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O americano roubado pelo falso fotógrafo de guerra brasileiro fala à Sputnik (EXCLUSIVO)

© Foto / Arquivo PessoalO fotógrafo americano Daniel C. Britt, que teve o trabalho roubado pelo falso fotógrafo de guerra brasileiro, Eduardo Martins
O fotógrafo americano Daniel C. Britt, que teve o trabalho roubado pelo falso fotógrafo de guerra brasileiro, Eduardo Martins - Sputnik Brasil
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O americano Daniel C. Britt já teve trabalhos estampados na Playboy, TIME, The Washington Post e The New York Times. Cobriu a passagem do furacão Katrina, conflitos no Iraque, Síria, Afeganistão. O trabalho no campo só não lhe preparou para um detalhe: ter seu material roubado por Eduardo Martins, o fotógrafo de guerra brasileiro que nunca existiu.

Atualmente morando em Istambul, na Turquia, Daniel não poderia prever que seria personagem e uma trama que de tão absurda parece cinematográfica. Como mostrou a Sputnik Brasil há dois dias, o trabalho do americano foi plagiado por um perfil falso no Instagram que se apresentava como "Eduardo Martins" e dizia cobrir a batalha contra o Estado Islâmico no Iraque e na Síria enquanto se revezava em um trabalho como voluntário em um campo de refugiados na Faixa de Gaza.

A única imagem do fotógrafo Eduardo Martins em campo. Não é possível confirmar se trata-se de uma montagem - Sputnik Brasil
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A história surreal de um fotógrafo brasileiro no Iraque e Síria... que nunca existiu
A história de Eduardo ruiu quando ele já ostentava mais de 120 mil seguidores no Instagram e estrelava perfis em publicações famosas, como a BBC e Vice. Seu perfil, bem como todas as formas de contato que possuía, desapareceram logo depois. Os questionamentos, porém, ficaram. Quem era o loiro das fotos que "Eduardo" usava nas redes sociais? Como as fotos plagiadas foram parar em bancos famosos de imagem? E os fotógrafos originalmente autores dos trabalhos roubados, não perceberam a farsa?

Daniel só tem resposta para a última pergunta. Após contato da Sputnik Brasil na sexta-feira (1), ele concedeu por e-mail uma entrevista detalhando a sua reação ao caso.

Sputnik Brasil: Os fotógrafos profissionais acompanham frequentemente as repercussões do seu trabalho on-line, incluindo casos de plágio ou uso indevido. Você não viu nenhuma dessas fotos tiradas por você na web pelo nome de Eduardo?

Daniel C. Britt: Eu não faço isso nunca. Do momento em que começo a trabalhar em uma reportagem até a sua conclusão, mantenho as pessoas à minha volta, é meu trabalho. Quando termino, estou partindo para outra. Não sou de rastrear nada nas redes sociais. Eu tenho tentado fazer esse tipo de coisa parte do meu fluxo de trabalho, mas odeio sentar na frente de uma tela de computador tanto quanto eu odeio ler pessoas chatas publicarem lixo online. Mas isso foi um alerta. A partir de agora, eu tenho que abraçar o SEO [método de posicionamento de conteúdo em serviços de busca], mídias sociais e começar a monitorar meu conteúdo ou algum outro idiota estará vendendo meu trabalho.

SB: As fotos de "Eduardo" estavam sendo comercializadas no famoso banco de imagens Getty Images ao mesmo tempo que as suas. Na sua opinião, isso prejudica a credibilidade dos bancos de imagens?

DCB: Sim. Não acho que um currículo sólido, experiência ou confiabilidade desempenhem um papel tão grande ao conseguir contratos com agências [de fotos] nos dias de hoje. Como demonstrou Eduardo Matins, um grande acompanhamento de mídia social e algumas selfies darão conta do recado. Dito isto, não culpo as agências. As agências de fotos são empresas. É mais barato vender fotos de um jornalista freelancer em campo que enviar um fotógrafo para uma guerra distante. Eu comecei meu relacionamento com a Playboy como um freelancer na Síria. Ao mesmo tempo em que o mercado funciona contra a precisão, ele permite que sangue novo encontre novas oportunidades. Eu não culpo as agências, eu me culpo. Esse cara vem roubando conteúdo há anos. Eu deveria ter feito a minha diligência devida e mantido com o meu conteúdo. Eu tenho que começar a [usar] marca d'água. Tenho que abraçar a tecnologia, ou pelo menos encontrar um assistente para fazer isso por mim.

© Foto / Daniel C. Britt/Reprodução Facebook Ignacio AronovichComparativo mostram as fotos roubadas por Eduardo Martins e as originais de Daniel C. Britt. O falso fotógrafo muitas vezes editava as legendas, classificando como Aleppo e Mossul, locais no Iraque, Afeganistão e até mesmo no Congo.
Comparativo mostram as fotos roubadas por Eduardo Martins e as originais de Daniel C. Britt. O falso fotógrafo muitas vezes editava as legendas, classificando como Aleppo e Mossul, locais no Iraque, Afeganistão e até mesmo no Congo. - Sputnik Brasil
Comparativo mostram as fotos roubadas por Eduardo Martins e as originais de Daniel C. Britt. O falso fotógrafo muitas vezes editava as legendas, classificando como Aleppo e Mossul, locais no Iraque, Afeganistão e até mesmo no Congo.

SB:  Cada foto foi vendida por algo em torno de US $ 575. Você planeja abrir alguma ação judicial contra a Getty Images ou a NurPhoto para receber o dinheiro que as duas empresas levantaram com um trabalho que era seu?

DCB: Isso é engraçado. Eu não sou um cara litigioso. Ligarei para eles na semana que vem. Se gostaram de Eduardo, provavelmente gostarão do meu próximo projeto.

SB: E quanto ao "Eduardo Martins"? Que medidas você pretende tomar? Você contatou outros profissionais que também tiveram seu material roubado para considerar uma ação coletiva?

DCB: Uma ação legal coletiva parece um pouco exagerado. Vou entrar em contato com colegas e perguntar como eles impedem que suas coisas sejam usadas on-line. Pessoas em zona de conflito são geralmente experientes. Alguém na minha lista de amigos tem uma solução rápida para oferecer.

SB: Você mora na Turquia, tirou essas fotos em lugares perigosos. Como você se sente depois de uma pessoa que provavelmente nunca saiu de casa ter usado um trabalho que poderia ter lhe custado sua vida para ganhar fama e dinheiro?

DCB: Eu duvido que ele tenha ganhado tanto dinheiro ou fama. Estou apenas desapontado que Eduardo Matins ferrou com as legendas da foto e deu às pessoas mais uma razão para desconfiar das notícias. Cada fotografia fazia parte de um horário e local específicos. Algumas das pessoas retratadas nelas não estão mais conosco. Suas vidas eram importantes. A vida de meus intérpretes, fixers (um tipo de produtor jornalístico local usualmente contratados por repórteres internacionais) e todas as pessoas que nos ajudaram ao longo do caminho importavam. O valor dessas fotos é maior que a quantia miserável que Eduardo obteve das agências ou o número de curtidas no Facebook. Essas fotos nos permitem uma janela para a vida de pessoas reais, nas partes escuras do Oriente Médio. Não consigo medir o impacto de uma fotografia. Eu não ligo porque o verdadeiro pagamento virá com os anos, quando eu folhear meus trabalhos e entender ambos os hemisférios e o fluxo de eventos que me conduziram entre eles.
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