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'Seria menos mau se todas questões do pacto Mercosul-UE tivessem a ver com Bolsonaro', diz chanceler

© REUTERS / Francisco SecoAugusto Santos Silva, ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal, em 20 de maio de 2021
Augusto Santos Silva, ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal, em 20 de maio de 2021 - Sputnik Brasil, 1920, 25.05.2021
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O ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal, Augusto Santos Silva, disse à Sputnik Brasil, nesta terça-feira (25), que ainda tem o objetivo de avançar no processo de ratificação do acordo comercial entre União Europeia e Mercosul até o fim de junho. Ele negocia um instrumento adicional ao tratado.

No último dia 7 de maio, o ministro da Economia de Portugal, Pedro Siza Vieira, havia afirmado à Sputnik Brasil que não acreditava que seria possível avançar com o acordo comercial durante a presidência portuguesa no Conselho da UE, que termina em 30 de junho. 

Confrontado com a declaração durante entrevista a correspondentes estrangeiros em Lisboa e questionado se acredita ser possível ratificar o acordo enquanto Jair Bolsonaro for presidente e mantiver sua atual política ambiental, criticada pela França e outros países da UE, o chanceler português foi irônico.

"Se me permite uma pequena ironia, seria menos mau que todas as questões relativas à ratificação do acordo [com o] Mercosul tivessem a ver com a política ambiental do presidente Jair Bolsonaro, porque seria mais fácil resolvê-las", afirmou Santos Silva em resposta à Sputnik Brasil. 
© Folhapress / Pedro LadeiraEm Brasília, o presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, e o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles conversam durante evento, em 1º de agosto de 2019
'Seria menos mau se todas questões do pacto Mercosul-UE tivessem a ver com Bolsonaro', diz chanceler - Sputnik Brasil, 1920, 25.05.2021
Em Brasília, o presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, e o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles conversam durante evento, em 1º de agosto de 2019

No entanto, segundo ele, infelizmente, há outros obstáculos à ratificação do acordo, como, por exemplo, a rejeição pelo Parlamento austríaco. No início de março, Werner Kogler, vice-chanceler da Áustria, enviou uma carta ao primeiro-ministro português, António Costa, pedindo que a presidência portuguesa do Conselho da UE evitasse "qualquer manobra" para facilitar a votação do texto do tratado. A justificativa era de que não havia cláusulas suficientes para prevenir o desmatamento no Brasil.

"Portanto, seria necessária uma nova decisão do Parlamento austríaco. De qualquer modo, nosso objetivo durante a nossa presidência não foi concluir esse processo, foi avançar nesse processo. Tenho ainda o objetivo de avançar concreta e publicamente nesse processo até o fim do mês de junho", ratificou o chanceler.

Para isso, a presidência portuguesa do Conselho da UE trabalha junto com a Comissão Europeia na elaboração de um instrumento adicional ao acordo com o Mercosul que permita tornar claro que há compromissos climáticos e pela luta pela biodiversidade que não haviam sido estabelecidos pelo texto original. 

Brasil estaria disposto a assinar documento de combate a desmatamento

De acordo com Santos Silva, ainda não foi determinada a natureza jurídica desse documento, mas o Brasil estaria disposto a colaborar nesse sentido. Essa foi a solução para atender às preocupações ambientais com o desmatamento da Amazônia, externadas por parte do Parlamento Europeu e de alguns Estados-membros, como França, Alemanha e Holanda. Em fevereiro 65 eurodeputados enviaram uma missiva ao chanceler e ao primeiro-ministro de Portugal, pedindo a suspensão do acordo. 

"Temos recebido indicações precisas da Comissão Europeia também da disponibilidade do Brasil para trabalhar conosco num instrumento adicional ao acordo com o Mercosul, o que torna claro o engajamento brasileiro na ação climática e no combate à desflorestação", acrescentou. 

O chanceler ponderou ainda que há preocupações expressas em setores da economia portuguesa ligados à agricultura por causa das ofertas feitas para a importação de carnes e aves do Mercosul, o que também aconteceria nos Países Baixos, na Bélgica e na Irlanda. Contudo, ele ressaltou que a combinação entre vantagens e perdas foi suficientemente favorável para que os países aceitassem o acordo comercial em junho de 2019, após 30 anos de negociação.

No fim de abril, o novo ministro das Relações Exteriores do Brasil, Carlos Alberto Franco França, disse que, com otimismo, o acordo possa entrar em vigor até o fim de 2022. Durante participação em reunião extraordinária da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da Câmara dos Deputados, França também afirmou que há boa vontade de Portugal em ajudar o Brasil na negociação do tratado. 

© Folhapress / Agência EnquadrarMinistro das Relações Exteriores, Carlos França, durante visita a centro de distribuição em Guarulhos (SP), 29 de abril de 2021
'Seria menos mau se todas questões do pacto Mercosul-UE tivessem a ver com Bolsonaro', diz chanceler - Sputnik Brasil, 1920, 25.05.2021
Ministro das Relações Exteriores, Carlos França, durante visita a centro de distribuição em Guarulhos (SP), 29 de abril de 2021

Santos Silva revelou que foi ele o primeiro a fazer um telefonema internacional para cumprimentar França quando foi nomeado novo chanceler brasileiro e que estava prevista uma visita dele a Portugal no fim de abril, mas teve de ser adiada. Ao ser indagado pela Sputnik Brasil quais eram suas primeiras impressões sobre a visível mudança da linha diplomática com a saída de Ernesto Araújo do ministério, o português trocou a ironia pela política da boa vizinhança.

"Já tive o prazer de conversar mais do que uma vez com o novo chanceler brasileiro e de participar de reuniões internacionais, infelizmente ainda só por videoconferências. Não faço distinções de quem é o ministro em funções nos países parceiros de Portugal. Nossa máxima é muito simples no que diz respeito ao Brasil: quem quer que seja o presidente, o governo, o ministro, é nosso amigo e nosso irmão", ponderou.

O ministro português não confirmou a informação declarada pelo seu homólogo francês, Jean-Yves Le Drian, de que o Brasil estará na lista vermelha de países cujos turistas estarão proibidos de entrar na União Europeia mesmo após a vacinação completa, com o lançamento do Certificado Digital COVID-19 da UE. 

"As decisões sobre os países a serem considerados na revisão da nossa lista em relação a viagens de países terceiros para a UE ainda não estão tomadas. Portanto, não posso antecipá-las", despistou.

A revisão da recomendação feita pela presidência portuguesa do Conselho da UE inclui ainda a ampliação do limiar da incidência de COVID-19 a partir do qual são aceitos turistas. Portugal havia sugerido que o limite fosse ampliado de 25 para 100 casos por 100 mil habitantes nos últimos 14 dias. No entanto, deve ser adotado o valor de 75 casos por 100 mil habitantes nas duas últimas semanas.

Recomendação sobre risco de variantes pode afetar turistas brasileiros

Santos Silva esclareceu que a condição do limiar da incidência não é cumulativa com a vacinação completa. Ou seja, mesmo turistas de países que tenham uma incidência superior ao limiar determinado pela UE poderiam viajar para o bloco caso tenham a imunização completa com alguma das vacinas reconhecidas pela Agência Europeia de Medicamentos (EMA) ou pela Organização Mundial da Saúde (OMS). 

"Há, contudo, um ponto que a recomendação tem e que é muito importante que é, para além de considerar o limiar, considerar também o risco acrescido que pode significar a presença de variantes do SARS-CoV-2. Essa ponderação tem que ser feita. É uma recomendação aos Estados-membros, não uma diretiva de cumprimento obrigatório", ressaltou.

A ressalva do chanceler é importante, pois pode apontar para a manutenção do Brasil na lista de países que só podem fazer viagens essenciais a Portugal: por motivos de trabalho, saúde, estudo ou reunião familiar. Isso porque a frequência da variante de Manaus aumentou dez vezes em um mês no território lusitano.

Apesar de a estirpe brasileira P.1 ter sido detectada em 4,3% dos casos, enquanto a variante britânica estava presente em 91,2% da amostragem analisada pelo Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA), a percepção do governo português é de que a cepa do Reino Unido já é predominante na maior parte da Europa. 

As declarações de Santos Silva aconteceram no Centro Cultural de Belém (CCB), sede da presidência portuguesa do Conselho da UE. Nestas quarta e quinta-feira (26 e 27), o local será palco de uma reunião informal entre 26 dos 27 ministros das Relações Exteriores dos Estados-membros da UE (Gymnich). 

© Sputnik / Lauro NetoO chanceler português Augusto Santos Silva após entrevista a correspondentes estrangeiros no Centro Cultural de Belém, em Lisboa
'Seria menos mau se todas questões do pacto Mercosul-UE tivessem a ver com Bolsonaro', diz chanceler - Sputnik Brasil, 1920, 25.05.2021
O chanceler português Augusto Santos Silva após entrevista a correspondentes estrangeiros no Centro Cultural de Belém, em Lisboa

Segundo o chanceler, além do jantar informal desta quarta (26), na quinta (27), serão debatidos quatro temas principais: as relações entre UE e a África; a vizinhança Leste e os conflitos não resolvidos de Armênia, Azerbaijão, Geórgia, Moldávia e Ucrânia; almoço com ministro das Relações Exteriores da Jordânia e a situação no Oriente Médio; e uma seção de trabalho sobre o Indo-Pacífico.

Um assunto à parte será adicionado à pauta: a questão da Belarus, após o país ter mandado desviar um voo comercial da Ryanair entre Atenas (Grécia) e Vilnius (Lituânia) no último sábado (29). O governo de Minsk nega que o avião tenha sido desviado à força. Santos Silva voltou a afirmar que se trata de pirataria e que a prisão do jornalista Roman Protasevich é inadmissível.

"Não podemos aceitar que um país faça uma interceptação militar de um voo comercial entre duas capitais europeias. O fato de ser patrocinado pelo Estado não transforma em outra coisa que não seja pirataria. As explicações são tão implausíveis que não merecem nenhuma espécie de credibilidade. Foi também a detenção totalmente ilegal de uma pessoa a exercer sua profissão de jornalista e seu direito à liberdade de expressão e de imprensa", concluiu.

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