Quem é ex-ministro israelense Lieberman e o que sua renúncia significa para o país?

© REUTERS / Sergei KarpukhinAvigdor Lieberman, ex-chanceler e ex-ministro da Defesa de Israel (foto de arquivo)
Avigdor Lieberman, ex-chanceler e ex-ministro da Defesa de Israel (foto de arquivo) - Sputnik Brasil
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Ontem (14), em meio a uma nova escalada de tensão entre israelenses e palestinos na Faixa de Gaza, o ministro da Defesa de Israel, Avigdor Lieberman, anunciou sua demissão em protesto contra a recente trégua firmada entre as duas partes. A Sputnik analisa as consequências da decisão.

Ao anunciar sua renúncia, o titular da pasta fez questão de sublinhar que o cessar-fogo mediado pelo lado egípcio foi "uma capitulação face ao terrorismo", tendo se seguido a uma escalada brusca de tensão com ataques aéreos israelenses e lançamentos de mísseis por parte do movimento militante Hamas que controla o enclave.

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De fato, Lieberman, ex-chanceler de Israel nos dois governos anteriores de Netanyahu e ministro da Defesa desde 2016, sempre foi uma figura controversa.

Sua postura radical na recente escalada não parece ser surpresa nenhuma para os defensores dos direitos palestinos, que costumam considerá-lo como um "grande impulsor da política mais fascista do Estado de Israel para com o povo palestino, tanto nos territórios ocupados da Cisjordânia quanto no cerco da Faixa de Gaza", explicou à Sputnik Mundo o presidente da Confederação Palestina Latino-Americana e membro do Conselho Nacional Palestino, Araya Masry.

O entrevistado alertou contra as consequências de cada nova intervenção israelense na Faixa de Gaza, relembrando que os confrontos de 2014, que decorreram do início de julho até os fins de agosto, levaram as vidas de ao menos 2 mil palestinos, grande parte deles civis e menores, contra 66 soldados e 6 civis israelenses. Na opinião de Masry, desse modo a nova trégua "salva milhares de vidas".

O interlocutor da Sputnik se mostra bem duro ao avaliar a figura do ex-ministro da Defesa, chamando-o de "colono ilegal" que vive em um assentamento construído em territórios palestinos ocupados, considerados ilegais pelo direito internacional.

"Desde o ponto de partida mais elementar da sua vida, sua casa, projeta esta imagem de um grande promotor da repressão, da violência, da limpeza étnica e de um genocídio", opina.

Retórica do ministro

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Lieberman realmente sempre foi uma pessoa que se encontra em meio de controvérsias que se estendem desde ter batido em uma criança em 2001 até à sugestão da "execução" dos membros árabes do parlamento israelense, Knesset, que mantinham o diálogo com o Hamas.

Para o político, conhecido por sua retórica contra os palestinos, inclusive cidadãos árabes de Israel, a caraterística de "controverso" até é "suave", acredita Nasry, indicando o caso de 2009, quando o ex-ministro sugeriu que o país devesse continuar a luta contra o Hamas da mesma forma que fizeram os EUA com os japoneses na Segunda Guerra Mundial, evidentemente se referindo aos ataques nucleares contra as cidades de Hiroshima e Nagasaki em 1945.

Araya Nasry apontou que os ataques verbais de quem também foi chanceler israelense não se limitaram aos problemas internos — assim, uma vez Lieberman também sugeriu bombardear a Represa Alta de Assuã, uma medida "que afogaria 80% da população egípcia".

O partido de Lieberman, Yisrael Beiteinu (Israel é Nosso Lar, em hebraico), tem um capital eleitoral entre os imigrantes seculares que começaram a chegar em Israel na década de 80. O próprio Liberman, nascido na República Socialista Soviética da Moldávia, chegou ao país em 1978. Desde 1988, ele tem morado no assentamento judeu de Nokdim, que fica na região da Cisjordânia.

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Para o interlocutor da Sputnik, o político faz parte da "tipologia de um dirigente e referente político" que surgiu no contexto da "marcha para trás" da sociedade israelense, "cada vez mais insensível à dor humana e alheia, mais grave ainda provindo de um povo que sofreu um horror durante a Segunda Guerra Mundial".

Outra exponente desta retórica é a ministra da Justiça, Ayelet Shaked, do partido religioso Bait Yehudi (O Lar Judaico, em hebraico), que inclusive chegou a sugerir que "se deveria matar" as mães que choraram pela morte de seus filhos palestinos considerados terroristas por Israel. Também o ministro da Educação, Naftali Bennett, tem expressado a mesma retórica.

Possíveis consequências

Em sua renúncia, Lieberman também expressou sua insatisfação com a bênção israelense a uma transferência de ajuda milionária do Qatar, destinada a pagar salários para os funcionários palestinos e assim aliviar a situação econômica e humanitária premente no território cercado. Além disso, a monarquia do golfo Pérsico também enviou para lá combustível, dada a escassez de energia que o território está atravessando.

"O que estamos fazendo agora como Estado é comprar uma calma de curto prazo, cujo preço é um dano a longo prazo para a segurança nacional", disse Lieberman.

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Muitos analistas acreditam que a renúncia de Lieberman enfraquece o governo de Benjamin Netanyahu, que talvez convoque as eleições antecipadas em caso de ingovernabilidade. Nesse sentido, pode ser que o ministro da Defesa que está saindo do seu posto se dedique a fazer campanha para "se tornar o próximo substituto de Benjamin Netanyahu", acredita Araya Masry.

Já na opinião de Abraham Diskin, cientista político israelense da Universidade Hebraica de Jerusalém, expressa à Sputnik Internacional, o sentimento de Lieberman pode ser apoiado por grande parte da sociedade.

"O que temos observado na imprensa e na Internet israelenses é uma crítica considerável contra Netanyahu por ser suave demais para com o Hamas […] E tenho certeza que se a gente partilha esse criticismo, que é mesmo partilhado por algumas pessoas próximas a Netanyahu, e no que respeita à posição popular de alguns votantes potenciais no centro ou na direita da arena israelense, acho que ele [premiê] tem cautela quanto a decisões como a tomada por Lieberman", explicou.

O analista também predisse que no país provavelmente haverá eleições antecipadas se seguindo a um governo de transição, que tem poderes reduzidos.

"Na prática, esse governo não teria os mesmos poderes políticos como os de costume, mas eu não acho que isto se aplique às questões de defesa. Acho que em qualquer questão de defesa as mãos do governo israelense, mesmo que seja um governo de transição, não ficarão atadas e acredito que, dado o ambiente, o ambiente político em Israel, o país estará livre para agir de acordo com a vontade de Netanyahu, mesmo que tenhamos eleições antecipadas", resumiu.

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