafael Rodrigues da Costa afirma que há um cenário "muito difícil" para a terceira via em uma conjuntura internacional.
"Os candidatos da terceira via ainda não apareceram para valer. Por exemplo, o Doria ainda está disputando com o Adriano Leite dentro das prévias do PSDB. Temos poucos nomes que a gente sabe [...] Ainda é um cenário de muita especulação, e isso dificulta um pouco até para o horizonte dos evangélicos", observou o especialista, ressaltando que devido a isso é difícil saber como os evangélicos vão se comportar.
Contudo, ele afirma que existem algumas pessoas que têm um trânsito muito grande entre os evangélicos, sendo que o Moro seria o melhor nome para isso, já que possui um grande trânsito entre os evangélicos, contudo ainda é cedo para falar que o segmento vai apoiar o Moro em uma possível eleição.
"Existem dois movimentos hoje acontecendo dentro dos evangélicos. De um lado, as lideranças tentando reagrupar os evangélicos em torno da candidatura do Bolsonaro [...] E do outro lado, você tem uma completa desorganização da terceira via. Eles não sabem para quem eles vão", explicou.

Questão religiosa será válida nas eleições de 2022?

De acordo com Rafael Rodrigues da Costa, é sempre interessante observar o segmento religioso, porque a religião não é apenas uma fé, uma crença, mas sim um modo de ver e entender o mundo.
Além disso, ele afirma que 88% do Brasil é religioso, e 91% fazem parte de algum culto regularmente, indicando que a religião tem muito peso, já que as pessoas valorizam muito a religião.
"A religião, ela é muito importante para os valores e crenças de sociabilidade das pessoas, mas também porque dentro da religião vemos uma espécie de retrato desse universo social que é o Brasil, as suas contradições, todas as suas tensões e sua diversidade", concluiu.
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