Como Portugal e portugueses se preparam para Brexit

© REUTERS / Clodagh KilcoyneManifestantes contra o Brexit ao lado do prédio do Parlamento em Londres
Manifestantes contra o Brexit ao lado do prédio do Parlamento em Londres - Sputnik Brasil
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O Reino Unido segue diante de um impasse com relação ao acordo para a saída da União Europeia. Enquanto isso, Portugal se prepara para executar um plano de contingência, caso o Brexit ocorra sem consenso, que foca na manutenção do interesse dos britânicos pelo país e na tentativa de resolver as dúvidas dos portugueses que vivem no Reino Unido.

Carolina Nunes deixou Tarouca, pequena cidade da região norte de Portugal, para estudar e trabalhar com cinema em Londres. Já são oito anos morando na capital inglesa, mas o Brexit tem feito a certeza da escolha estremecer. "Eu me inscrevi no site do governo britânico e eles mandam atualizações do que se vai passar, mas a verdade é que nem eles sabem. Já tentei fazer o procedimento para tentar solicitar a residência, organizar os papéis, mas nem dá para fazer a aplicação ainda, porque neste momento ainda somos da União Europeia. Não dá pra fazer nada, está tudo assim congelado", conta Carolina à Sputnik Brasil.

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O Reino Unido é o principal destino da emigração portuguesa atualmente, com uma comunidade estimada em 400 mil pessoas. A pesquisadora Cátia Miriam Costa, do Centro de Estudos Internacionais do ISCTE — Instituto Universitário de Lisboa, vê a situação dos residentes portugueses como "uma questão adicional de preocupação". "Penso que o Brexit está a ser fruto de problemas internos graves que o Reino Unido tem em termos políticos. A discussão sobre a saída e sobre o acordo está a ser alvo de muitas questões internas. Neste sentido, acho que Portugal fez o que era possível fazer, que é tentar colmatar as dificuldades das empresas, aumentar a vigilância nos portos e tentar tranquilizar os residentes portugueses lá, que é uma questão que talvez seja das mais sensíveis para nós", explica a pesquisadora à Sputnik Brasil.

O plano de contingência de Portugal diz que "em caso de saída sem acordo, os portugueses que tenham entrado no Reino Unido até 29.03.2019 poderão regularizar a sua situação até 31.12.2020". Caso haja acordo, esse prazo é prolongado por mais um ano.

Para dar conta da demanda, o plano também prevê a melhoria dos serviços consulares prestados no Reino Unido, mas ainda assim o cenário de dúvidas permanece. "Eu mesma estou a colaborar em um consórcio de investigação que está preparando uma candidatura para um projeto europeu. Temos uma instituição que entraria no consórcio e que está sediada no Reino Unido e não sabemos se ela poderá entrar como associada. Não temos informação, apesar de já solicitada, sobre como proceder. A ignorância sobre o processo em si chega a isso. Existem inúmeros grupos, não só de pesquisa, mas comunitários, de redes culturais, sociais, que envolvem o Reino Unido e não se sabe muito bem como isso será desmembrado", questiona a pesquisadora do ISCTE.

Britânicos em Portugal

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Se o Reino Unido é para onde os portugueses mais emigram, são os britânicos os que mais passam férias em Portugal. O principal grupo turístico do país movimentou mais de 2,6 bilhões de euros (mais de 11 bilhões de reais) em 2017. Preocupado em manter a atratividade, principalmente por causa de uma prevista desvalorização da libra em relação ao euro, Portugal deve dar uma boa colher de chá para os britânicos neste setor. “80% dos turistas britânicos entram em Portugal pelos aeroportos de Faro e Funchal. Neles, serão criados corredores dedicados aos cidadãos britânicos, tal como existem para os cidadãos da União Europeia e da CPLP, tendo em vista agilizar a entrada dos turistas britânicos no país e evitar situações de bloqueio”, declarou à imprensa o primeiro-ministro português, António Costa, durante a apresentação do plano de contingência.

Além da área exclusiva nos aeroportos, os britânicos também vão ser dispensados de visto para permanências de até 90 dias, como ocorre com os brasileiros.

Com relação aos moradores, que representam o sexto maior grupo de imigrantes em Portugal, "o plano de contingência centra-se na garantia aos cidadãos britânicos residentes em Portugal de que aqui continuarão a poder residir e a beneficiar de um conjunto de direitos: o acesso aos serviços de saúde, os direitos garantidos pela convenção bilateral de 1978 em matéria de segurança social, o reconhecimento das cartas de condução e o reconhecimento das qualificações académicas e habilitações para o exercício de atividade profissional em Portugal", garantiu António Costa.

Caso não haja acordo, britânicos vão ter até 31 de dezembro de 2020 para comprovar que entraram em Portugal até a data do Brexit, 29 de março, e solicitar o novo documento de residência.

Parceiros comerciais

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O Reino Unido é o quarto maior comprador das exportações portuguesas. Embora o governo esteja em alerta para o impacto negativo nas relações comerciais pós-Brexit, empresários mantêm certa tranquilidade. "Sempre existiu uma boa relação comercial entre os dois países. Alguns setores vão sofrer, mas outros vão encontrar novas oportunidades", explica à Sputnik Brasil o CEO da Câmara de Comércio Luso-Britânica, Chris Barton.

O plano português disponibilizou 50 milhões de euros (213 milhões de reais) para uma linha de apoio para a adaptação dos exportadores. "É um valor pequeno quando analisamos dentro do contexto, parece mais um gesto. Os dois países têm uma longa história comercial, imaginamos que as boas relações vão continuar com ou sem Brexit", afirma Chris Barton.

Desatando o nó

Faltando menos de dois meses para o divórcio entre Londres e Bruxelas, Theresa May segue tentando conseguir a aprovação do parlamento britânico. Nesta terça-feira (29), uma nova votação rejeitou uma série de emendas propostas para o acordo, entre elas a do líder da oposição, Jeremy Corbin, que previa que os deputados pudessem votar em outras formas de Brexit.

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No entanto, as únicas duas alterações aprovadas sinalizam algum entendimento. A maioria dos deputados concorda em sair apenas com acordo e também se mostra favorável caso a primeira-ministra substitua o chamado "backstop", medida para evitar controle alfandegário, depois Brexit, ao longo da fronteira entre a Irlanda do Norte, que é território do Reino Unido, e a Irlanda, país independente e membro da União Europeia.

Theresa May deve voltar ao parlamento com novas alterações para votação em duas semanas.

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