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Opinião: Crise argentina pode impedir aproximação do Mercosul com a União Europeia

© flickr.com / Hamner_FotosMercosul
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Concluída nesta sexta-feira, 17, em Brasília, a 48.ª Reunião de Cúpula dos Chefes de Estado do Mercosul e dos Estados Associados, o especialista Eduardo Heleno de Jesus Santos, do Instituto de Estudos Estratégicos da Universidade Federal Fluminense, faz uma avaliação do bloco.

O Professor Eduardo Heleno falou com exclusividade para a Sputnik Brasil.

Sputnik: Que importância o senhor atribui a esta 48.ª Reunião de Cúpula do Mercosul? E que importância tem este bloco para o cenário internacional?

Eduardo Heleno: Respondendo à primeira parte de sua questão, nós temos a importância dessa reunião com a entrada da Bolívia no bloco, que ganha mais um membro e amplia a capacidade política do bloco, em especial na Unasul.

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Países-membros do Mercosul assinam a inclusão da Bolívia no bloco
S: A Bolívia está passando à condição de Estado-Parte do Mercosul.

EH: Sim, e com isso, para a Bolívia, trata-se de um dado histórico importante, porque ela pode, ali, reduzir seus custos de transporte, importação, exportação, devido ao tratamento diferencial dentro do grupo. Temos também outras questões importantes, uma que já vem de certo tempo, que é a possibilidade de ampliar o comércio com a União Europeia (UE) e outras questões mais regionais também que se inserem. Por exemplo, a Bolívia tem uma necessidade muito grande de ter acesso ao mar. Ao participar e ser membro efetivo do Mercosul, ela pode negociar com mais pressão aos demais países, por exemplo, em relação ao Chile, o seu acesso ao mar, que é uma reivindicação histórica.

S: A participação oficial e efetiva da Unasul – União de Nações Sul-Americanas significa um fortalecimento do Mercosul contra ameaças externas, em particular a proveniente dos EUA?

EH: Temos que notar que o Mercosul tem duas faces: uma política e outra econômica. A face política está desde o início do evento do bloco. Temos a percepção de que o Mercosul avança devagar, muitas vezes fica parado, mas às vezes deixamos de comparar, por exemplo, com o processo de fortalecimento da União Europeia, que demorou quase quatro décadas e se tornou mais evidente com o Tratado de Maastricht, na década de 1990. Quando nós observamos esses avanços no Mercosul, temos que ter uma certa relativização porque, apesar de nós brasileiros e nossos vizinhos falarmos um idioma próximo – espanhol e português –, existe ainda uma necessidade de esses países adotarem agenda comum em alguns pontos, e com isso, por exemplo, o aspecto político tem que ser sempre ressaltado. A ideia do Mercosul, pensada ainda na década de 1980, é que houvesse um bloco político ali que afirmasse os ideais democráticos na região que viveu durante um certo período assolada por ditaduras. Esse é o aspecto político que é importante. O aspecto econômico também é importante, e é uma segunda face do Mercosul. Nesse aspecto, temos uma dinâmica mais lenta porque depende, por exemplo, das pressões internas – não é só o governo, existem os agricultores, existe a indústria que tenta se proteger dentro de cada país, em relação à exportação e à diminuição das tarifas que existem entre esses países. Se notarmos em relação às grandes potências – por exemplo, os EUA –, o Mercosul teve um papel importante para evitar a entrada dos demais países na Alca, mas hoje em dia o Mercosul faz parte de um projeto também importante que é a Unasul, que tem como trazer ao Brasil um papel de líder regional, uma liderança compartilhada com seus vizinhos, em especial a Argentina e a Venezuela, e para dar maior integração regional e maior presença política dentro das Américas.

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S: Unasul e Mercosul são blocos concorrentes ou são blocos que se harmonizam?

EH: Vejo o Mercosul com alguns elementos que tendem a harmonizar com a Unasul como um todo. A Unasul tem seu caráter político também muito próximo ao Mercosul, sem dúvida. O que acontece é que o Mercosul acaba sendo o embrião de algumas coisas que podemos ver na Unasul: a própria constituição do bloco sul-americano, que tem como uma das características o respeito aos regimes democráticos e que está presente desde os primeiros anos do Mercosul.

S: Recebemos a confirmação de que os países-membros do Mercosul assinaram o novo protocolo para inclusão da Bolívia como Estado-Parte do bloco. Em 2012, Argentina, Brasil, Uruguai e Venezuela assinaram um protocolo de entrada da Bolívia quando o Paraguai estava suspenso do bloco por causa do golpe parlamentar contra o ex-Presidente Fernando Lugo. Como os Parlamentos da Argentina, Uruguai e Venezuela já haviam aprovado a inclusão da Bolívia nesse bloco, não será necessária nova ratificação. No caso de Brasil e Paraguai, o Congresso de cada país ainda terá que aprovar a inclusão da Bolívia. Portanto, os chamados países bolivarianos Venezuela e Bolívia já estão incluídos como membros efetivos do Mercosul. Pode-se aguardar que o Equador seja o próximo país, hoje Estado-Associado ao Mercosul, a passar a Estado-Parte?

EH: É difícil nessas reuniões de cúpula determinar um prazo específico. Há, o que podemos notar, uma tendência que vai se consolidar com o tempo. Por exemplo, o processo que incluiu a Bolívia tem pouco mais de três anos, é um processo lento. Mas provavelmente o Equador venha a fazer parte do Mercosul.

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S: O senhor mencionou a aproximação do Mercosul com a União Europeia, e o próximo presidente do grupo, nessa presidência rotativa, será Horacio Cartes, do Paraguai. Com o Paraguai na presidência, devemos esperar uma efetivação do acordo de livre comércio com a UE e também com os EUA?

EH: Devemos analisar não só pela presidência paraguaia, mas também pela posição de cada um dos integrantes do Mercosul, em especial dos quatro primeiros integrantes. Se no Paraguai há uma tendência de diversificar a economia e diversificar os parceiros em termos de trocas externas, no Brasil também há esta tendência devido à crise. Mas temos na Argentina uma certa resistência, devida à própria realidade da crise argentina, que faz com que um acordo com a UE possa ser lesivo aos trabalhadores locais, uma vez que a competitividade da indústria argentina vem perdendo posições no ranking mundial. Para os argentinos há sempre uma necessidade de proteger sua economia, mas isso também, se formos ver numa escala global, não são só os argentinos, ou às vezes os brasileiros, ou em alguns casos os países aqui da região. A própria Europa, a própria França, a própria UE também protegem em especial a agricultura com seus subsídios às grandes empresas. Essa dinâmica tanto na UE como no Mercosul encontra resistências locais que às vezes não são só dos governos, mas também dos setores produtivos de cada um desses países. Diante dessas dinâmicas, nós podemos ter uma melhor noção, não seria só a presidência do Paraguai. Num quadro geral dentro do bloco, temos o Brasil a favor da abertura, o Paraguai e o Uruguai também a favor da abertura de um tratado de comércio com a UE. O fiel da balança seria a Argentina. Por outro lado, dos membros mais recentes, a Venezuela teria também certa resistência à abertura de comércio com a UE.

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