COVID-19: Portugal passa a exigir teste negativo para entrar em restaurantes; medida divide médicos

© REUTERS / PEDRO NUNESSinal vermelho: pessoas com máscara de proteção andam pela Baixa de Lisboa, em 8 de julho de 2021
Sinal vermelho: pessoas com máscara de proteção andam pela Baixa de Lisboa, em 8 de julho de 2021 - Sputnik Brasil, 1920, 09.07.2021
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A partir deste sábado (10), quem quiser entrar em restaurantes de 60 municípios de Portugal, incluindo a capital, terá que apresentar um teste negativo de COVID-19 ou certificado digital que indique vacinação ou recuperação da doença. Médicos ouvidos pela Sputnik Brasil divergem sobre a regra.

A medida foi aprovada no Conselho de Ministros, nesta quinta-feira (8), e valerá nos 27 municípios que apresentam risco elevado, que ultrapassaram 120 casos por 100 mil habitantes por duas semanas seguidas, e nos 33 onde o risco é muito elevado, ultrapassando os 240 casos por 100 mil habitantes.

A princípio, a exigência será feita apenas aos fins de semana, a partir das 19h00 de sexta-feira até as 22h30 de domingo. Nas esplanadas (mesas ao ar livre), não será necessário apresentar testes ou certificados. 

Com isso, os restaurantes voltam a poder funcionar nos fins de semana na parte da noite nos municípios onde a situação é pior. Antes, eles tinham que fechar às 15h30. Também foram suspensas as proibições de entrar e sair da Área Metropolitana de Lisboa (AML) a partir das 15h30 desta sexta-feira (9).

Para entrar nos restaurantes serão aceitos testes negativos de três tipos: PCR, realizado até 72 horas antes; antígeno, até 24 horas antes; e autotestes rápidos, feitos na hora. Os autotestes poderão ser vendidos nos próprios restaurantes e também em mercados, mas não há previsão para o início dessa venda. Atualmente, só são encontrados em farmácias. 

O descumprimento da regra valerá multas entre € 100 (R$ 624) e € 500 (R$ 3.120) para os clientes e entre € 1.000 (R$ 6,24 mil) e € 10 mil (R$ 62,4 mil) para os restaurantes. A fiscalização ficará a cargo do responsável pelo estabelecimento. Em caso de eventos maiores, poderão ser acionadas forças de segurança. Menores de 12 anos não precisam fazer os testes.

A exigência será estendida também a hotéis e estabelecimentos turísticos, mas, neste caso, há consenso entre os médicos. Após o anúncio da medida, Mariana Vieira da Silva, ministra de Estado e da Presidência, explicou que um dos objetivos era a normalização do horário de funcionamento dos restaurantes.

"Hoje, com o certificado digital, com uma disponibilização muito mais frequente de testes, sejam eles PCR, antígeno ou testes rápidos, temos outras condições para garantir que em algumas atividades econômicas temos mais condições de segurança sem as mesmas restrições", disse a ministra em conferência de imprensa.

'Medida absurda, uma temeridade', critica médico carioca

Em entrevista à Sputnik Brasil, o médico carioca Marcio Sister, que mora em Vila Nova de Gaia, no norte de Portugal, não poupa críticas à medida. Ele se respalda no crescimento do número de casos e de mortes. De acordo com o último boletim epidemiológico da Direção-Geral da Saúde (DGS), nas últimas 24 horas houve 3.194 novas infecções e sete óbitos. A média diária de casos subiu 54%.

"Achei absurda a medida nesse momento, porque os números estão alarmantes. Apesar de [os governantes] terem dito lá atrás que, se fossem ultrapassados os limites de tolerância daquele planejamento [de desconfinamento], não se inibiriam em voltar atrás, me dá a sensação de que alguém não quer. Acho que a economia está falando mais alto. Só que, nesse momento, uma medida dessas é completamente não factível", avalia Sister.
© Foto / DivulgaçãoO médico carioca Marcio Sister mora em Vila Nova de Gaia, no Norte de Portugal
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O médico carioca Marcio Sister mora em Vila Nova de Gaia, no Norte de Portugal

De fato, as medidas de controle da pandemia têm sido motivo de conflito político entre o primeiro-ministro António Costa e o presidente Marcelo Rebelo de Sousa. Enquanto Costa tem cogitado ações mais severas, não descartando sequer a volta ao confinamento, Rebelo de Sousa já avisou, mais de uma vez, que, no que depender dele, não será decretado novo estado de emergência. 

Os ruídos na comunicação entre os dois governantes aumentaram depois que Costa, mesmo já vacinado, cumpriu isolamento profilático após ter tido contato com um membro do seu gabinete que testou positivo para COVID-19. Na avaliação do presidente, externada publicamente, o governo deveria explicar à população o motivo do confinamento do premiê, sob o risco de levantar suspeitas sobre a eficácia da vacinação.

© AFP 2023 / PATRICIA DE MELO MOREIRAMarcelo de Sousa Rebelo e António Costa, respectivamente, presidente e primeiro-ministro de Portugal
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Marcelo de Sousa Rebelo e António Costa, respectivamente, presidente e primeiro-ministro de Portugal

Para além das contendas políticas, Sister considera complexas a operacionalização e a fiscalização da apresentação de testes negativos ou certificados digitais para entrar em restaurantes. Em tese, clientes que fiquem em mesas no exterior precisarão apenas usar a máscara para ir ao banheiro, mas estarão dispensados dos testes.

"As esplanadas estão liberadas. Você vai a um restaurante e fica na esplanada sem fazer exame nem apresentar nada. Fica com uma vontade enorme de ir ao banheiro. Quem vai controlar sua entrada? Vai ter que ter um funcionário a mais para isso. Ou um garçom vai fazer esse papel? Ou o dono do restaurante? Como é esse controle?", questiona.

Sister levanta outras dificuldades como em tascas, restaurantes menores, em que há apenas dois garçons, um para atender as mesas da esplanada e outro para o interior, quando não apenas um. Ele enumera outros problemas como a falsificação de testes e certificados, além de falsos negativos e resultados inconclusivos.

Para o especialista, a melhor solução é fechar os restaurantes nos municípios que apresentem o risco mais elevado até que se atinja a imunidade de rebanho por meio da vacinação.

"Se a coisa está tão [ruim] assim, fecha. Não tem jeito. É uma temeridade. Acho que em alguns lugares tinha que fechar. Enquanto não tiver vacinação dessa turma toda, não adianta ter certificado digital. Me assusta um pouco a análise disso", acrescenta.

Ordem dos Médicos recomenda substituição de autotestes

O médico acredita que a medida não vai durar muito tempo e será revista já na próxima semana.

"Acho muito atabalhoada e confusa essa decisão. Ninguém pensou como vai se operacionalizar. Na segunda, acho que eles vão rever essa medida. Não vai dar certo. Veio numa hora muito ruim. Eles tinham que tomar uma medida mais enérgica. Vai espantar as pessoas mais ainda. Vou parar de ir a restaurantes", admite.

Por sua vez, Miguel Guimarães, bastonário (presidente) da Ordem dos Médicos de Portugal, é favorável à nova regra, mas afirmou que a aceitação de autotestes "não é uma medida adequada" de prevenção e proteção contra a COVID-19 e defendeu que sejam substituídos por testes de antígeno.

"Os autotestes não têm viabilidade e podem dar falsas sensações de segurança, como tem acontecido em várias reuniões familiares e sociais porque os autotestes falham bastante. Não é uma medida adequada", disse Guimarães, citado pela Agência Lusa.

A médica gaúcha Nair Amaral, que trabalha na linha de frente de combate à COVID-19 em dois hospitais da Área Metropolitana de Lisboa, não é contrária à nova medida. Ela acredita que a exigência de testes negativos e certificados digitais é uma forma de tentar controlar o contágio, mas faz uma ponderação sobre os testes rápidos.

"Não sou contra, mas estão pressupondo que uma pessoa com teste rápido negativo não está transmitindo o vírus. O que não é bem assim, existem 'janelas' imunológicas, em que os testes rápidos não são eficazes", explica Nair Amaral à Sputnik Brasil.
© Foto / DivulgaçãoA médica gaúcha Nair Amaral em ação na linha de frente de combate à COVID-19 em Portugal
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A médica gaúcha Nair Amaral em ação na linha de frente de combate à COVID-19 em Portugal

Médica gaúcha reforça importância da aceleração da vacinação

Ela ressalta a dificuldade de barrar o contágio com o SARS-CoV-2. Na opinião da especialista, há três soluções a curto prazo: vacinação em massa, sem burocracias; pessoas imunocomprometidas, mesmo vacinadas, devem manter máscaras até que não existam variantes com alta virulência; e todos os que não convivem na mesma casa devem manter distanciamento. 

"Evitar aglomerar-se com estranhos porque é na proximidade desprotegida que adquirimos o vírus. Se entro em um restaurante de máscara, o garçom está de máscara, se retiro somente para comer e falar com quem convivo, se as mesas estão distantes, se o restaurante está limpo, se lavo as mãos, não vejo necessidade de teste ou certificado", pondera.

A médica reitera a importância de acelerar a vacinação e, somente depois, exigir testes para espetáculos, boates e festas com muita gente. De acordo com ela, não faz sentido vacinar e manter as mesmas regras do início da pandemia.

"Com vacinados, é necessário algum retorno à normalidade, sob pena de desmoralização da vacinação. E isso seria mau. Exceto, como disse, para os vulneráveis vacinados que é prudente usar máscaras em lugares públicos", ratifica.
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