Órgão de controle de armas químicas manipulou informações sobre ataque na Síria, revela delator

© AP Photo / Peter DejongSede da Organização para a Proibição de Armas Químicas (OPAQ) , em Haia, nos Países Baixos
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Ex-inspetor da Organização para a Proibição de Armas Químicas (OPAQ) acusou o órgão de publicar relatório contrário às conclusões do grupo de investigadores sobre ataque com armas químicas em Douma, na Síria, em 2018.

As acusações foram feitas durante testemunho no Conselho de Segurança da ONU.

O relatório final da OPAQ sobre os supostos ataques com armas químicas em Douma, na Síria, foi publicado em março de 2019. Mas, de acordo com o ex-inspetor da organização Ian Henderson, o documento omitiu informações cruciais, que colocavam em dúvida a ocorrência de um ataque com armas proibidas.

"As conclusões do relatório final [publicado pela OPAQ] foram contraditórias e modificaram totalmente o entendimento a que o time [de inspetores] chegou depois da visita a Douma", disse Henderson.

As denúncias foram feitas pelo inspetor durante testemunho no Conselho de Segurança da ONU, transmitido por videoconferência, uma vez que seu visto para comparecer à reunião pessoalmente foi negado pelas autoridades norte-americanas, reportou a RT.

​As denúncias foram feitas pelo inspetor durante testemunho no Conselho de Segurança da ONU, transmitido por videoconferência, uma vez que seu visto para comparecer à reunião pessoalmente foi negado pelas autoridades norte-americanas.

Segundo Handersen, apesar de vários membros da equipe de inspeção que foi a Douma "ter levantado sérias dúvidas sobre a ocorrência de ataque químico", o relatório final da organização, elaborado por um outro grupo de especialistas que não compareceram ao local do incidente, concluiu que havia "base suficiente" para concluir que houve ataque e que Damasco deveria ser responsabilizada pelo incidente.

O relatório omitiu quaisquer indícios que provassem o contrário, ignorando "fatos, informações, dados e análises" coletadas pelo time de campo, que conduziu estudos toxicológicos, trabalho com as vítimas, análises químicas e estudos de balística, contou o inspetor, agora aposentado.

Washington e seus aliados culparam o governo sírio pelos incidentes em Douma, que foram seguidos de ataques aéreos por parte dos EUA, França e Reino Unido. Os bombardeios, realizados uma semana depois do alegado ataque químico, foram realizados antes mesmo que quaisquer estudos pudessem concluir a veracidade das acusações.

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Armas químicas

Na ocasião, políticos ocidentais e a mídia concluíram, com base em informações de testemunhas oculares do grupo Capacetes Brancos, que era "bastante provável" que o governo sírio tivesse realizado o ataque com dois cilindros de gás contra a população civil, deixando dezenas de mortos.

As 'provas do crime' contra Damasco seriam dois cilindros encontrados em uma área residencial da cidade. De acordo com Hendersen, o grupo de inspetores encontrou evidências de que os cilindros haviam sido deixados no local "manualmente", e não "lançados de uma aeronave".

"Eu conduzi seis meses de estudos de engenharia e balística sobre os cilindros, cujos resultados providenciaram mais evidências de que não houve ataque químico", disse Handersen.

Posteriormente, o site Wikileaks revelou que um alto funcionário da OPAQ ordenou que "todos os traços" do relatório de Hendersen fossem apagados dos arquivos da organização.

Apesar da gravidade do caso, durante seu testemunho, Hendersen pediu que o ocorrido não seja alvo de "debate político", mas seja "resolvido de maneira apropriada, através do rigor científico e da engenharia".

A reunião informal do Conselho de Segurança sobre o relatório final da OPAQ foi realizada nesta segunda-feira (20), a pedido de Moscou.

© REUTERS / Mike SegarSessão do Conselho de Segurança da ONU
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Sessão do Conselho de Segurança da ONU

Os EUA consideraram a reunião improdutiva, por "descreditar a respeitada Organização para a Proibição de Armas Químicas e seus funcionários". Moscou insiste que, pelo contrário, o objetivo das investigações é restaurar a confiança na OPAQ.

"Por que o incidente na cidade síria de Douma é tão importante? Porque foi usado como justificativa para um ataque com mísseis, realizado pelos EUA, França e Reino Unido, em abril de 2019, que imediatamente culparam o governo de Damasco", disse o representante da Rússia nas Nações Unidas, Vasily Nebenzia.

Além do testemunho de Henderson, o Conselho de Segurança ouviu o representante da Rússia na OPAQ, Alexandr Shugin, e o diretor de ONG que entrevistou mais de 300 residentes de Douma.

Caso Bustani na OPAQ

Essa não é a primeira vez que a OPAQ se vê em meio a um escândalo. O diplomata brasileiro José Maurício Bustani foi alvo de pressão dos Estados Unidos para modificar relatórios da organização sobre a alegada posse de armas químicas pelo Iraque.

Em março de 2002, os EUA solicitaram uma reunião para aprovar uma moção de desconfiança contra o brasileiro, que então exercia o segundo mandato como diretor-geral da organização. Bustani teve que deixar o posto de diretor da OPAQ.

© AP Photo / Serge LigtenbergDiplomata brasileiro, José Maurício Bustani, pouco antes de ser destituído ilegalmente do cargo de diretor-geral da OPAQ, em abril de 2002
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Diplomata brasileiro, José Maurício Bustani, pouco antes de ser destituído ilegalmente do cargo de diretor-geral da OPAQ, em abril de 2002

Um ano depois da demissão de Bustani, os EUA invadiram o Iraque, sob o pretexto de destruir armas de destruição em massa, que nunca foram encontradas.

Em 2003, a Organização Internacional do Trabalho (OIT), considerou a destituição de Bustani ilegal e, portanto, nula. Bustani recebeu compensação financeira pelo incidente e doou-a para o Programa de Cooperação Internacional para países em desenvolvimento, coordenado pela OPAQ.

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