Historiador diz que menção de Obama sobre apoio dos EUA ao golpe na Ucrânia foi ato falho

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Barack Obama não pode ter sido tão ingênuo declarando em entrevista à rede CNN que os Estados Unidos tiveram uma participação ativa no golpe que levou autoridades pró-ocidentais ao poder na Ucrânia em fevereiro de 2014. A análise foi feita pelo professor de História da USP – Universidade de São Paulo, Ângelo Segrillo.

Em entrevista à Rádio Sputnik, Segrillo explicou que o chefe da Casa Branca, ao falar sobre o assunto, deve ter se referido a que os Estados Unidos teriam apenas intermediado o acordo de 21 de fevereiro de 2014, quando o então Presidente da Ucrânia, Viktor Yanukovich, decidiu realizar com a oposição uma espécie de compartilhamento de poder, de retomada da reforma constitucional de 2004, medida que retirou um pouco dos poderes presidenciais e aumentou os poderes do Parlamento.

O professor de História da USP acredita que Obama, de qualquer forma, cometeu um grande erro, pois quem intermediou o acordo foi a União Europeia. “Eu acho que foi um ato falho do Obama em relação a esse acordo, mais do que um erro totalmente ingênuo dele de assumir alguma coisa maior, que nós sabemos que houve, mas que ele não colocaria assim tão abertamente numa entrevista para a CNN”.

A decisão de não assinar um acordo de associação da Ucrânia com a União Europeia aconteceu no final de 2013, quando Yanukovich comunicou publicamente a suspensão dos entendimentos, o que desencadeou uma onda de protestos em massa em todo o país.

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Após muitas crises e enfrentamento de populares com forças policiais, o impasse permaneceu em 2014, e no dia 21 de fevereiro Viktor Yanukovich se reuniu com o presidente do Parlamento ucraniano, Oleksander Turchynov, e aceitou um acordo em que a Ucrânia retornaria à Constituição de 2004, pela qual os Poderes Executivo e Legislativo harmonizariam as suas atribuições. Porém, no dia seguinte a este acordo, 22 de fevereiro, Turchynov destituiu Yanukovich e assumiu a Presidência do país, num golpe de Estado.

Na sequência da mudança de poder e com a ascensão do nacionalismo agressivo na Ucrânia, a Crimeia decidiu em referendo se juntar à Federação da Rússia em março de 2014, quando 96% por cento dos eleitores foram a favor da reunificação.

Ângelo Segrillo analisa o contexto do golpe como de um cenário muito complexo por ali ser um Estado multinacional, o que dificulta o entendimento dos brasileiros sobre a situação. Segundo o professor, nos países eslavos, como a Ucrânia e a Rússia, a nacionalidade de uma pessoa é determinada pela nacionalidade dos pais e não como no Brasil, onde a nacionalidade é determinada pelo local de nascimento. A determinação faz com que o Estado seja multinacional, reunindo, por exemplo, na região cidadãos ucranianos de nacionalidades ucraniana, russa e grega. “Quando Yanukovich foi deposto pela metade ocidental do país, a parte oriental, habitada majoritariamente por cidadãos ucranianos com nacionalidade russa, não aceitou a deposição do presidente, por achá-la ilegal, resultando no cenário atual de conflito, de um lado não aceitar a legitimidade do outro”.

O historiador explica ainda que, assim como a composição étnica de lá é uma composição de diferentes nacionalidades, a política ucraniana também é complexa, refletindo um pouco também esse jogo de interesses. “A parte mais oriental, de nacionalidade russa, quer continuar os tradicionais laços que a Ucrânia sempre teve com a Rússia, e a outra parte, do Ocidente, quer se ligar à União Europeia”.

Diante do cenário, Ângelo Serillo acredita não ser possível conduzir uma política no sentido tradicional, com negociações pacíficas na região, pois ela tomou contornos muito violentos por conta dos impasses entre os separatistas.

Após a deposição, Viktor Yanukovich se refugiou na Rússia, onde tem residência. Na ocasião o governo russo disse que não o deixaria desamparado num momento de dificuldades. Porém, Yanukovich queria  auxílio para sair do país com alguma segurança. Desde então permanece desaparecido do noticiário, e o governo do Ucrânia colocou o nome do ex presidente da Ucrânia na lista dos procurados pela Interpol.

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Para o professor de História da USP, a situação é um erro. Ângelo Segrillo questiona: como um presidente eleito de forma legítima passa a ser procurado por tentar ficar no poder para o qual foi escolhido? “Havia muitos problemas no governo Yanukovich, como a corrupção, mas esse é um problema antigo da Ucrânia e não só do governo dele. Não podemos depor todo presidente eleito porque existem problemas. Imagina os problemas com a presidente do Brasil, Dilma Rousseff, não podemos depor a Dilma assim,  eu acho que esse foi o grande erro”.

Segrillo chama atenção ainda para a população, que tem sido a maior vítima dessa crise. “Fora as lutas políticas, quem sofre é o povo, e nós estamos vendo aí pessoas morrendo, além de bombardeios. É importante solucionar o problema não apenas para resolver o lado político, de prestígio de diferentes países, mas porque a população sofre com isso.”

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