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Especialistas concordam que governo deveria rever prioridades no setor de energia elétrica no Brasil

© AFP 2023 / Norberto Duarte / Acessar o banco de imagensUsina Hidrelétrica de Itaipu
Usina Hidrelétrica de Itaipu - Sputnik Brasil
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É preciso garantir qualidade de fornecimento e acreditar que fonte hidrelétrica ainda é importante. Leilão do setor nesta quinta-feira (17) vai trazer R$ 7,3 bilhões em investimentos.

Melhorar a entrega do serviço, rever o modelo de operação, garantir mais segurança no fornecimento, baixar o preço pago pelo consumidor e reforçar a importância das hidrelétricas como fonte energética no país. Estas são - ou deveriam ser - as prioridades do governo no setor de energia no Brasil, segundo especialistas ouvidos pela Sputnik Brasil.

A questão ganha mais importância em um momento de leilão de transmissão de energia, como o da quinta-feira (17) em São Paulo. 

No leilão organizado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), foram oferecidos 11 lotes de empreendimentos em nove estados. E todos foram arrematados garantindo a estimativa da Aneel de investimento de R$ 7,34 bilhões em cinco anos, informou o site G1.

Entre as empresas interessadas no evento, havia nomes nacionais e internacionais. Para o diretor-geral da agência, André Pepitone, o leilão foi "extremamente exitoso".

"Ele mostrou que setor de energia elétrica é um porto seguro para investimentos. Os resultados aqui vão gerar quase 15 mil empregos e mostram o apetite e a confiança de empresas internacionais no Brasil. Fizemos história", defendeu Pepitone em entrevista coletiva.

Até esta quinta-feira (17), apenas o lote nove tinha sido leiloado e contou com 17 grupos na disputa. O vencedor foi o Consórcio Saint Nicholas I para instalações no Mato Grosso do Sul.

Pelas regras do leilão, vence quem oferece o maior deságio em relação ao valor máximo de remuneração fixado pelo governo. Quanto maior o desconto da proposta, maior a economia dos consumidores, uma vez que a remuneração dos consórcios entrará no cálculo das contas de luz.

Os 11 lotes do leilão preveem a instalação cerca de 1.958 quilômetros de rede em nove estados: Amazonas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e São Paulo.

© Folhapress / Zanone Fraissat/FolhapressInvestidores lotam o saguão da Bolsa de Valores de São Paulo para participar do leilão de 20 lotes de linhas de transmissão em 2018
Especialistas concordam que governo deveria rever prioridades no setor de energia elétrica no Brasil - Sputnik Brasil
Investidores lotam o saguão da Bolsa de Valores de São Paulo para participar do leilão de 20 lotes de linhas de transmissão em 2018

Pelas regras do edital, o prazo para operação comercial dos empreendimentos varia de 42 a 60 meses para concessões por 30 anos contados a partir da celebração dos contratos.

O leilão integra o Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) do governo federal que projeta um potencial de geração de 14.881 empregos durante a construção dos empreendimentos.

Muito o que fazer

Em um país com 160 mil quilômetros de linhas de transmissão de energia e com recente caso de falha de distribuição de energia no estado do Amapá, dois especialistas entendem que há muito o que fazer para que o setor cresça. Um deles, a garantia do serviço.

"Nosso sistema é bom, ele tem condição de operar adequadamente, mas para isso é preciso corrigir o modelo de operação de modo que evite um serviço de qualidade duvidosa e com segurança relativamente precária", defendeu José Antônio Feijó de Melo, ex-chefe de gabinete da Presidência da Companhia Hidrelétrica do São Francisco, a CHESF.

Para o engenheiro, é preciso retornar a "filosofia de serviço público essencial".

"O atual modelo prioriza o interesse de grandes empresas públicas e privadas e oferece vantagem a grupos dominantes em detrimento do consumidor. E continuamos, em 2020, operando um sistema com ameaça de risco de abastecimento. Só não tivemos mais problemas - como o do Amapá - por causa da pandemia, já que o consumo caiu um pouco com ela", explicou.

O estado da Região Norte ficou sem luz por 22 dias em novembro por causa de um incêndio em um dos transformadores de uma subestação e provocou protestos na capital Macapá e em outras cidades. Tudo isso em uma região com temperatura média de 27 ºC e com pico de 36 ºC.

A crise na Região Norte é tema central para os especialistas.

"O problema no Amapá me faz lembrar o jargão do setor que diz que 'quem tem um, não tem nenhum'. Ou seja, é muito importante que em um local extremo do país sem interligação de linhas que possam vir em socorro se houver queda no sistema haja maior garantia de qualidade no sistema oferecido. Especialmente por empresas privadas. Quem acabou socorrendo o estado foi a Eletronorte. É preciso mais qualidade, mais monitoramento, mais confiabilidade", disse Ikaro Chaves, diretor da Associação dos Engenheiros e Técnicos do Sistema Eletrobras (AESEL).

Chaves se refere também a cortes de orçamento feitos por empresas privadas, especialmente em um cenário econômico como o do país atualmente. 

"O Amapá foi emblemático disso. O mercado tem apetite, sabe que tem renda segura e faz promessas. Mas ao fim, como se notou no Amapá, há uma vulnerabilidade", comentou.

Outra questão levantada pelo também engenheiro é a manutenção do serviço.

"A Aneel tem cerca de 300 funcionários, então ela não tem condição de verificar, de fiscalizar estes 160 mil quilômetros de linhas. E isso é vital para garantir qualidade e confiabilidade do sistema", argumentou.

Gargalos

Para o ex-funcionário da CHESF, a situação no Amapá continua "precária". Segundo Feijó de Melo, não é possível uma realidade aceitável com apenas dois transformadores. Este tipo de situação pode criar gargalos no fornecimento.

"Nosso sistema equivale a praticamente toda a Europa, equivale a isso tudo. É preciso ter uma reserva lá", defendeu.

Chavez concorda com esta realidade de gargalo. E vê as energias eólica e solar como opções para minimizar o problema.

"O nosso aproveitamento da energia solar é ridiculamente baixo, 2% do total, e da eólica, de 10%, portanto há espaço grande para ambas. Isso ajudaria a evitar um gargalo que por várias razões acontece no Brasil", argumentou.

Mais hidrelétricas

Os dois entrevistados pela Sputnik Brasil defendem o mesmo ponto de vista: é preciso voltar a investir em hidrelétricas. Mas por razões diferentes.

"Precisamos delas porque, por melhor que sejam as opções de energias solar e eólica, não há controle sobre elas. Não se pode garantir que haja vento ou sol apesar dos grandes investimentos feitos", disse Feijó de Melo. "É preciso rever a atual filosofia de que energia é mercadoria igual a qualquer outra porque não é".

Para Ikaro Chaves, defender hidrelétricas é entender que o bem é maior do que possíveis danos.

"A fonte hidrelétrica é muito importante para o Brasil. Ela é a 'bateria' do nosso sistema elétrico. E há enorme potencial no país. Mas as usinas devem ser construídas mitigando ao máximo os impactos socioambientais, claro", defendeu Chaves. "Além disso, apesar dos impactos, ela ainda é muito mais limpa que a opção termoelétrica e menos cara que essa. O Brasil parou com as hidrelétricas".

A longo prazo, para eles é fundamental garantir uma matriz energética segura, "evitar a possibilidade de crise", como salientou Feijó de Melo, e pensar na população.

"O alcance tem que ser universal, ou seja, garantir que o custo da energia não siga alto. Só no século XXI, mais de 15 milhões de famílias passaram a receber energia. Mas como pagar por ela?", indaga Chaves. "É fundamental que a energia seja barata para as pessoas".
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