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'Quem mora em bairro nobre não sofre com o caveirão': é hora de desmilitarizar a polícia? (VÍDEO)

© AP Photo / Victor R. CaivanoPolicial de elite do Batalhão de Operações Especiais (Bope) no Rio de Janeiro (foto de arquivo)
Policial de elite do Batalhão de Operações Especiais (Bope) no Rio de Janeiro (foto de arquivo) - Sputnik Brasil
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A letalidade policial cresceu no estado do Rio de Janeiro nos primeiros seis meses do governo de Wilson Witzel. A Sputnik Brasil levantou esses dados e foi às ruas ouvir cidadãos a respeito do debate sobre desmilitarização e os limites da ação da polícia, além de ouvir uma representante do Movimento de Favelas da capital fluminense.

A desmilitarização das polícias no Brasil foi tema de debate na sede do Ministério Público Federal do Rio de Janeiro na terça-feira (13). O tema é polêmico e não agradou o governador do estado, Wilson Witzel, que disse que o evento é "inaceitável" e configura "desvio de função".

Sob o governo de Witzel, o Rio de Janeiro registra um alto número de mortes em ações policiais. Nos primeiros seis meses de 2019, segundo dados do Instituto de Segurança Pública (ISP), 881 suspeitos foram mortos em ações da polícia no estado, 15% a mais que no mesmo período do ano anterior. As 434 mortes do primeiro trimestre foram o maior índice desde 1998.

Os dados divulgados pelo governo do estado também apontam uma queda de 23% no número de homicídios dolosos – menos 608 mortes - na primeira metade de 2019, assim como queda de 63% no número de policiais mortos.

Os números de Witzel no 1º semestre de governo

De acordo com dados publicados pelo ISP, quando consideradas as mortes causadas por policiais, a queda nas mortes no primeiro semestre foi menor do que na estatística que considera apenas os homicídios dolosos. Os números também mostram que os dois últimos governos também tiveram quedas nas mortes no primeiro semestre de mandato com taxas menores de letalidade policial.

Os dados do ISP mostram que a taxa de homicídios dolosos no estado é a menor da década. Esses dados não incluem as mortes causadas por ações policiais, que vão para a estatística de letalidade violenta.

Em relação aos números de letalidade violenta, a queda em comparação a 2018 foi de cerca de 18% - menos 541 mortes. A taxa de letalidade violenta inclui, além das mortes causadas por agentes do Estado, casos de latrocínio e lesão corporal seguidas de morte.

Nesse caso, em relação à década, a taxa de letalidade violenta é a 5ª maior. A taxa, porém, reverte uma tendência de aumento das mortes no estado que vinha desde 2015, o primeiro ano do governo anterior. Naquele ano, foram 2.553 mortes no primeiro semestre.

Os dois últimos governadores também apresentaram quedas na letalidade violenta no primeiro semestre de governo. No caso de Luiz Fernando Pezão, em 2015, a queda foi de 562 mortes. Já nos primeiros seis meses de Sérgio Cabral, em 2011, a queda não superou a do governo Witzel, e houve menos 523 mortes em relação ao mesmo período do ano anterior.

A mesma comparação em homicídios dolosos aponta que no primeiro semestre de Cabral houve 300 casos do tipo a menos do que no mesmo período do ano anterior. Já Pezão superou a queda apresentada por Witzel, com menos 621 homicídios dolosos em seus primeiros seis meses de governo.

Apesar de tendências parecidas nos governos anteriores com relação aos dados de homicídios dolosos e letalidade violenta, as mortes em ações policiais colocam Witzel em evidência. Os 881 mortos por intervenção do Estado nos primeiros seis meses do mandato do ex-juiz são um recorde em pelo menos 10 anos. No caso de Cabral, os primeiros seis meses de governo tiveram 372 mortos pela polícia. Já sob o governo de Pezão, o número foi de 349.

'Não são os jovens da Zona Sul'

A Sputnik Brasil entrevistou Gizele Martins, uma jornalista que representa o Movimento de favelas do Rio de Janeiro, e também cidadãos nas ruas da cidade sobre desmilitarização e atuação das polícias.

"A política de segurança do Rio de Janeiro é uma política genocida, que tem como alvo o jovem negro morador de favelas", afirma Gizele Martins em entrevista à Sputnik Brasil. No ano passado, 75% dos mortos em ações policiais no estado eram negros, segundo o ISP.

Para ela a política de militarização é uma “política de controle” voltada à população mais vulnerável e existe há décadas do estado. Diante dessa realidade, Gizele se diz a favor da desmilitarização das polícias.

"Sou a favor da desmilitarização, e aí não só da polícia militar, mas todas as polícias. As outras polícias são tão militares, tem tanto poder bélico quanto a Polícia Militar", diz. Nesse ponto, Gizele enfatizou que o uso de blindados pela polícia como elemento de militarização. Ela também aponta que o Rio de Janeiro funciona como “um laboratório” para políticas de segurança.

A ativista também criticou o atual governo citando ações de Witzel, como no caso da participação do governador em uma ação policial que disparou tiros à bordo de um helicóptero na cidade de Angra dos Reis.

© REUTERS / Ueslei MarcelinoPolicial e morador na Favela do Borel após protesto pelo assassinato de jovem. 9 de Agosto de 2019.
'Quem mora em bairro nobre não sofre com o caveirão': é hora de desmilitarizar a polícia? (VÍDEO) - Sputnik Brasil
Policial e morador na Favela do Borel após protesto pelo assassinato de jovem. 9 de Agosto de 2019.

"Quem mora em bairros nobres não está sofrendo com o caveirão. Não são os jovens da Zona Sul do Rio de Janeiro que estão sofrendo e sendo assassinados", afirma.

Nas ruas, cidadãos moradores de favelas se recusaram a falar com a reportagem sobre o tema com medo de represálias em seus bairros de origem. Porém, não faltaram vozes contra a desmilitarização e que apoiam a ação policial.

Segundo Gizele, cresce entre a população uma visão “fundamentalista” e de direita, inclusive em áreas vulneráveis, que apoia a letalidade dentro de “populações empobrecidas e negras como essas que moram em favelas".

Em maio, Gizele esteve junto com entidades do movimento negro na Jamaica para denunciar a violência policial brasileira na Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), um órgão da Organização dos Estados Americanos.

"A gente teve momentos como esse nos anos 1990, que foram de várias chacinas no Rio de Janeiro, de várias operações policiais. E aí é muito impactante ver isso novamente. Eles receberam com muito impacto essas informações e os números que a gente levou”, aponta a ativista.

"A gente precisa cada vez mais se colocar no mundo para que alguma coisa seja feita nem que seja de fora para dentro do país", conclui.

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