Questão nuclear iraniana: um pomo da discórdia entre os EUA e Israel?

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Dois eventos relacionados com o programa nuclear do Irã atraíram há poucos dias a atenção da mídia mundial. A guerra de informação em torno das negociações do grupo 5 + 1 continua nas duas frentes.

Em 24 de fevereiro, o jornal britânico The Guardian publicou um artigo sobre as atividades nucleares do Irã, baseado em vazamentos dos serviços de inteligência de Israel e da África do Sul. Quase ao mesmo tempo, um grupo de dissidentes iranianos anunciou que Teerã, apesar das negociações com o sexteto de mediadores internacionais, está desenvolvendo sub-repticiamente armas nucleares em instalações secretas subterrâneas.

Ultimamente, os vazamentos desse gênero não são nada excepcionais e até mesmo, pode-se dizer, passaram a ser uma regra. Mas, neste caso, o que mais importa, quiça, é o tempo, ou seja, o momento em que as referidas informações vieram à luz. Ora bem, onde estará o busílis?

Pelos vistos, reside no seguinte. Os dados secretos da inteligência israelense publicados pelo jornal britânico desmentem o primeiro-ministro – atenção! – israelense Netanyahu, que em numerosas ocasiões declarou que o Irã criará de aqui a pouco uma bomba nuclear. Em 2012, quando o sr. Netanyahu fez um discurso sensacional nas Nações Unidas, afirmando que em menos de um ano o Irã teria armas nucleares, o seu próprio serviço secreto não concordou com ele.

Eis aqui um extrato do relatório secreto preparado na altura pela Mossad: "Apesar de ter acumulado o urânio enriquecido a 5% em quantidades suficientes para fabricar várias bombas, e inclusive ter enriquecido certa parte a 20%, por enquanto, segundo indícios, o Irã não está pronto para continuar o enriquecimento até aos graus mais elevados. Parte do urânio foi usada a fim de produzir o combustível nuclear para o reator de pesquisas em Teerã e, portanto, a quantidade de urânio enriquecido a 20% não aumenta".

Aqui deve notar-se duas coisas. Em primeiro lugar, para fazer uma munição nuclear é necessário ter o urânio enriquecido a 90%. E, em segundo lugar, mais tarde, atuando em plena conformidade com os acordos de Genebra de 2013, ou seja, o Plano de Ação Conjunta, os iranianos desenriqueceram totalmente o urânio enriquecido a 20% ou converteram-no em combustível para reatores.

Tudo o que o relatório expõe é, sem dúvida, certo. Mas surge a pergunta: por que razão o documento preparado há dois anos tem sido publicado só agora, precisamente no final de fevereiro?

A resposta não se faz esperar: porque em 3 de março Benjamin Netanyahu planeja fazer um discurso no Congresso dos Estados Unidos, criticando duramente o programa nuclear iraniano e as negociações dos mediadores internacionais com o Irã sobre a questão nuclear. O primeiro-ministro de Israel prometeu fazer tudo o que será possível para torpedear a assinatura do acordo, atualmente em fase de preparação, sobre a solução da questão nuclear iraniana.

Ao ter apostado seu prestígio político na assinatura de um acordo definitivo e todo-abrangente entre o Grupo 5 + 1 (Rússia, EUA, China, Reino Unido e França mais Alemanha) e a República Islâmica do Irã, a administração Obama, na expectativa de um discurso inflamável do líder israelense no Congresso, teme que esse prejudique as negociações muito difíceis entre o Irã e os sexteto.

O secretário de Estado dos EUA, John Kerry, referiu-se à posição assumida pelo premiê israelense, dizendo que esta "pode ser considerada imprópria". "Israel é mais seguro agora do que antes da assinatura do Plano de Ação Conjunta, ao qual, aliás, o primeiro-ministro se opusera. Ele estava errado".

A lógica sopra ao ouvido que não se deve excluir que os materiais secretos da Mossad e da inteligência sul-africana fossem jogados ao The Guardian com o objetivo de neutralizar o discurso iminente do primeiro-ministro Netanyahu em Washington.

A resposta dos aliados do primeiro-ministro israelense foi instantânea. A oposição iraniana, nomeadamente o Conselho Nacional de Resistência do Irã (NCRI, na sigla em inglês), protagonizado pela Organização dos Mujahedin do Povo Iraniano, decidiu provar que Teerã durante anos a fio vinha enganando a comunidade internacional. Desde 2008, de acordo com os dissidentes iranianos, a República Islâmica do Irã vem enriquecendo urânio em Lavizan-3, uma usina secreta escondida profundamente debaixo do solo nos subúrbios do nordeste de Teerã. As atividades nucleares secretas são efetuadas em Lavizan-3 com a ajuda de centrífugas modernas IR-2m e IR-4.

De momento, as revelações do NCRI não têm sido confirmadas. No entanto, esta entidade dispõe, certamente, de suas fontes na comunidade nuclear do Irã. Como se sabe, os membros do NCRI fizeram um número de declarações posteriormente confirmadas a respeito de várias atividades de Teerã nos últimos anos.

Sem se aprofundar nos detalhes das investigações dissidentes, deve-se ressaltar de um modo especial que o momento para tais revelações não foi escolhido por acaso. Esta revelação é um trunfo propagandístico presenteado a Netanyahu em sua luta contra quaisquer acordos nucleares com a República Islâmica do Irã.

Por outro lado, a intensificação da relutância israelense em relação aos acordos nucleares é igualmente um presente aos opositores do presidente Rohani dentro do Irã, os quais, bem como os aliados do premiê israelense, não aceitam quaisquer acordos com o sexteto. Portanto, os opositores dos presidentes, tanto no Irã como nos EUA, se empenharão com ainda maior persistência em jogar as cartadas antipresidenciais em seus jogos políticos internos.

Indubitavelmente, a questão nuclear iraniana tornou-se um pomo da discórdia nas relações, sobretudo, entre os políticos Barack Obama e Benjamin Netanyahu. No que concerne às relações entre os EUA e Israel, é pouco provável que as desavenças pessoais dos seus atuais líderes sejam capazes de abalar os laços entranháveis e estreitos entre os dois Estados que têm muitos interesses comuns na região e no mundo.

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