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'Censo é fundamental', diz deputado que apresentou lei para tornar sua execução obrigatória

© REUTERS / Adriano MachadoMulher caminha perto de barraco onde vive nas proximidades do Palácio do Planalto, em Brasília
Mulher caminha perto de barraco onde vive nas proximidades do Palácio do Planalto, em Brasília - Sputnik Brasil, 1920, 30.03.2021
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Após corte no Orçamento que inviabilizou realização do censo, deputado Felipe Carreras (PSB-PE) apresentou projeto de lei para tornar crime de responsabilidade quebra de periodicidade da pesquisa.

À Sputnik Brasil, o parlamentar explicou que, inicialmente, sua equipe elaborou uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), que depois foi alterada para um projeto de lei, por ser o dispositivo legal mais adequado para a questão. 

"O projeto visa não apenas garantir o orçamento do censo feito a cada dez anos pelo IBGE, como também a sua execução", disse o deputado, que atuou como sub-relator de economia da Comissão Mista de Orçamento (CMO). 

Inicialmente, a previsão do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística era de R$ 3,4 bilhões para executar o censo demográfico. A presidente do órgão, Susana Cordeiro Guerra, escolhida para o cargo pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, enxugou os custos para R$ 2 bilhões - determinação do governo em tempos de ajuste fiscal

O relator da Comissão Mista de Orçamento, senador Marcio Bittar (MDB-AC), entregou texto final com quantia ainda menor, de R$ 1,7 bilhão. Ao final, o valor aprovado foi irrisório diante do que o censo exige, apenas R$ 71 milhões, o que inviabiliza sua realização neste ano. 

O censo deveria ter sido executado ainda em 2020, mas teve que ser adiado em função da pandemia do coronavírus. A expectativa da direção era de que ele pudesse ser feito neste ano. Após a aprovação do Orçamento, Susana Guerra pediu demissão da presidência do IBGE, alegando motivos pessoais. A economista fica no posto até o governo indicar um sucessor. 

"O censo é uma ferramenta essencial para a qualidade dos investimentos em nosso país. Sobretudo em um país com tanta desigualdade social como o nosso. Nenhum país sério pode ser gerido de forma adequada sem ter uma investigação estatística do seu povo", disse Felipe Carreras. 

Falta de diálogo

A realização do censo neste ano não era consenso dentro do IBGE e da comunidade científica. O Sindicato Nacional dos Trabalhadores da entidade, por exemplo, defendia a não execução da pesquisa devido ao agravamento da pandemia da COVID-19. Durante o censo, 200 mil entrevistadores visitam milhões de lares brasileiros para colher informações, o que poderia ajudar a disseminar o coronavírus. 

Luanda Botelho, dirigente da categoria, disse à Sputnik Brasil que o sindicato "não festeja" o corte do orçamento, pelo contrário, lamenta a forma como isso foi feito e teme pela execução do censo no ano que vem.  

"Essa é nossa principal preocupação, porque o corte não veio acompanhado de um compromisso com o próprio IBGE de realização do censo em 2022. Isso não foi negociado. Tanto que a presidente entregou o cargo logo em seguida", afirmou a Coordenadora do Sindicato Nacional dos Trabalhadores do IBGE/Núcleo da Avenida Chile. "Ainda que a gente defendesse que em 2021 não havia condições de fazer o censo com qualidade, em nenhum momento a gente pregou um boicote ou que o corte acontecesse da forma que aconteceu, sem envolver diálogo com os principais atores, no caso o IBGE", acrescentou. 

A dirigente sindical ressalta ainda que, mesmo com novo adiamento, as etapas iniciais para execução do censo podem ficar inviabilizadas devido ao corte no orçamento. 

"O valor que ficou destinado ao IBGE nesse ano é insuficiente para garantir a preparação para o ano que vem. Existe uma sequência de atividades preparatórias que precisam de verbas para ter continuidade", explicou. 

'Questionário

O ex-presidente do IBGE Eduardo Pereira Nunes disse à Sputnik Brasil que os cortes do censo foram realizados de "forma homeopática" e começaram no "dia da posse" de Susana Guerra, em 2019, quando Paulo Guedes, que estava presente, pediu o enxugamento da verba da pesquisa. 

Uma das medidas adotadas pela direção do IBGE para corte de gastos foi a diminuição do número de perguntas no questionário feito pelos recenseadores na casa dos brasileiros. 

O questionário básico, adotado em todos os 71 milhões de domicílios do país, diminuiu de 34 para 25 perguntas. O formulário aprofundado, aplicado a uma amostra (grupo selecionado de entrevistados), foi reduzido de 102 para 76 perguntas.

Para Nunes, a diminuição do questionário significou a "entrega dos anéis para salvar os dedos'.

"A minha experiência com o Censo Demográfico de 2010 me permite afirmar que seu custo elevado é resultado do caráter presencial das entrevistas em cerca de 80 milhões de domicílios, em um país com 8,5 milhões de quilômetros quadrados e 5.570 municípios. O ministro precisa saber que o censo dos Estados Unidos, em 2010, custou mais de US$ 12 bilhões [aproximadamente R$ 62 bilhões] e foi realizado com questionário, em papel", afirmou. 

O ex-presidente aponta ainda a importância da pesquisa para sabermos "onde e como vivem os brasileiros", assim como se têm acesso a habitação, saneamento básico, iluminação, abastecimento de água, computadores, Internet, etc.

Importância do censo

Wasmália Bivar, também ex-presidente do IBGE, afirmou à Sputnik Brasil que os prejuízos causados pela não realização do censo, ou por execução precária da pesquisa, "são monumentais". 

Ela cita, por exemplo, sua importância para a formulação de políticas sanitárias e até mesmo para a vacinação contra a COVID-19. 

"A gente precisa dos dados do censo. Uma indicação de quanto a gente precisa disso é quando os municípios erram a estimativa de sua população mais idosa. São Paulo teve problemas em vacinar certo número de pessoas de determinada idade porque apareceram muito mais. No Rio de Janeiro, na faixa de 75 anos, houve o inverso, apareceram muito menos", afirmou a economista. "Atualizar as estruturas etárias da população serve de base de tudo, para qualquer ação pública e qualquer planejamento", acrescentou. 

Preocupação para ano que vem

A ex-presidente do IBGE também tem receio sobre a realização do censo em 2022. Ela avalia que realizar a pesquisa é "uma tarefa gigantesca" e "que as pessoas, de suas cadeiras, não tem noção do tamanho do Brasil". Ela frisa ainda que "não se pode fazer nada sem que esteja devidamente testado".

"Minha preocupação com o censo para o próximo ano continua. Sua factibilidade, se vai ter orçamento. Sem contar a questão sanitária, que impôs novos custos, o que aconteceu em todas as atividades do mundo. Os custos se elevaram para poder ter protocolos de segurança. Só para o censo brasileiro é que supostamente não", avaliou Wasmália Bivar.
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