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Abertura da fronteira argentina tem o Brasil como foco principal, afirmam analistas

© REUTERS / Enrique MarcarianAulas de tango nas ruas de Buenos Aires, Argentina
Aulas de tango nas ruas de Buenos Aires, Argentina - Sputnik Brasil
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Após o governo argentino anunciar a reabertura de suas fronteiras para visitantes dos países vizinhos, a Sputnik Brasil conversou com dois especialistas em América Latina para entender melhor os detalhes deste processo.

O Ministério do Turismo e Esportes da Argentina anunciou nesta terça-feira (27) que, depois de manter as fronteiras fechadas desde 16 de março, permitirá que os turistas de Brasil, Bolívia, Chile, Paraguai e Uruguai entrem em seu território a partir da próxima sexta-feira (30). 

A medida, no entanto, terá limitações, já que os turistas deverão permanecer na cidade de Buenos Aires e não poderão acessar outras partes do território argentino. Além disso, por causa da pandemia do novo coronavírus, os visitantes deverão apresentar um teste PCR com resultado negativo, além de uma declaração legal preenchida eletronicamente e um seguro de saúde com cobertura de casos de COVID-19. 

Para preparar os últimos detalhes para a abertura de fronteiras aos países vizinhos, os ministros Matías Lammens e Mario Meoni se reuniram com seus pares do Governo da Cidade Autônoma de Buenos Aires e autoridades da Direção Nacional de Migrações e Aeroportos Argentina 2000. 

Para o especialista em Relações Internacionais Paulo Velasco, professor adjunto de Política Internacional e Chefe do Departamento de Relações Internacionais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), essa era uma decisão que tinha que ser tomada, pois a Argentina já estava fechada há muito tempo, na maior quarentena de todo o mundo, e a reabertura para os países vizinhos certamente terá um impacto positivo na economia do país.

"Temos que lembrar que os brasileiros são os principais turistas que a Argentina recebe anualmente, e o Brasil é o principal destino dos turistas argentinos, então o peso econômico da relação entre ambos é muito importante. Com a abertura, existe a perspectiva de que a Argentina possa obter mais divisas em um momento de crise econômica brutal", afirma Velasco.

O professor da UERJ avalia que também existe o efeito simbólico de se tentar retomar algum grau de normalidade nas relações entre os países vizinhos, considerando que o Cone Sul é uma região com processos de integração regional e econômicos muito significativos.

"Os países ficaram um longo tempo parados, isolados uns em relação aos outros, com as fronteiras fechadas, o que era mais do que justificável, em função da crise sanitária e da gravidade da pandemia. A Argentina talvez seja a última fronteira que vem sendo flexibilizada, apontando para uma tentativa de retomada", comenta.

Por sua vez, Rafael Rezende, pesquisador do Núcleo de Teoria Social e América Latina (NETSAL) do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IESP-UERJ), acredita que a reabertura da Argentina, bem como todas as outras medidas de relaxamento do isolamento social, tem relação com o contexto de dupla pressão que sofre o governo de Alberto Fernández.

"Por um lado, Fernández se vê pressionado pela crise econômica herdada do governo anterior. Crise essa cuja resolução foi sua principal promessa de campanha. Por outro, existe uma pressão política que vem dos partidos de oposição que acusam o presidente de impor um isolamento exagerado que deteriora ainda mais a economia argentina", avalia Rezende.

Ambos os especialistas acreditam que a tendência agora é a expansão dessa abertura para atrair turistas e movimentar a economia, devido à proximidade do verão, que é o período em que o país mais capta turistas do exterior.

© Sputnik / Ana Delicado PalaciosRuas vazias em Buenos Aires, Argentina, durante pandemia de coronavírus
Abertura da fronteira argentina tem o Brasil como foco principal, afirmam analistas - Sputnik Brasil
Ruas vazias em Buenos Aires, Argentina, durante pandemia de coronavírus

A importância do turismo na economia argentina

Em 2019, a Argentina recebeu cerca de 7,3 milhões de visitantes. Destes, 2,93 milhões tiveram como destino a cidade de Buenos Aires, e mais de 25% deles eram provenientes do Brasil, segundo o UOL. No total, os turistas deixaram cerca de US$ 2,5 bilhões (mais de R$ 14, 3 bilhões na cotação atual) na economia local. O Departamento de Turismo da Intendência de Buenos Aires informou que, até setembro deste ano, houve uma queda de 73,3% de turistas e um prejuízo de US$ 1,1 bilhão para a cidade no setor (mais de R$ 6,3 bilhões).

Velasco ressalta que a abertura neste momento reflete a expectativa do governo argentino de se preparar para o verão e receber em número razoável os brasileiros, que são os principais turistas estrangeiros que visitam o país.

Para o especialista, está claro que esse número será muito inferior ao de anos recentes, mas "a intenção do governo argentino é minimizar essa queda e se preparar para acolher os turistas com um foco muito claro no Brasil, pois o ministro de Turismo e Esportes já deixou claro que a prioridade é o Brasil e os brasileiros". 

Rezende tem uma visão parecida e ressalta que o setor de turismo é responsável por uma parcela nada desprezível da economia de Buenos Aires, movimentando os setores hoteleiro, gastronômico e cultural.

O pesquisador do NETSAL assinala que, tendo em vista a desvalorização do real em relação ao dólar, a tendência é que cresça o interesse dos turistas brasileiros em destinos nacionais e regionais e que, dada a delicada situação econômica da Argentina, o governo certamente está atento a isso, pois "não pode se dar ao luxo de abrir mão desses turistas sedentos por gastar seus dólares e reais nos tantos comércios, restaurantes e hotéis da cidade".
© AP Photo / Gustavo GarelloCovas abertas para as vítimas da COVID-19 no cemitério de Chacarita, em Buenos Aires, na Argentina.
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Covas abertas para as vítimas da COVID-19 no cemitério de Chacarita, em Buenos Aires, na Argentina.

Preocupação com o fortalecimento da COVID-19

O governo da Argentina assinalou que, no primeiro momento da reabertura, a entrada será limitada ao Aeroporto de Ezeiza, na Grande Buenos Aires, e ao terminal de barcos do Rio da Prata.

Os turistas deverão preencher uma declaração legal eletrônica com informações sanitárias dentro das 48 horas antes da viagem, e as companhias aéreas e de transporte fluvial exigirão a apresentação de todos os requisitos, entre eles o exame PCR negativo, antes do embarque, sob pena de multa em caso de descumprimento. Além disso, os visitantes serão submetidos a controles sanitários assim que desembarcarem nos terminais de passageiros. 

A pandemia, que parecia controlada em um primeiro momento, explodiu nos últimos meses e o país já registra o segundo maior número de casos na América do Sul, com mais de 1,1 milhão, sendo superada apenas pelo Brasil na região, de acordo com o mapa elaborado pela universidade norte-americana Johns Hopkins.

Os dois especialistas consideram a situação da COVID-19 na Argentina bastante delicada. Segundo Rafael Rezende, "o relaxamento das medidas de isolamento social produziu um boom de contágios especialmente na província e na cidade de Buenos Aires". O pesquisador do NETSAL, no entanto, não acredita que turismo dos brasileiros seja uma ameaça para o país, uma vez que o vírus já circula por Buenos Aires com bastante voracidade.

Paulo Velasco, por sua vez, assinala que a circulação de turistas pode "abrir uma porta para o aumento do número de casos", mas acrescenta que o governo argentino está tomando uma série de cuidados e adotando diversos protocolos para evitar a expansão da doença.

Em suma, ambos os analistas concordam que a abertura das fronteiras para o Brasil é uma necessidade, dada a situação de agonia da economia do país, que já vinha combalida antes da pandemia e cuja resolução foi a principal promessa de campanha do presidente Alberto Fernández, que teve que encarar uma situação de emergência sanitária com pouco mais de três meses de governo. 

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