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'Estamos em outro estágio de censura', diz médico que lutou contra epidemia de meningite no Brasil

© AP Photo / Andre PennerPacientes em hospital de campanha montado em ginásio da cidade de Santo André, na grande São Paulo, 9 de julho de 2020
Pacientes em hospital de campanha montado em ginásio da cidade de Santo André, na grande São Paulo, 9 de julho de 2020 - Sputnik Brasil
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Hospitais lotados de pacientes com doença infecciosa. Preocupados com o efeito eleitoral da situação, políticos lutam para controlar a narrativa. A descrição é do Brasil durante a pandemia de COVID-19, mas serve para outro episódio da história nacional.

Na década de 1970, uma epidemia de meningite assolava o país. A infecção pode ser combatida por medidas de higiene reforçadas, mas a população brasileira não tinha acesso às informações necessárias porque a ditadura civil-militar bloqueava o fluxo de notícias.

Reportagem do UOL recuperou documentos confidenciais do regime e encontrou que, em 30 de julho 1974, o então diretor da Polícia Federal, Moacyr Coelho, estabeleceu em radiograma a proibição da divulgação de "dados numéricos e gráficos sobre meningite". Em outro despacho, Coelho veta "dados e notícias tendenciosas que alarmem a população".

O médico sanitarista e professor da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP) Gonzalo Vecina Neto começou sua carreira médica durante o surto de meningite. Trabalhando como residente no Hospital Emílio Ribas, que atende pacientes da atual pandemia de coronavírus, Neto diz que a população foi prejudicada pela falta de informações.

"Nesse início da crise, de fato o governo [de Ernesto] Geisel escondeu dados da população com essa desculpa esdrúxula de que iria alarmar a população. A população necessitava saber o que estava acontecendo para tomar as providências adequadas e se defender daquela epidemia", diz o professor da USP à Sputnik Brasil. "A população enfrentou isso de peito aberto, sem ter acesso a essas informações. Uma atitude muito criminosa da ditadura de 64 e do então ditador Ernesto Geisel"

Durante a pandemia de COVID-19, o Ministério da Saúde mudou a metodologia de divulgação dos casos. Já sob a gestão do general tornado ministro Eduardo Pazuello, o número total de mortos pela pandemia não foi mais atualizado. As autoridades passaram a divulgar apenas o número de mortos e casos confirmados das últimas 24 horas. O Ministério da Saúde voltou atrás após determinação do Supremo Tribunal Federal (STF). 

"Hoje em dia não existem prisões [de opositores], embora exista esse clima de ódio e, com muita frequência, pessoas que trazem notícias que não interessam ao governo acabam sendo vítimas, também, do gabinete do ódio. Acho que nós estamos em outro estágio de censura e de proibições. Mas uma coisa é certa, nós estamos no terreno de negar notícias a sociedade, notícias que poderiam ajudar a sociedade a melhor se proteger dessa epidemia". afirma Neto.

O historiador e professor da Universidade de Brasília (UnB) Hugo Studart relembra em entrevista à Sputnik Brasil outra informação: apesar dos esforços de censura, a ditadura tomou uma "pancada eleitoral horrorosa" em 1974. 

O professor da UnB também traça paralelo da situação atual com a hiperinflação dos anos 1980 e 1990. "Nós vimos na época da hiperinflação do governo [João] Figueiredo, depois no governo [José] Sarney, depois no governo [Fernando] Collor, toda hora mudavam os critérios, tiravam um produto da cesta de cálculo para reduzir o tamanho da inflação."

Studart afirma que é uma característica comum das ditaduras esconder fatos, mas ressalta que fazer o mesmo em uma democracia "não é natural".

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