'Febre do ouro': como bancos centrais lançam ofensiva contra dólar

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No primeiro trimestre de 2019, a demanda por ouro dos bancos centrais atingiu seu ponto máximo dos últimos seis anos. Ao mesmo tempo, cada vez mais países estão reduzindo a cota-parte do dólar nas suas reservas internacionais. A Sputnik explica o que está por trás dessa estratégia e como ela poderia influenciar a ordem financeira existente.

De acordo com o Conselho Mundial do Ouro (WGC, na sigla em inglês), no ano passado os bancos centrais por todo o mundo compraram 651,5 toneladas de ouro – um aumento de 74% em comparação com 2017.

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A tendência continuou em 2019: nos primeiros três meses deste ano os bancos centrais por todo o mundo compraram 145,5 toneladas de ouro, ou seja, 68% mais do que no mesmo período do ano passado. Trata-se da maior demanda pelo metal preciso por parte de bancos centrais desde 2013.

A Rússia lidera essa "corrida ao ouro": em sua tentativa de reduzir a dependência do dólar americano, nos últimos 15 meses o Banco Central da Rússia comprou 329,3 toneladas do ouro, aumentado para quase 19% a cota-parte do metal precioso e reduzindo a da divisa estadunidense nas suas reservas internacionais.

Entre outros países que apostam no ouro estão a China, Turquia, Equador, Cazaquistão, Qatar, Colômbia, Sérvia, Filipinas e vários outros países. Mas por que é que nos últimos tempos o ouro se tornou um ativo tão atraente para os bancos centrais?

Independência e segurança

Tradicionalmente, a demanda por ouro está crescendo em meio à instabilidade da economia global: enquanto as moedas, mesmo as das economias mais fortes, podem se desvalorizar, o ouro, sendo um ativo sólido, representa uma espécie de investimento seguro. Seu preço pode ser vulnerável, mas não pode cair a zero contrariamente às moedas convencionais.

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Previsões sombrias para a economia global (segundo o Fundo Monetário Internacional, por exemplo, em 70% dos países a taxa de crescimento deve desacelerar neste ano) e a expansão da política econômica protecionista em meio à guerra comercial sino-americana fazem com que investidores, bem como bancos centrais, aumentem suas compras de ouro para se salvar dos possíveis colapsos nos mercados globais.

Além disso, o ouro pode ser considerado o ativo mais seguro porque não pode ser congelado ou incluído na lista negra (se estiver guardado nos cofres do banco central do país), enquanto qualquer Estado, de fato, pode bloquear o uso da sua divisa por outros países se o considerar necessário.

Mais um argumento a favor do ouro é a possibilidade de diversificar suas reservas, o que também torna o valor das reservas menos vulnerável à instabilidade financeira e política: se o preço de um ativo sofre queda, outros ativos no portfólio poderiam compensar essa desvalorização, mantendo estável o valor total das reservas.

Meio para se defender das sanções

No âmbito da política de sanções e restrições comerciais de Washington, já adotada contra vários países, incluindo a Rússia, Irã, Venezuela, China e países da UE, cada vez mais países estão considerando a possibilidade de se tornarem menos dependentes do dólar estadunidense. O ouro, junto com outras moedas mais usadas no mundo, como o euro ou o yuan, é um ativo apropriado para lançar o processo de desdolarização.

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A Rússia e a China já se livraram de um volume significativo dos seus títulos do Tesouro dos EUA, os substituindo pelo ouro e outras divisas. De fato, através da sua política de restrições, os EUA estão empurrando os outros países para abandonarem o dólar e apostarem em outras moedas e no ouro.

"O dólar está perdendo gradual e inevitavelmente sua parte do mercado global. Isso se refere não apenas à Rússia, mas a todo o mundo", disse em 6 de junho o ministro do Desenvolvimento Econômico russo, Maksim Oreshkin, durante o Fórum Econômico Internacional de São Petersburgo (SPIEF).

Ao mesmo tempo, espera-se que a situação atual leve ao aumento dos preços dos ativos reais, em primeiro lugar do ouro. Outro fator que contribuirá para o aumento do preço do metal preciso é que sua produção começará a cair nos próximos anos, atingindo em 2022 o nível do início do século passado.

Caso da Venezuela

A atual crise política na Venezuela é um bom exemplo de como o ouro poderia ajudar a resistir à pressão econômica dos outros Estados: as autoridades venezuelanas retiram regularmente ouro do banco central do país para apoiar a economia.

Segundo fontes oficiais, desde o início do ano Caracas vendeu 30 toneladas do metal precioso. De acordo com algumas estimativas, as reservas de ouro da Venezuela são atualmente de cerca de 100 toneladas. E se o país não tivesse essas reservas, Caracas talvez não pudesse combater a pressão de Washington por um período tão longo.

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É de assinalar que se trata do ouro guardado nos cofres nacionais. Por exemplo, no ano passado, sob pressão de Washington, o Banco da Inglaterra recusou um pedido do presidente venezuelano, Nicolás Maduro, para repatriar o ouro da Venezuela guardado em Londres, embora o ouro não pertença ao Banco da Inglaterra ou ao governo britânico, mas à Venezuela.

Essa situação bastante escandalosa prova mais uma vez que, em meio às divergências políticas e econômicas, o ouro poderia servir como uma espécie de proteção contra a interferência externa, mas é melhor acumular suas reservas no território nacional para evitar qualquer congelamento de ativos.

Tudo indica que no futuro próximo as autoridades monetárias por todo o mundo continuarão aumentando suas compras de ouro. E, quem sabe, talvez um dia, após um longo período de hegemonia do dólar, o mundo volte ao padrão ouro.

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