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Bolsonaro x Instituições: por que relação entre poderes foi tão difícil em 2019?

© Foto / Luis Macedo/Câmara dos DeputadosPresidente da Câmara dos Deputados, dep. Rodrigo Maia, recebe o Presidente da República, Jair Bolsonaro (arquivo)
Presidente da Câmara dos Deputados, dep. Rodrigo Maia, recebe o Presidente da República, Jair Bolsonaro (arquivo) - Sputnik Brasil
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Críticas, acusações, trocas de farpas e tentativas de reconciliação. A relação entre os chefes dos três poderes foi cheia de altos e baixos em 2019, sobretudo entre o legislativo e o executivo.

A fracassada tentativa de pacto entre os chefes dos três poderes e a troca de farpas públicas entre os presidentes da República, do Senado Federal, da Câmara dos Deputados e do Supremo Tribunal Federal (STF) geraram, em 2019, grande instabilidade política no país.

Para José Niemeyer, doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo (USP) e Coordenador do curso de Relações Internacionais do Ibmec, é possível avaliar que a relação entre o executivo e o legislativo, ao longo deste ano, ocorreu a partir de uma divisão de agendas no campo das políticas públicas.

Em entrevista à Sputnik Brasil, o especialista opina que, nos assuntos voltados para a economia, o relacionamento entre o presidente Jair Bolsonaro e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), foi muito bom. Mas, no que diz respeito à agenda dos "costumes", a relação foi muito ruim. 

"Essa divisão de agendas dentro do governo Bolsonaro é algo muito determinante, na minha opinião, para o sucesso do governo Bolsonaro nas próximas eleições", diz o cientista político.  

​Niemeyer considera que a agenda para a área econômica, chefiada pelo ministro Paulo Guedes e de cunho liberal, "faz todo sentido" e, levando em conta as disputas entre as diferentes correntes da política brasileira, seria interessante que até os representantes da esquerda compreendessem melhor essa agenda, a fim de criar um consenso mínimo. Mas as chances de isso ocorrer, segundo ele, são reduzidas por conta das polêmicas em torno da chamada "agenda de costumes". 

"A oposição e os partidos mais de esquerda ficam criticando a agenda de costumes. Então, a agenda de costumes atrapalha o relacionamento entre Rodrigo Maia e o presidente da República", afirma.

De acordo com o acadêmico, enquanto as propostas econômicas trazem objetivos mais concretos, envolvendo diminuição de gastos públicos, reformas estruturais e geração de empregos, entre outras coisas, "a agenda de costumes é uma agenda muito aberta, fluida, que quer definir o interesse e o desejo de indivíduos". 

Ainda para o professor, o "clã Bolsonaro" não considera Rodrigo Maia um verdadeiro aliado político, e, nesse sentido, o chefe de Estado e, principalmente, seus filhos, "esticam essa corda com os temas de costume" para deixar claras as diferenças fora do campo econômico, já pensando nas próximas eleições. 

​"Um país complexo como o nosso, que quer cada vez mais se transformar numa sociedade mais moderna, mais progressista e mais rica, não pode ter uma pauta de costumes no centro irradiador do poder quando a gente pensa na relação entre executivo e legislativo."

Além de desentendimentos com o presidente da Câmara e, em menor grau, também com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), Jair Bolsonaro e seus aliados mais próximos se envolveram em polêmicas também com ministros do STF, principalmente o presidente Dias Toffoli.

Apesar de alguns princípios de tensão com o ministro e o tribunal, como no caso de um polêmico vídeo em que o presidente da República retrata os magistrados como hienas e das declarações antidemocráticas do deputado federal e filho do chefe de Estado Eduardo Bolsonaro, há quem considere Toffoli uma espécie de aliado do governo, mesmo com a imparcialidade exigida pelo seu cargo. 

​​Niemeyer, contrário a essa ideia, acredita que não existe um padrão no comportamento do presidente do Supremo que permita afirmar que ele tem um lado, até porque, ele destaca, isso não seria algo aceitável.

"É difícil de fazer essa identificação. Principalmente, é difícil perceber para onde vai Toffoli ou qual o interesse dele. Para mim, o interesse dele é julgar da melhor maneira possível temas muito complexos. Agora, às vezes, parece que ele está mais próximo, por exemplo, de interesses do Partido dos Trabalhadores. É isso que parece às vezes. Às vezes, parece que ele está mais próximo até de interesses do governo."

Segundo o especialista, essa partidarização que tomou conta do país nos últimos tempos parece afetar também o Supremo Tribunal Federal, pelo menos no imaginário da população. Para ele, felizmente, não é possível afirmar, no entanto, que o STF tem se posicionado conforme determinados interesses político-partidários. 

​Em meados deste ano, os representantes dos três poderes da República cogitaram firmar um pacto de entendimento para evitar crises e disputas que poderiam colocar em segundo planos os interesses da população, mas a ideia acabou sendo abandonada depois pelo presidente Bolsonaro.

Analisando a possibilidade de um acordo nesse sentido, o docente do Ibmec diz ver com bons olhos o fracasso dessa negociação, já que a assinatura desse tal pacto poderia passar para a sociedade uma "insegurança institucional da legalidade muito ruim".

"É melhor que a gente continue com um consenso mínimo a ser construído do que a gente construir um consenso mínimo barato, capenga."
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